Sítios se tornam patrimônio da humanidade em razão do passado memorável. O Comitê do Patrimônio Mundial da Unesco olha para trás, avalia o legado histórico e cultural do monumento e decide se é merecedor do título que o imortaliza. Assim foi com as pirâmides do Egito, as muralhas da China, Petra, Baalbek, Jerusalém, o Palácio de Versailles, São Miguel das Missões, Centro Histórico de Ouro Preto.
Com Brasília foi diferente. A capital do Brasil recebeu o troféu por causa do futuro que projetava. Em 1987, ainda inacabada, a utopia sonhada por Dom Bosco e concretizada por Juscelino Kubitschek entrou na lista de patrimônios mundiais da Unesco. O urbanismo inovador, a arquitetura arrojada, a história e construção singulares contaram para a avaliação.
Josué Montelo escreveu a propósito: “A Unesco sempre se preocupou em preservar para o presente monumentos do passado. A partir de Brasília, ao contrário, em boa hora, passou a preservar para o futuro o monumento do presente”. Trinta e três anos depois, a pandemia acelerou o futuro. Deixa claro que a transferência da capital para o Centro-Oeste fez mais do que acrescentar um cartão-postal para os povos. Tornou o Brasil o celeiro do mundo.
Por fatores econômicos e históricos, o brasileiro se concentrou na faixa litorânea. Daí ser ironicamente chamado de caranguejo. O interior, ao longo de quase cinco séculos, se manteve pouco povoado e economicamente esquecido. A mudança da capital para o cerrado rasgou rodovias, forçou o deslocamento de contingente da população, ligou a capital às regiões antes ignoradas.
A epopeia realizou a dimensão continental do país, promoveu a integração nacional e estimulou o desenvolvimento econômico. Expandiu a fronteira agrícola e deu impulso à pecuária extensiva de corte. Pesquisas criaram a agricultura tropical que, aliadas à incorporação crescente de tecnologia, tornaram o Brasil o segundo maior produtor de alimentos, depois dos Estados Unidos. O potencial o habilita a se tornar o primeiro no ranking em pouco tempo.
Tal como Lúcio Costa traçou uma cruz como quem toma posse do lugar, JK construiu Brasília para dar posse do Brasil aos brasileiros. Em meio século, o país deu uma guinada de 180 graus. Deixou de ser importador de alimentos para se tornar um dos mais importantes produtores e exportadores globais. Os brasileiros comemoram. O mundo agradece.