Opinião

Planejar para não faltar água

A gestão dos recursos hídricos é um tema de grande importância global. O cenário de mudanças climáticas e escassez de água, cada vez mais frequente em várias regiões do mundo, faz desse bem finito uma das prioridades para garantir a nossa sobrevivência nas próximas décadas. O assunto se tornou agenda indispensável dos governos na definição dos melhores usos da água.

Esse é um bem essencial não apenas para matar a sede. A água serve para irrigar a agricultura, criar peixes, gerar energia, resfriar termelétricas, transportar produtos em embarcações, entre muitos outros usos. Enfim, o uso múltiplo da água faz dela um insumo que deve constar na planilha das empresas. Portanto, a oferta de recursos hídricos tem impactos econômicos diretos para as localidades. Apesar de contar com a sorte de possuir mais de 10% da água-doce de todo o planeta, o Brasil ainda patina na gestão desse recurso, concentrado em 80% na bacia do rio Amazonas, que tem menos de 10% da população.

A criação de comitês de bacias hidrográficas tem sido uma importante iniciativa no avanço da gestão dos recursos hídricos. Na bacia do Rio Paraíba do Sul, que agrega 184 municípios dos estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo, está em plena discussão a necessidade de ações para enfrentar extremos como escassez e abundância de água. Na bacia do Rio Piracicaba, a preocupação está em atender às demandas hídricas, que utilizam 90% da vazão de referência das bacias.

O panorama atual é de muita atenção, principalmente nas regiões metropolitanas. Nos últimos anos, São Paulo, Distrito Federal, Estados do Nordeste, entre outros, enfrentaram períodos de estresse hídrico. O risco de faltar água na maior metrópole brasileira está afastado por um bom período, mas o cenário futuro requer fortes investimentos. Por outro lado, as enchentes têm se tornado um problema frequente diante do grande volume de chuvas nos últimos anos. As mudanças climáticas mostram que teremos que conviver com extremos em muitas partes do mundo.

As soluções são complexas e demandam a participação de toda a sociedade. A revisão do marco legal do saneamento, em debate no parlamento brasileiro, é importante, mas o seu alcance é limitado na gestão dos recursos hídricos. Precisamos avançar muito mais na formulação de políticas públicas embasadas em um planejamento de curto, médio e longo prazos. O novo marco legal tem passado a percepção de que a participação da iniciativa privada será a solução das nossas demandas de empreendimentos no setor. Sem sombra de dúvida, as companhias privadas têm papel de relevância no avanço do atendimento das demandas hídricas, mas elas estão longe de formular políticas da complexa gestão dos recursos hídricos.

O estado brasileiro deve cumprir esse papel, principalmente na área de saneamento. O Brasil precisa de uma política de Estado que perpasse governos e esteja embasada em um planejamento com fundamentos técnicos consistentes, capazes de oferecer um panorama detalhado das nossas demandas. No caso do saneamento, por exemplo, os dados do setor são aqueles declarados pelos 5.570 municípios brasileiros e integram o Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento(SNIS). Se 80% dessas localidades sequer contam com um profissional especializado para elaborar um plano de saneamento municipal, dificilmente esses dados repassados podem ser considerados confiáveis. Um planejamento deve contar com informações auditadas para alcançar um diagnóstico preciso do setor, assim como para traçar um panorama real das necessidades de investimentos.

Vale lembrar ainda que cada região brasileira tem suas próprias características, que um planejamento adequado do estado brasileiro vai conseguir atender. Esse instrumento contribui ainda para a criação de bons projetos, ferramenta fundamental para reduzir o número de obras paradas ou com aditivos de preço e prazo, além de ser uma vacina contra a corrupção. Ele permite a implantação do empreendimento conforme planejado e prevê todas as circunstâncias para a sua adequada utilização ao longo de toda a vida útil.

O debate sobre questões de sustentabilidade ganhou impulso nas últimas décadas diante do fracasso humano de fazer a correta gestão dos nossos recursos. Hoje, governos, empresas e população já vislumbram os prejuízos que podemos ter com a falta de um planejamento adequado do uso das águas, das florestas, dos minérios, entre outros. O mundo quer um futuro melhor.