De modo geral, as redes de transporte público urbano do Brasil ainda não atendem todas as necessidades da população. Pesquisas de opinião e outros indicadores dão conta da insatisfação popular com a falta de qualidade do serviço. O vilão, neste caso, por ordem de importância na rotina de deslocamento da população brasileira, é o ônibus urbano.
O ônibus, responsável por 85,7% das viagens realizadas por meio do transporte público, parece estar fadado a permanecer ineficiente. Ao contrário do metrô, uma referência de transporte público bem avaliado pela população, o ônibus segue sem perspectivas de sair do imbróglio da tarifa, praticamente a única fonte de financiamento do sistema.
Afinal, o valor das passagens nunca será suficiente para bancar todos os custos do serviço. Por essa razão, por mais que os reajustes ocorram, eles estarão sempre aquém do exigido para o salto de qualidade esperado.
No caso do transporte por trilho, o custo de implantação e de operação é alto em relação ao ônibus, mas essa equação já vem resolvida na concepção do projeto. A tarifa pública do metrô é definida politicamente e se sustenta pela alta subvenção que é dada, inclusive para eventuais gratuidades.
Já os ônibus não contam com o mesmo tratamento. Pesquisa feita pela NTU em 33 capitais, regiões metropolitanas e municípios que representam, juntos, 53% da frota nacional de coletivos urbanos, revela que apenas nove cidades (27,3% do total) concedem algum tipo de benefício tarifário para o ônibus, que mesmo assim, não cobre a maior parte do custo operacional. O peso recai sobre os usuários pagantes.
Por que as mesmas políticas não são aplicadas para todos os modais? Por que o modelo exitoso adotado para o trilho, que resulta num serviço de maior qualidade, não é também usado nas redes de transporte público por ônibus? São questionamentos sem respostas até o momento.
A comparação serve como balizador dos pesos e medidas adotados para a mesma rede de transporte, que deveriam ser usados para reduzir diferenças e aproximar o padrão de serviço ofertado pelos modais. Por exemplo, o transporte sobre trilho, como o metrô, realiza viagens sem interferência de outro veículo, com trânsito livre, garantido por uma via segregada. Assim, cumpre horários, presta serviço com regularidade e conquista a confiança do passageiro.
É possível trazer os atributos do trilho para o transporte sobre pneus, um modal com maior flexibilidade e menor custo de implantação e operação. O BRT é o modelo de transporte sobre pneus que mais se aproxima dessas características que fazem do metrô quase uma unanimidade na preferência do passageiro, com suas vias segregadas e embarque em nível. Mas, para os BRTs alcançarem os atributos do metrô, será preciso melhorar a qualidade dos projetos e integrar os serviços de operação e manutenção da infraestrutura, com gestão única ; assim como ocorre no modal por trilhos.
No caso do ônibus convencional, que vive preso em engarrafamentos, os corredores e faixas exclusivas seriam a melhor forma de se aproximar desse ideal. Hoje, no entanto, faixas e corredores somam apenas 1.425,5 km em operação em todo o país, quando seriam necessários cerca de 9 mil km para dar ao sistema uma velocidade operacional minimamente adequada.
Seja trilho, seja transporte sobre pneus, há consenso de que os dois modais são fundamentais para garantir a mobilidade diária de milhões de passageiros, reduzindo congestionamentos e minimizando o caos urbano, além de favorecer o meio ambiente, pelas baixas emissões de gás carbônico e materiais particulados por passageiro transportado.
Se a questão transcende o modo de transporte, passa por políticas públicas urgentes para o setor e por ações eficazes de alinhamento no modelo de negócios, na infraestrutura e na gestão do sistema de transporte público no Brasil, vitais para a oferta de serviços de qualidade aos passageiros.
A despeito das diferenças entre um e outro modo de transporte é fato que todo prestador de serviço, em qualquer área, almeja ser reconhecido pela excelência. Não é diferente no setor de transporte público, mas nesse caso específico isso só será viável se as regras e as condições forem iguais para todos os modais. Se o metrô é o melhor exemplo de que é possível ter serviço público de qualidade e bem avaliado, por que o ônibus e outros modais não podem seguir as mesmas premissas?