Não foi a dengue que matou Dênis, um garoto de 10 anos, quase a idade do meu filho. Foram o descaso, a incompetência, a falência de um sistema público de saúde que condena à penúria e, às vezes, à morte, o cidadão que paga impostos e cumpre seus deveres perante o Estado. Michel tentou salvar o filho várias vezes. A primeira delas, em 24 de janeiro, quando o levou a uma unidade básica de saúde de Ribeirão Preto (SP). Os médicos não solicitaram nenhum exame clínico. Alegaram diarreia. O pai retornou tantas vezes com a criança, até que na sexta-feira da semana passada o menino começou a urinar sangue e sofreu uma parada cardíaca.
Nada trará Dênis de volta. E a dor de Michel somente ele sentirá. O pai terá de lidar com um vazio brutal. Seu filho não sofreu uma morte natural. Foi assassinado, vítima de homicidio culposo. Vítima da preguiça, do desleixo, da desfaçatez de um serviço de saúde do qual grande parte da população é refém. Um sistema que impõe filas intermináveis aos cidadãos que, por tantas vezes, esquece o paciente numa maca do corredor de um hospital superlotado, sob a desculpa de que ele foi atendido. Um sistema que escolhe quem vai morrer.
Nenhuma autoridade da área de saúde provavelmente foi oferecer o ombro a Michel enquanto velava o corpo inerte do filhinho. Provavelmente, o caso ficará impune, relegado às denúncias na imprensa e às lágrimas de um pai de coração destroçado. Confesso que quando li a reportagem sobre a morte de Dênis tive vontade de chorar. Eu me coloquei no lugar de Michel. Olhei para o meu filho e o desespero de sua ausência se apossou de meu espírito.
Nenhum pai deveria ser obrigado a sepultar o filho por um erro ou por uma absoluta irresponsabilidade médica. Nenhum pai deveria suportar voltar para a casa sem o filho nos braços e entrar no quarto do pequeno sabendo que ali permanecerá sem sentido por todo o sempre, porque simplesmente fizeram pouco caso ao atendê-lo.
De que adiantam estatísticas sobre postos de saúde, vacinas distribuídas, recursos injetados na área se absurdos como esse ocorrem? Não me venham falar que a agonia de Dênis foi um caso isolado. É algo absolutamente intolerável, merecedor da mais completa repulsa e de nojo. A você, Michel, meus mais profundos sentimentos e um abraço irmanado de um pai de uma criança tão linda quanto seu filhinho. A você, Dênis, minha dor por saber que foi arrancado dessa vida, forçado a abandonar seus sonhos e obrigado a dizer adeus ao seu pai. Descanse em paz, menino, longe de uma sociedade fadada ao fracasso.