Jornal Correio Braziliense

Opinião

Aprender (e ensinar) sem medo

;Trocamos o portão há um mês. Como o senhor pode ver, já há cinco marcas de tiros.; Esse foi o relato do diretor de uma escola de Samambaia que evidencia que o nível de violência em nossas escolas chegou a grau insuportável. Pesquisas, estatísticas, relatos e o noticiário corroboram. Desde o início do ano, soubemos do aluno que foi espancado por causa do tênis que estava usando, de um professor que foi agredido e de outro que foi assassinado dentro da escola, do massacre em Suzano, da presença de armas, drogas e álcool em salas de aula, da mãe que queria bater na diretora, do feminicídio dentro de uma de nossas sedes. Isso, sem falar nos casos de bullying, cyberbullying, assédio e outros tipos de violência que dificilmente chegam a nosso conhecimento.

A falta de segurança nas escolas é a principal preocupação de pais e familiares de alunos e é a segunda maior preocupação dos próprios alunos. Mais da metade dos professores do Distrito Federal foi vítima de violência e praticamente todos (97%) testemunharam agressões dentro das escolas. Dados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) colocam nosso país como o pior do mundo no ranking de violência contra professores.

A violência tem impacto devastador na saúde, no bem-estar e no desenvolvimento mental e emocional, não só de crianças e jovens, mas também dos profissionais da educação. Em profissionais, algumas consequências são o aumento das taxas de depressão e estresse. Nas crianças e jovens, são o aumento da ansiedade, de ataques de pânico, automutilação e tentativas de suicídio. Dependendo do caso e da frequência da exposição à violência, traumas e bloqueios cognitivos podem ocorrer. A médio e a longo prazo, a convivência com agressões leva a pessoa a naturalizar a brutalidade e ela própria passa a demonstrar comportamentos agressivos.

O caso de crianças e adolescentes requer, obviamente, o máximo de atenção. A exposição crônica à violência pode afetar partes do cérebro. No caso das crianças, é provável que tenham dificuldade em distinguir entre realidade e fantasia e passem a ver o mundo como lugar sombrio, inseguro, onde podem ser machucadas a qualquer momento. Para os adolescentes, o córtex pré-frontal é a última parte do cérebro a se desenvolver e amadurecer. Ele é responsável pelo processamento de informações, pelo controle dos impulsos e pelo raciocínio crítico. Os que sofrem ou testemunham agressões têm a atividade do córtex pré-frontal diminuída, e isso faz com que tenham mais dificuldade com a solução de problemas, com a avaliação de riscos e com a gestão de emoções.

Depois de conhecer os fatos e ouvir os relatos e pedidos de socorro por vezes desesperados dos profissionais, das famílias e dos próprios alunos, decidimos elencar o enfrentamento à violência e à educação para a paz como uma de nossas principais bandeiras. Acreditamos que é possível construir um mundo mais justo e fraterno para todos e que essa construção deve começar, necessariamente, dentro das escolas. Como preconiza a Constituição, o Estado, a família e a sociedade devem se aliar para efetivar uma educação integral, que forme cidadãos, desenvolva as dimensões humanas, e que tenha o respeito, a solidariedade e o amor ao próximo como valores inegociáveis.

Sob o guarda-chuva dessa macropolítica, incluímos um pacote de medidas, ações, programas e políticas, de diferentes vertentes. Por um lado, com total apoio do governador Ibaneis e de outras pastas, nomeamos mais de 600 orientadores educacionais, que têm como responsabilidades apoiar a formação integral dos alunos, prezar pelas relações, liderar a reflexão sobre a ética e valores morais e a solução de conflitos. Planejamos fortalecer as equipes multidisciplinares formadas por orientadores, pedagogos e psicólogos, estratégia fundamental em nosso plano de enfrentamento à violência nas escolas. Além disso, estamos implementando projetos e cursos para a cultura da paz, mediação de conflitos, comunicação não violenta, competências socioemocionais, práticas integrativas de saúde (meditação, reiki, terapia em grupo, automassagem) em parceria com a Secretaria de Saúde, e ações com artes, cultura e esportes.

Contudo, acreditar que apenas essas medidas sejam suficientes para resolver o problema seria, no mínimo, ingenuidade. A realidade que está posta é dura, de violências extremas, frequentes, e requer medidas severas. Por isso, estabelecemos uma relação próxima com a Secretaria de Segurança, não só para implementar as escolas de gestão compartilhada, mas para aumentar o efetivo do batalhão escolar, para ter policiais presentes nas escolas sempre que necessário e, em breve, para monitorar as dezenas de milhares de câmeras que estão sendo instaladas dentro e ao redor das instituições.

Utilizaremos diferentes tecnologias para controlar a entrada e saída dos alunos, profissionais e de qualquer pessoa nas escolas, regionais e sedes da educação. Modificamos o regimento escolar para esclarecer direitos, deveres e consequências, incluir medidas disciplinares mais rigorosas e dar poder a professores e gestores para que sejam capazes de liderar a criação de ambientes ordeiros, organizados e tranquilos. Eles também terão à disposição um aplicativo para avaliar comportamentos e para ter acesso imediato à polícia (botão de pânico). Estamos, finalmente, criando protocolos e medidas de segurança atualizadas para que tenhamos a certeza de que armas, drogas e álcool não possam entrar nas premissas escolares e para que possamos regular e controlar quaisquer excessos que forem cometidos.

Todos nós queremos o melhor para os alunos e profissionais da educação. Queremos garantir o direito de aprender e ensinar sem medo. E é por isso que não toleraremos qualquer tipo de violência nas instituições. Precisamos garantir que todos se sintam seguros, cuidados, amparados. A educação e todos no Governo do Distrito Federal serão incansáveis na batalha contra a violência nas escolas. Basta.