A comoção com as queimadas na Amazônia não é suficiente para sua conservação. Com a maior parte dos brasileiros vivendo nos grandes centros urbanos, mais cedo ou mais tarde, a distância da floresta afasta o foco da atenção. E a conservação da Amazônia é importante demais para ser deixada ao sabor de uma mudança de mentalidade.
A Amazônia pode não ser o pulmão do mundo, mas é lar de uma diversidade massiva de espécies, armazena quantidade brutal de carbono e grande parte da água-doce do planeta. Impacta direta ou indiretamente em ciclos biogeoquímicos e no clima. E, ainda por cima, é linda. Por todas essas razões, precisamos conservá-la.
Mas a Amazônia também significa grandes negócios: US$ 9 bilhões por ano da mineração, US$ 5 bilhões da carne e US$ 2 bilhões, da extração de madeira. Todos competindo diretamente com a preservação da floresta. Os negócios sustentáveis são atividades econômicas modestas: US$ 50 milhões por ano da produção de castanha-do-brasil, US$ 100 milhões do ecoturismo e US$ 500 milhões do açaí. É ingênuo pensar que esses produtos, de baixo valor agregado e gerados com baixa tecnologia, possam competir com a economia estabelecida.
Para salvar a Amazônia, precisamos de novo modelo de negócios, que crie riqueza e justifique a necessidade de mudança de mercado, de infraestrutura e de mentalidade, afinal ,floresta em pé tem valor. E isso só ocorrerá com produtos, serviços e negócios de alto valor agregado e de alta tecnologia, sem impactar a floresta.
Apenas o Captopril, medicamento usado no controle da pressão arterial e descoberto a partir do veneno da jararaca, rende US$ 5 bilhões por ano. Um único medicamento faz frente a toda a carne da Amazônia. Hoje, entre 50% e 80% dos produtos das farmácias tiveram origem na biodiversidade.
Mas não se faz isso sem cientistas. O tempo das descobertas por acaso passou. Hoje, elas são feitas por profissionais altamente treinados para extrair o conhecimento armazenado nas espécies, utilizando sequenciadores de DNA, cromatógrafos de alta precisão, espectrômetros de massas, Inteligência artificial e grande capacidade computacional. Mas o Brasil ainda tem menos da metade da média mundial de cientistas por habitante, que é de 1.000 doutores por um milhão de pessoas. Para salvar a Amazônia, precisamos formar mais doutores em biologia, física, química e matemática e de cientistas sociais para nos ajudar a resolver os conflitos humanos que aparecerão.
Felizmente temos a infraestrutura para fazer isso, ainda. O Brasil produz mais de 50 mil mestres e doutores por ano e, se aumentarmos o ritmo, poderemos rapidamente compensar nossa desvantagem. E o país necessita aumentar muito o investimento em ciência e tecnologia para conseguir produzir a inovação que vai gerar a receita que precisa para repartir benefícios com a sociedade.
Também temos os instrumentos legais disponíveis. A Lei da Biodiversidade, de 2015, o novo Marco Legal de C, de 2016, e a Lei do Investidor Anjo, de 2017, são exemplos de arcabouço legal que estão disponíveis. Inclusive para financiar, através de subvenção econômica, com recursos de isenção fiscal previstos nessas leis, as atividades inovadoras e empreendedoras que vão gerar essa riqueza. O Fundo Amazônia, gerido pelo BNDES, mesmo com os alemães e noruegueses retirando seu apoio, ainda tem mais de R$ 1 bilhão para investir em desenvolvimento de tecnologia que gere riqueza com a floresta em pé.
Já começamos a ver exemplos dessa mudança de modalidade negócios nas florestas. Vale conhecer o exemplo do Legado das Águas, da Reservas Votorantim, a maior área natural privada de mata atlântica do país. A empresa colocou biotecnologia no seu plano estratégico e desenvolve projetos de bioprospecção de ativos da biodiversidade para os mercados de cosméticos, farmacêuticos e de alimentos. Dinheiro dá em árvore, mas só se cultivado com ciência e empreendedorismo.