Opinião

Artigo: O Brasil na pandemia

O presidente começa a mostrar as suas manguinhas sob os trajes presidenciais ao tentar acuar o Legislativo e o Judiciário


O sr. Bolsonaro está começando a mostrar as suas manguinhas sob os trajes presidenciais. Suas notas baixas na Academia Militar estão presentes em seus atos e falas desabridas pelos brasis afora e nas guerrilhas desenvolvidas com centenas de asseclas nas redes sociais. A novidade agora é a tentativa presencial de acuar o Legislativo e o Judiciário. Pelo fato de nenhum Cesar gostar de co-habitação nas casas do governo, cunhou-se o termo “cesarismo” ao tempo da democracia romana, herdada das polis gregas, principalmente de Atenas. Vem o nosso presidente de convocar à socapa manifestações de rua contra o Legislativo e o Judiciário, que não o deixam governar, no dia 15 de março. Mas a democracia é assim mesmo. É feita de pesos e contrapesos com a finalidade declarada de impedir a prevalência dos governantes. A teoria é norte-americana.

Churchil certa vez disse que preferia um péssimo parlamento a nenhum. Disse também que a democracia representativa era uma forma ruim de governar, mas, comparada com outras, era a melhor. São as palavras de um político nato e militante, sobre ser um homem de cultura, conhecedor da história universal. Foi o único a prever o mal intrínseco do Nacional Socialismo de Hitler e a segunda guerra mundial. Não deu outra. Quem gosta de passeatas e paradas são os odientos fascistas, como Hitler, Mussolini e militaristas.
Pois bem, o Sr. Bolsonaro é um projeto acabado (mas não declarado) de ditador. Está comendo pelas beiras, dia sim, dia não, deliberadamente, a estrutura constitucional da existência e co-existência dos Três Poderes da República: o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, e conta com o apoio desavisado de uns incultos da classe média, aliás a maioria.

O que mais deseja na vida é colocar na cabeça a coroa de ramos e glória de Júlio Cesar e esmagar nosso Legislativo como se fôra o “Senatus Romano” e, por isso, exatamente como fez Júlio, insufla as massas contra os poderes constituídos para assumir sozinho o comando da República. Esse é o sentido da marcha de 15 de março que ele e seus asseclas estão insuflando com “palavras de ordem” jamais vistas no país. O objetivo é desmoralizar o Congresso e fortalecer o Executivo (que de resto é só conversa fiada) para ele se tornar um ditador. A desculpa é de que não está fazendo nada porque o Congresso não deixa, uma mentira deslavada. A única reforma feita, fê-la o Congresso Nacional, a previdenciária. Diz que a mídia distorce o que ele diz. É de achar graça. Acrescenta que não dá- além de não roubar o Tesouro, sua obrigação mais primária - dinheiro à imprensa, outra mentira estruturada e repetida.

O sr. Bolsonaro é franco, é de se reconhecer, mas é também falso, justo o que muitos não querem ver, de propósito, para não se decepcionarem. De pouca valia essa atitude, pois mais cedo ou mais tarde veremos duas verdades. Primeiro, esse governo é um dos piores que jamais tivemos, pois não tem planejamento, ideias, coesão e objetivos, é uma bagunça total, o Rei e sua corte — tiram-se quatro ministros excelentes e dois sem reparos — é de duvidosa qualidade. Cá nos bastidores, sabemos que tanto o Moro, de quem Bolsonaro tem inveja, quanto o Guedes quiseram sair e foram contidos com grandes esforços. Se saírem, Bolsonaro fica como uma estátua sem base de sustentação.

Onde se viu um presidente governar sem maioria no Congresso no mundo civilizado? Apontem-me sequer um país grande e sério com parlamentares autônomos onde isso ocorre? Até na Rússia, Putin conversa, e constantemente, com a Duma. Trump pode até querer, mas vê-se obrigado a se agarrar a dois votos a mais no Senado. Na Câmara dos Deputados, nada de importante é lhe enviado sem prévia negociação. Na Alemanha, na França, que são parlamentaristas, o mesmo ocorre. E quando não há acordo como no Brexit ou algum item ou autorização demandada pelo primeiro-ministro britânico e resistida na Câmara dos Comuns, faz-se um referendum ou consulta ao povo, que desempata o litigio. É assim que funciona a democracia, seja no presidencialismo, seja no parlamentarismo.

Agora quem não tem cultura de Governo, habilidade política, o hábito de conversar e principalmente de ouvir e aprender, tem ego inchado e nenhuma autocrítica, só pode mesmo partir para o xingatório, a falta de educação, implicando ferimento ao decoro presidencial. E também parte para o recurso militar do confronto. É como se estivesse convocando seus militares para passeatas a se atracarem com seus inimigos. Mas o país não está em guerra. Querem jogar o povo contra as instituições da República. Isso constitui crime de lesa-pátria e incitação à violência. Logo veremos que essas passeatas, se ocorrerem, serão de partidários e não do povo brasileiro.
 
*Advogado