Em outubro, avolumam-se as notícias sobre o futuro do servidor publico, com ênfase no término da estabilidade e outras medidas complementares, justificado por uma redução na folha de pagamento. Quem vive em Brasília desde a década de 1980,percebe pela construção dos anexos e dispersão de órgãos públicos no Plano Piloto, que foi grande o crescimento no emprego de mão de obra pelo setor público, o que estaria motivando a celeuma em torno da estabilidade.
De 1996 a 2016, o total de servidores públicos (três esferas de governo) cresceu 83%, passando de 6,264 milhões em 1995 para 11,492 milhões em 2016. Nesse período, o incremento no governo municipal foi de 175%, no estadual de 28% e no federal de 25%. O alto percentual no emprego pelo setor puúblico municipal está atrelado ao forte aumento no número de novos municípios aprovados.
De acordo com o Painel Estatístico de Pessoal, do Ministério da Economia, o total de servidores federais em agosto de 2019 era de 1.277.639, dos quais 47,6% ativos, 38,7 aposentados e 18,7% instituidor de pensão. Desse mesmo total, 37,2% estavam no Sudeste, 22,4% no Nordeste, 19,9% no Centro-Oeste, 11,1% no Sul e 9,4% no Norte.
Cerca de 8.240 servidores teriam sido contratos a partir de setembro de 2016 e, portanto, ainda cumprindo o período probatório, o que representa 1,3% dos servidores ativos. Quanto à lotação dos servidores federais, somente quatro ministérios Saúde, Esporte, Infraestrutura e do INSS somam 34%, órgãos eminentemente prestadores de serviços diretos para a população.
Sem entrar no mérito da discussão entre as teorias de direito administrativo e direito do trabalho, a extinção da estabilidade, se aprovada, além um impacto financeiro pequeno, em face do percentual de servidores a serem alcançados, tem-se a impressão de que estariam sendo exonerados justamente os servidores que prestam serviços diretos para a população, piorando a qualidade dos serviços.
Não se deve falar em reforma administrativa sem fixar como seu objetivo principal a melhoria na qualidade dos serviços prestados ao cidadão, por sinal, avaliado pessimamente conforme dados do Consumidor.Gov do Ministério da Justiça. E a razão é muito simples. Será que cada servidor tem claro quais as metas quantitativas e qualitativas que deverá alcançar a partir da contratação? Sem essa definição firmada anualmente por meio de um plano de trabalho individual, o servidor simplesmente trabalha, sem uma perspectiva do dever a ser cumprido.
Difere do trabalhador no setor privado, que recebe regularmente as metas a serem cumpridas e de que maneira (qualitativas) deveria se comportar. Porém, devido a uma estrutura organizacional extremamente ampla e pesada, constituída por secretarias, subsecretarias, coordenadorias etc. etc., o servidor da ponta pouco sabe do seu papel naquela estrutura e de que forma estaria contribuindo para que aquele órgão fosse considerado eficiente e eficaz.
Um segundo fator importante seria rever, urgentemente, o sistema de avaliação do desempenho de cada servidor e seus respectivos supervisores. Hoje, para que o supervisor não tenha nenhum problema com o supervisado, ao final de cada ano o premia com as qualificações mais altas, descumprindo, assim, seu papel maior como supervisor. Entra e sai supervisor, já que o servidor tem cadeira cativa no departamento, e não se vê nenhuma tendência a um serviço mais bem prestado e mais produtivo.
Ainda que o atual sistema de avaliação fosse bom (o que não o é) são escassos os recursos para capacitação de servidores e, o que é pior, sem nenhum nexo com o desempenho. A capacitação não pode continuar sendo tratada como premiação, mas voltada para a melhoria dos serviços prestados, o que passa pelo cumprimento das metas qualitativas, tais como assiduidade, presteza, conhecimento de idiomas, ética no trabalho.
O sistema de avaliação deveria ser estendido aos supervisores, avaliado por aqueles acima deles na estrutura organizacional, onde a capacidade como supervisor mereceria um capítulo à parte do seu desenvolvimento como técnico. Seria o fim dos desempenhos proforma, sem o devido respeito com o servidor e seus supervisores.
No processo de restruturação dos servidores, restaria abordar as condições segundo as quais um servidor, mesmo tendo cumprido o período probatório, poderia ser demitido após uma sequência de medidas voltadas à melhoria do desempenho e sujeito à revisão por um grupo estruturado voltado para o exame final do processo, eximindo ou não a responsabilidade do supervisor imediato.
Finalmente, apesar de se dispor de Código de Ética do Setor Público, faz-se urgente um processo de capacitação de todos os servidores públicos, incluindo estados e municípios, para que conhecessem em detalhes as principais definições e o comportamento ético esperado.
Entendo que, na proposta que vem sendo preparada pelo Executivo, predomina a questão do servidor. Caso esses pontos acima anunciados sejam negligenciados, pouco se avançará no objetivo maior da proposta que deveria buscar como objetivo principal a melhoria dos serviços prestados pela administração pública ao cidadão.