O adolescente lavava carros num estacionamento. Sob chuva ou Sol, passava o dia no trabalho exaustivo. Nada de escola ou lazer. Não havia tempo. O Conselho Tutelar foi acionado, mas era difícil mantê-lo afastado da labuta, porque sustentava a família. A história me foi contada por uma conselheira tutelar como exemplo da falha na rede de proteção a crianças e adolescentes. O garoto era tirado da situação cruel e ilegal, mas, sem a devida assistência à família, acabava voltando. ;Como protegê-lo? O Estado tinha de prover de imediato uma bolsa para ele, inserir a família em programas sociais, mas não temos políticas públicas para erradicar o trabalho infantil;, disse.
A necessidade, que empurra meninos e meninas para a exploração em comércio, construção, agricultura, indústria, serviços domésticos, é a mesma que os fazem trabalhar diretamente com a família, em feiras, como ambulantes, vendendo produtos de porta em porta, nos semáforos. Sem políticas públicas eficientes para auxiliar de imediato as famílias e, numa outra vertente, combater a desigualdade social, eles continuarão a ter os direitos violados.
O Brasil tem 2,4 milhões de crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil, e 83% estão na faixa etária de 14 a 17 anos. Aos menos 79 mil têm entre 5 e 9 anos. Num país em que a miséria aumenta e a fome volta a assolar com força total, esses números, de 2016, nem devem mais refletir a realidade. E isso corre num país signatário da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas, que prevê a erradicação do trabalho infantil, em todas as suas formas, até 2025.
Trabalho impacta o desenvolvimento físico e mental de crianças e adolescentes. A depender da atividade que exercem, estão sujeitos a toda sorte de acidentes, doenças, abusos e até à morte. Há comprometimento também do futuro. O cansaço os faz abandonar a escola ou pouco aproveitar as aulas. Na vida adulta, sem qualificação necessária para competir no mercado de trabalho, acabam relegados a subempregos, renovando o ciclo de pobreza.
Nesta semana, o Ministério Público Federal lançou uma plataforma com informações sobre trabalho infantil. O compromisso é fornecer dados relevantes para a tomada de decisões no combate ao drama. É um passo importante para um país cujo presidente da República é o primeiro a banalizar o problema.