As armas nucleares estavam apontadas, os protagonistas escolhidos e pressionados, e o mundo esperando a razão. Jonh Nash, o teórico da racionalidade, dizia: “Eu sempre acreditei em números, nas equações e em lógicas que levam à razão. Mas depois de uma vida inteira a persegui-los, pergunto: O que é verdadeiramente lógico? Quem decide o que é racional?” Em 30 anos, os livros de história dirão que, em um dado momento, usamos a tecnologia como espelho de nós mesmos.
Narcisismos exacerbados em selfies perfeitas com sorrisos largos e filtros de realidade aumentada como se, de fato, essa realidade não suficiente tivesse de ser retocada. Fomos alocados por algoritmos em grupos de interesse comum em que pudemos exaltar nossa crença preexistente e nos sentirmos especialistas em política, aquecimento global, jornalismo, vacinas, educação, antropologia, filosofia.
Agora, somos infectologistas. O filtro para a realidade aumentada das nossas convicções nos permitiu compartilhar as nossas verdades, mesmo que em falsas notícias. Agora, nos impõem isolamento social. Não é verdade. Isolados já estávamos. Tudo que sabíamos com certeza e o orgulho dentro de nossas bolhas de isolamento foram vilipendiadas. Um vírus, um organismo de nanômetros de diâmetro, parece carregar em si dezenas de ogivas nucleares.
A teoria dos jogos pode trazer a razão num ambiente de total incerteza e isonomia a um cenário de colapso. Dentro do equilíbrio de Nash, como bem colocado no filme A mente brilhante, a essência se dá em entender a necessidade de colaboração entre os jogadores, sua racionalidade, e as políticas adotadas. Quando da crise dos mísseis, o risco era binário, ou seja, a crise poderia não ser temporal, poderia eclodir e não mais haver um retorno, o que ameaçaria a humanidade que conhecemos. Nessa linha, o primeiro tiro poderia ser o último. Feliz foi o final, com a supressão de poderes de ambos os lados, restrições e equivalências geopolíticas.
E agora, qual a resposta? Qual o jogo? Uns acusam a China de atiradora, conspiradora, e entra a acusação de histeria de um lado e omissão nacional do outro. Diferente da crise dos mísseis, existe a previsibilidade na atual situação, precedentes, mortes, registros, curas e aprendizados. Tudo passa. Pandemias, também.
Na dúvida, que se preserve a cautela, visualize o risco diante dos exemplos, pondere as relações institucionais e internacionais. Nós não temos um inimigo comum como se faz parecer, mas um ponto de inflexão para forçar e focar o ambiente de paz, do entendimento médio, do credor aliviar a dívida, do devedor compor e se esforçar a um desconto, de o governo abrir os cofres para quem é importante.
Que seja o momento de o nosso povo pensar como nação, geração e futuro, além do futebol e dos 7 a 1 que já levamos. Isolados já estávamos. E, que para que tudo possa sair da melhor forma, teremos que nos distanciar fisicamente, mas nos aproximar em gestos, solidariedade e empatia, aquele denominador comum que só se alcança quando todos perdem e todos ganham com o mesmo movimento, mesmo que provocado pela incerteza generalizada. Cuidar uns dos outros e de quem não conhecemos. Pois, se há algo racional, é que divididos não conseguiremos. Feliz quarentena para você. E que tenha a oportunidade de se conhecer.
* Advogado e conselheiro federal da OAB