Opinião

Aplicação do compliance no Distrito Federal

A regra é aplicável como requisito para assinatura de contratos e congêneres firmados em 2020, acima de R$ 5 milhões, e com prazo de validade ou execução superior a 180 dias

Desde 1º de janeiro passou a valer a exigência, disposta na Lei Distrital nº 6.112/2018, alterada pela Lei nº 6.308/2019, de implementação de Programas de Integridade (compliance) às empresas que firmem contratos com o Distrito Federal, em todas as esferas. A regra é aplicável como requisito para assinatura de contratos e congêneres firmados em 2020, acima de R$ 5 milhões, e com prazo de validade ou execução superior a 180 dias.

Ao alterar o projeto inicial, em maio de 2019, os distritais deram mais prazo à administração e ao mercado para se adaptarem às novas regras. O que se espera, entretanto, é que os primeiros casos ainda enfrentem as dificuldades do ineditismo.

Somente no último dia 15, é que o governo publicou o Decreto nº 40.388, que disciplina a avaliação dos Programas de Integridade de Pessoas Jurídicas. A regulamentação definiu que os órgãos da administração pública direita ou indireta do DF deverão exigir um relatório de perfil e um relatório de conformidade do programa das empresas

Esses relatórios deverão ser inseridos no Sistema Eletrônico de Informações (SEI) e encaminhados à unidade de compliance da Controladoria-Geral do Distrito Federal (CGDF). Entretanto, as diretrizes e procedimentos de avaliação desses relatórios ainda serão definidos pela Controladoria.

O sistema de compliance engloba um conjunto de mecanismos e procedimentos de ética, controle e auditoria que mapeiam riscos, criam estratégias para evitá-los, mitigá-los ou eliminá-los, bem como ensinam as empresas a tratar e reprimir ocorrências.

Se bem aplicadas, as regras têm grande potencial para proteger as empresas e a administração pública de atos lesivos à ética, evitar fraudes e atos de corrupção. Além disso, o compliance efetivo melhora o desempenho e a qualidade das relações contratuais, imprimindo-lhes mais transparência.

O principal pilar do sistema é a difusão da cultura da honestidade e da integridade. Essa cultura, materializada em procedimentos, pode evitar não apenas atos de corrupção e infrações éticas, mas também fraudes internas. Um ponto-chave para o sucesso é o compromisso da alta administração das empresas. O exemplo que vem de cima é a principal fonte da cultura empresarial.

Em 2019, muitas empresas tiveram dificuldades de se preparar para atender as novas regras pela incompreensão dos reais objetivos de um Programa de Integridade. Em geral, esses sistemas são tratados como regras adicionais às quais as empresas devem se adequar, com tons mais elevados de burocracia que de utilidade.

É comum encontrar no mercado empresas que oferecem um “compliance de prateleira”, desenhados tão somente para cumprir os requisitos legais, mas os programas não se amoldam aos processos internos e, consequentemente, são pouquíssimos ou nada efetivos.

Outra armadilha que assombra empresários é a implementação de programas que atribuem à equipe de compliance a responsabilidade principal de observância da Lei Anticorrupção, criando, basicamente, um segundo departamento jurídico na empresa. Quando isso acontece, além de o programa perder efetividade, ele engessa os processos internos, convertendo a utilidade em prejuízo.

Para que o programa funcione e traga resultados positivos, é imprescindível que ele seja feito de forma personalizada, após acurado conhecimento das atividades e processos internos da empresa, e desenvolvido de acordo as características e estilo de cada pessoa jurídica — cada empresa com o seu formato.

O ideal é que os mecanismos de integridade sejam internalizados mais como forma de incentivo do que como regras punitivas. A aderência positiva é muito mais eficaz do que a obediência por medo de punição. Essa é uma das principais diferenças entre usar um “compliance de prateleira” e ter um sistema personalizado, que seja absorvido com a maior naturalidade possível por todos os colaboradores da empresa.

Apesar de a lei distrital e do novo decreto trazerem alguns requisitos para validade dos programas, os empresários e a CGDF certamente enfrentarão o desafio do ineditismo neste 2020. Caberá aos atores deste cenário fazerem com que a lei seja mais proveitosa do que burocrática, pois o objetivo é imprimir mais ética e correição nas relações público-privadas. Aliás, é o que se espera para o país, independentemente de haver ou não leis que incentivem a honestidade.

*Cristiana Muraro é advogada, parecerista e consultora

*Álvaro Miranda costa Júnior é advogado, palestrante e consultor. Foi membro da Comissão de Compliance da OAB/DF e integrou grupo de estudo de análise do PL Distrital 435/19.