A Argentina alcançou um acordo com seus credores para reestruturar sua dívida de US$ 66 bilhões, afastando o país das consequências de um default.
É um "alívio significativo" no serviço da dívida, afirmou o ministério da Economia em um comunicado publicado nesta terça-feira (4/8), poucas horas antes do vencimento do prazo estabelecido pelo Executivo para aderir à oferta.
O tempo para fechar os detalhes da nova proposta aceita pelos credores será de 20 dias, até 24 de agosto.
Depois de meses de difíceis negociações em meio à pandemia de coronavírus, a Argentina firmou um acordo com o "Grupo Ad Hoc de Detentores de Títulos Argentinos, o Comitê de Credores da Argentina e o Grupo de Detentores de Títulos da Troca e outros proprietários de títulos" para a reestruturação de quase US$ 66 bilhões de dívida em títulos emitidos sob legislação estrangeira, acrescenta o governo.
Estes grupos representam mais da metade dos detentores dos bônus.
As partes, que até segunda-feira se mostravam firmes em suas posições, cederam em vários pontos. A oferta formal da Argentina apresentada à Comissão de Valores Mobiliários dos Estados Unidos (SEC, na sigla em inglês), contemplava o pagamento de pelo menos US$ 53,5 por cada 100 de dívida. Os credores exigiam em torno de US$ 56,5 por cada 100.
A nova proposta firmada pelas partes coloca a recuperação para os credores acima dos US$ 54 a cada 100, melhorando os prazos de pagamento, explicou uma fonte oficial à AFP.
A melhora foi obtida "antecipando os pagamentos e sem ceder no benefício econômico", explicou à AFP o analista Sebastián Maril.
"O tema econômico está solucionado, falta ver os aspectos legais em detalhes", completou.
Para a consultoria Capital Ecomomics, o acordo ajudará a promover "investimento, negócios e confiança dos consumidores na Argentina no curto prazo".
Persiste, porém, a dúvida "de que seja suficiente para assegurar a sustentabilidade da dívida pública argentina no médio e no longo prazo", advertiu.
Default: um risco para todos
O governo aceitou antecipar as datas de pagamento no caso dos novos títulos para 9 de janeiro e 9 de julho de cada ano, ao invés de 4 de março e 4 de setembro, como estipulava a proposta original. Também alterou o vencimento dos títulos que serão emitidos para cobrir os juros acumulados nestes meses.
A oferta argentina abarca títulos de 2005 e 2010, resultado de uma reestruturação anterior da dívida, assim como outros emitidos a partir de 2016. Nos títulos a partir de 2016, os detentores de pelo menos 66,5% da dívida devem aderir à oferta para que a troca seja válida. Nos de 2005 e 2010, esse percentual sobe para 85%.
Ao longo de mais de quatro meses de negociações, o governo e os credores insistiram em querer evitar as consequências da inadimplência. A Argentina se encontra nesta situação desde 22 de abril, a qual ainda não foi concretizada porque as negociações estão em curso.
Cinco dos títulos sujeitos à troca estão inadimplentes, pois a Argentina não pagou juros de US$ 500 milhões em abril e outros US$ 600 milhões na semana passada.
Essa mora permitia aos fundos de investimento detentores desses bônus recorrer aos tribunais em Nova York para solicitar o pagamento da dívida.
Embora a Argentina tenha perdido o acesso aos mercados internacionais há dois anos, obter um acordo era crucial para o país, que se prepara para negociar um novo programa financeiro com o Fundo Monetário Internacional (FMI). Em 2018 já havia aderido a um de US$ 57 bilhões, pelos quais recebeu US$ 44 bilhões.
O FMI apoiou a busca de um entendimento entre a Argentina e seus credores, mas as tratativas com o Fundo não serão fáceis.
A dívida com o FMI "envolve muito dinheiro nos próximos anos. Chegar a um acordo com o organismo pode não ser tão fácil como parece, porque os técnicos do Fundo vão pedir um plano econômico consistente - algo que, até agora, foi apresentado apenas em linhas muito gerais" por parte do governo, comentou o economista Matías Carugati, da consultoria Management & Fit.
Terceira maior economia da América Latina, a Argentina se encontra em recessão desde 2018. Este ano, sua economia sofrerá ainda mais, devido à pandemia, com uma contração de 9,9% do Produto Interno Bruto (PIB), conforme a previsão mais recente do FMI.
O país encerrou 2019 com uma pobreza estimada em 35%, e uma inflação anual de mais de 50%.
A Argentina também deve resolver a situação da dívida emitida sob legislação nacional, em torno de US$ 41,7 bilhões, com pagamentos adiados até 31 de dezembro de 2021. Neste caso, o governo Fernández ofereceu condições equitativas às acordadas aos detentores de bônus internacionais.
"Resolvendo o tema da dívida pública, o governo tiraria um dos problemas da agenda. Mas ainda restaria resolver a grave situação econômica, com uma depressão do nível de atividade, uma inflação que persiste em níveis elevados (...), desequilíbrios macro importantes - déficit fiscal entre os mais elevados da história, financiado, em boa parte, com emissão de dinheiro - e uma situação social mais do que preocupante", concluiu Carugati.