Embora animado com o êxito dos testes das candidatas a vacinas contra o novo coronavírus, o diretor executivo da Organização Mundial de Saúde (OMS), Michael Ryan, adotou, ontem, um tom de cautela ao fazer um prognótisco de quando será possível imunizar a população mundial. Ele estimou que a vacinação deve ser esperada apenas para o início de 2021. A previsão foi feita no dia em que os Estados Unidos fecharam um acordo para assegurar o fornecimento de 100 milhões de doses de uma vacina desenvolvida pela aliança germano-americana Biontech/Pfizer, mediante o pagamento de US$ 1,95 bilhão (cerca de R$ 9,9 bilhões).
“Estamos acelerando o máximo possível, mas temos de garantir segurança, tomar toda precaução para ter resultado seguro”, disse Ryan sobre as vacinas em estudo. “Mas, sendo realista, será na primeira parte do próximo ano até que comecemos a ver pessoas sendo vacinadas”, acrescentou, ao lado da líder da resposta da OMS à pandemia, Maria Van Kerkhove.
Nesse cenário, Michael Ryan insistiu na necessidade de que se mantenham e reforcem as medidas comprovadas para conter a disseminação do problema. Ontem, o mundo alcançou a marca de 15 milhões de pessoas diagnosticadas com a covid-19.
Ryan mostrou-se otimista com o avanço dos testes, que chegam à etapa final da fase clínica, mas lembrou que não é preciso apenas ter uma vacina segura e eficaz, mas, também, assegurar escala na produção e distribuição. “Precisamos garantir justiça na distribuição (da vacina)”, ressaltou.
Além de pedir realismo sobre prazos, Michael Ryan assinalou que as vacinas, em geral, não são 100% eficientes. “Teremos de ver o quão eficazes as vacinas serão e por quanto tempo durará a proteção”, afirmou. “A ideia de que teremos uma vacina em dois ou três meses e, de repente, esse vírus irá embora, eu adoraria dizer isso para vocês, mas não é realista”, insistiu.
Ele também comemorou resultados positivos em alguns medicamentos contra a doença. De qualquer modo, enfatizou a importância de que as pessoas mantenham as medidas para conter a disseminação do Sars-CoV-2. “Há muito que podemos fazer agora. Precisamos trabalhar o mais duro possível para nos livrarmos do vírus”, conclamou.
Estratégia
O acordo celebrado entre o governo de Donald Trump com Biontech/Pfizer faz parte de uma estratégia agressiva para imunizar os norte-americanos no começo do próximo ano. Desde fevereiro, os EUA investiram bilhões de dólares em vários programas de formulação de vacinas, entre eles, os desenvolvidos pela Johnson & Johnson, pela Moderna e pela AstraZeneca/Oxford. Com a última, o contrato prevê 300 milhões de doses para o país, de 332 milhões de habitantes.
Em 7 de julho passado, a Casa Branca tinha anunciado que pagaria US$ 1,6 bilhão (cerca de R$ 8,1 bilhões) à empresa de biotecnologia Novavax para financiar o projeto de vacina contra a covid-19, garantindo, em caso de sucesso, que os EUA terão prioridade no acesso a 100 milhões de doses.
Por meio de um comunicado, a Biontech/Pfizer indica que o governo dos EUA poderá comprar “até 500 milhões de doses adicionais”. A vacina desenvolvida pela alemã Biontech e pelo laboratório americano Pfizer entrou em fase decisiva de testes clínicos em larga escala, depois de apresentar bons resultados.
Segundo a aliança Biontech/Pfizer, o objetivo é “fabricar 100 milhões de doses até o fim de 2020 e, possivelmente, mais de 1,3 bilhão até o fim de 2021”. Os EUA devem receber as primeiras doses “assim que a Pfizer conseguir fabricar (a vacina) com sucesso e obtiver a aprovação” das autoridades de saúde americanas.
O governo Trump lançou a operação Warp Speed (velocidade superior à da luz) para tentar produzir 300 milhões de doses de vacinas até janeiro de 2021 para que obtenha a vacina primeiro. Diferentemente da Europa e de outros países, os Estados Unidos estão sozinhos em sua busca por uma vacina e não participam das arrecadações de fundos internacionais.
Apesar de Francis Collins, chefe do Instituto Nacional de Saúde (NIH), ter afirmado que apoio à ideia de uma vacina contra a covid-19 ser “bem público global”, Trump definiu como prioridade a imunização dos americanos o quanto antes. “Estamos criando uma carteira de vacinas, para aumentar as chances de os americanos terem pelo menos uma vacina segura e eficaz até o fim do ano”, comentou o secretário de saúde, Alex Azar.
Os norte-americanos também se apressam em adquirir potenciais tratamentos contra a covid. Até setembro, eles receberão 92% da produção do antiviral remdesivir, o único composto que demonstrou relativa eficácia para a síndrome aguda grave provocada pelo Sars-CoV-2.