Jornal Correio Braziliense

Opinião

Trabalho, renda e desigualdades sociais

Em tese, as sociedades humanas se organizam para que haja equidade social e bem-estar coletivo. Na prática, essa teoria de justiça social irá depender do grau de solidariedade que algumas coletividades assumem, com maior ou menor empenho e teor humanitário. Seria desejável que em todos os recantos do planeta a atuação dos governantes tivesse como meta a melhor distribuição de recursos para a mobilidade plena dos cidadãos em todos os setores da vida cotidiana. Assim procedem as economias mais evoluídas, porque o produtor será também o consumidor do que foi produzido coletivamente. Essa atitude aquece a economia e pode reduzir o desemprego.


A realidade, em muitos casos, inclusive no nosso contexto, é bem diversa: o produtor de um bem acaba por não ter acesso a ele, quando colocado no mercado. Ele é considerado produtor não consumidor. Isso afeta a economia do país. É perceptível que os trabalhadores, ao construirem habitações, podem não ter recursos para adquirir o imóvel que eles construíram. Por esse inacesso, os que não possuem recursos acabam por morar em assentamentos não legalizados ou em habitações não condizentes com a dignidade humana. Isso ocorre com comunidades inteiras, sob a forma de habitações provisórias ou favelas, como as existentes nas grandes cidades brasileiras de sul a norte.


A mídia tem mostrado que há aumento do número de pessoas que vivem com muito menos do que um salário mínimo ou R$ 145. Aliás, de um ano para outro, o salário mínimo foi reajustado sem cobrir a inflação real do período. Deste ano para 2020, foi estabelecido em R$ 1.040, que serve de parâmetro para outros reajustes. Por isso, a ;atualização; foi de apenas R$ 42,00, valor que em pouco tempo será absorvido pela inflação.


A Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED) no D, traz informações de agosto (a última pesquisa de 2019). Os números captados são os seguintes: leve aumento do contingente de desempregados, 313.000 no DF ou 18,3% da PEA (população economicamente ativa). Em julho de 2019, eram 308.000 desempregados ou 18,1% da PEA. De um mês para outro, 5.000 pessoas perderam o emprego e estão fora do mercado de trabalho (temporária ou sazonalmente). Significa isso que, para sobreviver, mais pessoas estarão no ;mercado informal; de trabalho, fazendo bicos ou tarefas esporádicas, vendendo objetos nos semáforos ou, simplesmente, aumentando o número de pedintes e moradores ;em situação de rua; Muitos, ainda, aguardam que as oportunidades de trabalho voltem a ser criadas na Capital, mesmo que seja ;sem carteira assinada;. Em agosto, o setor privado aumentou o assalariamento sem carteira (7.000 pessoas ou 6,5% da PEA). Igualmente, no mês, houve crescimento do número de autônomos (8 mil), o que faz pensar em trabalho precário, que nem sempre colabora com o sustento da família.


Paradoxalmente, mesmo com aumento do desemprego e do trabalho precário, houve crescimento dos rendimentos segundo as categorias selecionadas pela PED. Em julho de 2018, o setor privado apresentou remuneração da ordem de R$ 3.811,00, e em julho de 2019, o salário teve acréscimo de 2,6 % no período, em média, R$ 3.910,00. Em julho de 2018, o setor público tinha como remuneração média R$ 8.330,00. Em julho de 2019, teve acréscimo de 3%, chegando a R$ 8,580,00, ou mais do que o dobro da remuneração média do setor privado. Isso explica a grande procura pelo emprego público em concursos ou em indicações ;de confiança; por parte de políticos e administradores públicos.


Nos resultados da PEA de agosto, a questão da raça/cor e de gênero apresenta dados para reflexão. Os não negros possuem 14% de taxa de desemprego abaixo da média (18,3%), enquanto os negos têm taxa acima da média, ou 20,2%. O desemprego é menor entre os homens (15,7%), enquanto as mulheres chegam à taxa de 20,9% no mês de agosto, portanto superior à média e à média dos homens.


A PEA é rica em dados, que servem para orientar o setor público e as empresas no sentido de administrar os recursos humanos, na admissão e demissão de pessoal e respectiva remuneração. Se há excesso de demissões, haverá menor número de compradores no comércio e pode gerar o que já se nota ; lojas e empresas fechando as portas. Há, ainda, rebatimento em outros setores: redução do consumo, instabilidade na ascensão social, precariedade na segurança pública, aumento dos moradores em situação de rua etc.


Finalmente, são visíveis os desafios a enfrentar na redução da taxa de desemprego geral e aumento da taxa de ocupação das mulheres e dos negros, objetivando a democratização das oportunidades e redução das desigualdades socioespaciais em nosso contexto.