O momento é de cuidado, proteção e recolhimento. Embora não seja a realidade de todas as pessoas, o isolamento social é sentido por todos. Para muitos, o contato com familiares, amigos ou colegas de trabalho já não pode se dar como antes. Deixamos de ir ao cinema, ao teatro, a concertos. Por um tempo, vamos adiar aquele passeio tranquilo na feira. Vamos adiar comemorações, celebrações e encontros. Mas é importante dizer: vamos também encontrar novos caminhos para tudo isso.
Esse olhar positivo e confiante em dias melhores e na capacidade de reinvenção do ser humano é fundamental nesse cenário. Conferências on-line, filmes sob demanda e shows ao vivo pela internet vão ocupando cada vez mais espaço em nossas rotinas. É a sede pelo que nos mantém conectados, é a sede por informação, cultura, diversão. A natureza gregária da humanidade se revela em toda a sua força nestes tempos em que estamos afastados ou impossibilitados de vivenciar a rua, os espaços públicos e os encontros em sua plenitude. Mas a busca por conexão segue nos movendo.
Estar em Brasília, a jovem capital do país que mistura gente de todos os estados brasileiros e recebe pessoas do mundo todo, nos dá a oportunidade de refletir sobre o poder do encontro. O encontro que proporciona trocas, o encontro que revela culturas, que potencializa a arte. O encontro que tira projetos do papel, que ergue uma cidade do zero em mil dias, que forma famílias e traça destinos. O encontro que inspira.
É o encontro e tudo o que pode ser extraído dessa poderosa ferramenta humana que motiva, há 16 anos, a realização da Semana da Europa em Brasília. Uma iniciativa que se consolidou a partir da colaboração entre institutos culturais, embaixadas dos países da União Europeia e a Delegação da União Europeia no Brasil. Desde 2007, o grupo forma a Eunic Brasília (Associação dos Institutos Culturais, Embaixadas e Consulados de Países-Membros da União Europeia).
Essa rede tem sede em Bruxelas e está presente em mais de 150 países. No Brasil, conta com clusters também em São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba, Porto Alegre e Salvador. Em cada cidade, as instituições que compõem a Eunic encontram as formas de levar a cultura europeia para a população local. Mais do que isso: por meio da cultura, as atividades da Eunic querem promover diálogo, colaboração e sinergia. Na capital federal, a Semana da Europa representa esse grande espaço de troca.
Muito provavelmente, vários leitores deste artigo se lembrarão de ter provado alguma delícia gastronômica no Bazar Europeu. No ano passado, quatro mil pessoas fizeram parte desse encontro. Outros podem associar a Semana da Europa à Corrida da União Europeia, que tem lugar em Brasília há 15 anos e, na última edição, reuniu mais de 2 mil atletas. Os amantes de música clássica se recordarão das longas filas no Cine Brasília para prestigiar a Orquestra Sinfônica do Teatro Nacional Cláudio Santoro no Concerto Europeu, apresentações que reuniram por muitos anos os músicos brasilienses e solistas e maestros europeus. Esses e muitos outros eventos ganharam lugar especial na agenda cultural dos brasilienses.
Mas a rica e agitada cena cultural da cidade também precisou se recolher. Desde meados de março, a necessidade de evitar aglomerações levou governos em todo mundo – e também no Distrito Federal – a suspender essas atividades, medida essencial para a proteção de todos.
Nós nos solidarizamos com toda a cadeia envolvida na organização dos eventos suspensos ou adiados. Da produção ao público, dos artistas aos fornecedores, todos são impactados de alguma forma quando isso acontece. Diante desse cenário, nos dirigimos à cidade para dizer que também a Semana da Europa passa por mudanças em 2020.
Pela primeira vez desde a edição número um, nossos eventos não serão realizados em maio, quando celebramos o Dia da Europa (9/5). No planejamento original, nos preparávamos para estender as comemorações pelos 60 anos de Brasília e levar arte e cultura para diferentes regiões administrativas do Distrito Federal. Naturalmente, foi necessário mudar os planos e concentrar a energia naquela que deve ser a prioridade de todos no momento: a saúde. De cada um e de toda a cidade.
Os contornos imprevisíveis da pandemia ainda não nos permitem vislumbrar quando poderemos estar juntos outra vez, mas a Eunic Brasília segue desenhando a décima sexta edição do evento. É possível que ela ocorra no segundo semestre; é provável que explore formatos digitais. Outras atividades seguem em execução, devidamente adaptadas aos novos tempos.
É o caso do apoio ao projeto da Orquestra Jovem de Metais e Percussão de Taguatinga, capitaneado pelo Sesc-DF e que conta com suporte da Eunic Brasília há dois anos. As aulas de música migraram para uma plataforma virtual, em que são compartilhados áudios, vídeos e tarefas para os alunos.
Os pais frequentemente agradecem ao maestro Altair Silva, o músico que conduz o conjunto, por levar às crianças e jovens não apenas música, mas um alento nestes dias difíceis. Temos clareza de que nossa missão, mais do que nunca, é promover o encontro. Que seja virtual por ora. E que seja potente e seguro quando for a hora.
* Especialista em cultura e promoção da Embaixada da Polônia em Brasília e presidente da Associação dos Institutos Culturais, Embaixadas e Consulados de países membros da União Europeia (Eunic Brasília)