Jornal Correio Braziliense

Opinião

O futebol: gênero e negócios



Em 7/7/2019, um domingo, o futebol mostrou sua potência para entreter as pessoas em escala universal. Foram três finais de campeonatos distintos, em regiões onde esse esporte movimenta fanatismos, paixões e também muito dinheiro: a final da Copa do Mundo feminina, que se realizava na França; a final da Copa América masculina que se realizava no Brasil; e, a final da Copa de Ouro masculina que se realizava nos Estados Unidos da América.
A Copa do Mundo feminina foi um êxito esportivo e financeiro. Por exemplo, a semifinal entre os EUA e a Inglaterra foi mais vista televisualmente neste último país, que a final masculina da Champions League travada entre o Tottenham e o Liverpool, dois times ingleses, que jogaram em Madri, na Espanha. Na França, onde o mundial foi disputado, foram mais de 11 milhões de telespectadores. Afora o cenário televisivo dos estádios sempre lotados para as distintas partidas. No Brasil, foram mais de 108 milhões de pessoas impactadas pelas partidas. Um sucesso indubitável!

O indiscutível gosto mundial pelo futebol feminino também pode ser atestado pelo indicador de que para essa Copa, a Federação Internacional de Futebol (Fifa) credenciou 1,3 mil repórteres e fotógrafos da mídia impressa. Quatro anos antes, na Copa do Mundo do Canadá, esse número foi a metade.

Desde a perspectiva mercadológica, a audiência é um fator crucial para a consolidação do futebol feminino. Regra comercial primária, quanto mais gente assiste à modalidade, mais interesse se gera para o mercado publicitário. E esse fenômeno impacta diretamente nos argumentos para entidades e clubes negociarem seus patrocínios. O futebol feminino é um produto e um mercado em franca ascensão.

No âmbito do Mundial recentemente finalizado, duas entrevistas chamaram a atenção. Uma da exponencial craque Marta após a eliminação da canarinha pela França. Nessa, ela clamou por mais apoio, atenção e renovação ao futebol feminino brasileiro. Provavelmente, na última Copa do extraordinário tridente Marta, Cristiane e Formiga, uma nota teria de ser dada pela hexa melhor jogadora do planeta: ;Não vai ter uma Formiga, uma Marta, uma Cristiane para sempre. O futebol feminino depende de vocês para sobreviver. Então, pensem nisso. Valorizem mais! Chorem no começo para sorrir no fim;. Um importante recado, pois a falta de novos nomes no futebol feminino brasileiro é um dos temas mais urgentes a serem resolvidos. Não obstante, algo também depende dos fãs quanto ao futebol feminino, apoiando, assistindo aos campeonatos estaduais e o nacional. Ademais, os cartolas, os dirigentes deverão oferecer condições e qualidade em igualdade de condições às facilitadas ao futebol masculino.

Outra entrevista marcante foi a da estadunidense Megan Rapione, eleita a melhor jogadora do Mundial de 2019. Ela disse não entender esse calendário montado pela Fifa, que proporcionava em um único dia três finais de torneios tão importantes para o futebol: o Mundial feminino, a Copa América e a Copa Ouro masculinas. A capitã da seleção tetracampeã feminina apontou, com razão, que desde a perspectiva mercadológica era um desperdício de esforços. Segundo ela, essa péssima programação, uma ;ideia terrível;, só dava a entender que ;a Fifa não respeita as mulheres tanto assim;. Finalmente, com sua sinceridade costumeira, ela arrematou que ;em geral, não sente o mesmo respeito que os homens por parte da Fifa;.

Não há dúvidas, a Fifa tem de rever seus padrões de tratamento ao futebol feminino em comparação ao futebol masculino.
O assunto não é novidade. A atual Bola de Ouro do futebol feminino, a norueguesa Ada Hegerberg, avisou há dois anos que não disputaria o Mundial se sua federação não igualasse as condições entre o futebol masculino e o futebol feminino. Seu posicionamento não tinha a ver exclusivamente com dinheiro, mas também com infraestrutura, planejamento, desenvolvimento e concentrações de mesmo nível do que as dispensadas aos homens. Ela disse: ;O futebol é o esporte mais importante da Noruega para as crianças. É assim durante anos. Mas as garotas não têm as mesmas oportunidades que os garotos;. Em consequência, o Mundial 2019 e a Noruega não desfrutaram da atuação dessa extraordinária jogadora. Assim sendo, a realidade mercadológica poderá ser um importante fator de indução da igualdade de gênero no futebol profissional.