Jornal Correio Braziliense

Opinião

'Não sei, mas continua chorando...'




Na década de 1990, em uma cidade do interior do estado do Rio de Janeiro, havia um vereador que se notabilizava por não perder batismo e enterro. Certa feita, ele e um assessor passavam pela rua quando viram um carrinho de transporte de urna funerária sendo levado pela família no caminho entre a igreja e o cemitério. Ato contínuo, os dois correram para segurar uma das alças e ajudar a empurrar o carrinho. Nesse momento, o assessor pergunta ;Quem é?;, recebendo como resposta ;Não sei, mas continua chorando;. Bem, só para a informação de vocês, pouco tempo depois esse vereador foi eleito prefeito.


Essa história contada nos dias atuais, marcados por redes sociais e informações em tempo real, pode parecer ainda mais bizarra. Porém, quando se trata de campanhas eleitorais, podemos afirmar que muitas das premissas atravessam décadas e continuam valendo até hoje. Afinal, o que é uma boa estratégia eleitoral? Como identificar as mensagens e propostas mais alinhadas à parte significativa do eleitorado? Em 2020 teremos eleições para prefeituras e câmaras municipais nos 5.570 municípios brasileiros, então, resolvi abordar algumas questões que podem ajudar a entender os processos eleitorais.

A primeira questão é reconhecer que o eleitorado é formado por pessoas comuns. Elas sofrem, se divertem, fazem amizades, trabalham, estudam, são desempregadas, enfim, vivem. E apesar das diferenças entre elas, todas têm algo em comum: a emoção. Ou seja, quem pretende conquistar sua vitória em campanhas precisa encontrar maneiras de tocar o emocional do eleitorado. Em outras palavras, para conquistar o apoio e o voto, é imprescindível que as pessoas olhem para o candidato ou candidata e falem pra si mesmas: ;Estamos juntos!”.

A segunda questão é saber como provocar esse tipo de reação. Para isso, é fundamental captar o que está no imaginário da população, algo muitas vezes intangível, mas absolutamente possível de ser feito de diversas maneiras, desde as mais simples, como o acompanhamento do que rola nas redes sociais, até as mais elaboradas, como a realização de pesquisas de campo estruturadas. O que importa é trabalhar com os recursos disponíveis para alcançar essa percepção.

A terceira questão é a identificação de bandeiras, propostas e mensagens que traduzam o sentimento captado. Nesse momento, é muito comum vermos candidatos e candidatas preocupados em detalhar exageradamente suas propostas. Sem desprezar a importância do conhecimento e aprofundamento em torno de temas relevantes, numa campanha sai na frente quem consegue se comunicar com o eleitorado de forma simples e direta, propiciando o cumprimento do primeiro quesito aqui levantado: tocar a emoção das pessoas.

A quarta questão é fazer o mapeamento das áreas territoriais prioritárias em alinhamento com as bandeiras definidas e os segmentos do eleitorado identificados. Ao fazer esse exercício, pode-se descobrir que em determinadas regiões a possibilidade de sucesso eleitoral é maior que em outras; ou ainda, que as mensagens escolhidas encontrem mais apelo junto a determinados grupos e setores sociais.

Atendidas as premissas acima, passa-se à fase da organização da campanha para Prefeitura ou Câmara Municipal. Nesse momento, é muito comum vermos que a primeira preocupação de candidatos e candidatas é com o custo financeiro da empreitada. Claro que não é possível fazer campanha sem dinheiro, mas a estimativa do valor necessário está, obrigatoriamente, relacionada à estratégia definida.

Assim, a primeira tarefa a ser realizada nesta fase é definir a estrutura necessária para colocar de pé a campanha, selecionando as principais atividades a serem executadas para, em seguida, começar o processo de seleção de quem vai se responsabilizar pela execução de cada uma delas. Nesse momento, é recomendável a montagem de um time que combine a participação de profissionais com a de apoiadores que atuem de forma voluntária.

Cumpridas essas etapas, a campanha já está pronta para se iniciar. Entretanto, nada disso dará certo sem que o principal tempero seja adicionado a essa mistura: trabalho, muito trabalho. A conquista de cada voto é um desafio que depende de três fatores: dedicação para colocar em prática a estratégia definida; capacidade de convencimento para encantar seu potencial eleitorado; e demonstrar, desde a campanha, que tem compromisso com as propostas e bandeiras que defende. Por isso, o vereador citado no início do artigo fazia daquele jeito: ele acreditava em sua estratégia e a colocava em prática.