A depender de pesquisas recentes, Donald Trump terá 131 dias complicados pela frente até a votação de 3 de novembro. Em um país onde o sistema eleitoral envolve disputas decisivas nos chamados Estados-chave — como Arizona, Michigan, Carolina do Norte e Wisconsin — e a vitória final sujeita-se à conquista de, pelo menos, 270 dos 538 delegados do Colégio Eleitoral, o magnata republicano seria derrotado no voto popular e não obteria a quantidade necessária de representantes do partido. Nos últimos dias, mais norte-americanos brancos alfabetizados, tradicionalmente inclinados ao Partido Republicano, ampliaram a rejeição a Trump.
Uma sondagem do jornal The New York Times e do Siena College, publicada ontem, indica que o democrata Joe Biden teria vantagem de 14 pontos percentuais para Trump: 50% a 36% dos votos. Foram consultados 1.337 eleitores registrados, entre 17 e 22 de junho. Outra pesquisa, feita em conjunto pelo The Washington Post e pelo Instituto Ipsos, aponta que somente 36% dos americanos aprovaram a conduta de Trump durante os protestos deflagrados pelo assassinato de George Floyd, um homem negro asfixiado por um policial branco em Minneapolis, em 25 de maio.
Biden não demonstrou entusiasmo com a liderança. De forma incisiva e curta, ao retuitar reportagem do NY Times sobre a sondagem, ele recomendou aos eleitores: “Ignorem as pesquisas! Registrem-se para votar!”. Por sua vez, Trump acusou Biden de ter “fracassado” ao lidar com a China. “Eles (chineses) nos levaram para a lavanderia. Tirei bilhões de dólares da China”, escreveu no Twitter.
A revolta contra o racismo que se espalhou pelos Estados Unidos e a ameaça de Trump de lançar mão do Exército para conter os manifestantes, aliadas à resposta errática durante a pandemia do novo coronavírus, podem ter selado o fracasso republicano nas urnas. “A espetacular incompetência de Trump em lidar com a covid-19 alienou um grande número de eleitores”, admitiu ao Correio Bruce Ackerman, professor de direito da renomada Universidade de Yale (em New Haven, Connecticut). “Pior ainda, ele não tem nenhum plano sério para lidar com o dramático declínio econômico que acompanhará as eleições de novembro. Estamos alinhados a um mundo político muito diferente ao que prevaleceu em 2016”, acrescentou, em alusão às últimas eleições em que Trump derrotou a ex-secretária de Estado Hillary Clinton no Colégio Eleitoral, apesar de ter perdido no voto popular.
A possibilidade de Trump não conseguir a reeleição incomoda as fileiras do Partido Republicano. O senador John Thune advertiu o presidente de que o apoio entre os eleitores independentes é apenas “suave” e instou uma mudança de estratégia política da Casa Branca. Na pesquisa do NY Times/Siena College, Biden lidera a preferência dos independentes, com 47% dos votos contra 29% para o presidente. Em 2016, Trump obteve 6 pontos percentuais a mais de votos dos independentes, em comparação a Hillary.
“Acho que, neste momento, é óbvio que Trump tem um problema com o eleitorado médio, com os independentes. São essas pessoas que decidirão a eleição nacional”, afirmou Thune. “Acho que pode reconquistá-los, mas, provavelmente, isso exigirá não apenas uma mensagem que tenha substância e política, mas que transmita um tom talvez diferente”, comentou. Ontem, Trump recebeu, na Casa Branca, o presidente da Polônia, Andrzej Duda. Foi a primeira visita de um chefe de Estado a Washington desde o começo da pandemia, em março.
Reforma policial
O presidente republicano sofreu uma derrota no Legislativo. Os democratas bloquearam um plano de reforma policial apresentado no Senado. A justificativa foi de que a proposta é substancial, ante a comoção causada pela morte de Floyd. “O texto republicano nem sequer tenta fazer uma reforma significativa para responsabilizar os policias por sua má conduta”, criticou Chuck Schumer, líder da minoria democrata. A reforma proposta por Trump inclui a proibição de estrangulamento na abordagem a suspeitos e cria banco de dados nacional sobre policiais problemáticos.
“Explosão” de casos de covid-19 no sul do país
Era tudo o que Trump não esperava. Recorde de aumento de casos, hospitalizações em alta e pacientes cada vez mais jovens: o sul dos Estados Unidos, da Flórida (foto) à Califórnia, transformou-se no “epicentro” do novo coronavírus no país. Na contramão do desejo da Casa Branca de reabrir a economia, as autoridades locais ameaçam impor novas restrições. Em sinal de retrocesso nos EUA, os dois primeiros focos da pandemia (Nova York e Nova Jersey), além do estado vizinho de Connecticut, decretaram, ontem, quarentena obrigatória para quem chega de regiões com aumento no número de infecções. O Texas, que começou o desconfinamento no início de maio, registrou, ontem, 5.489 novos casos, de um total de mais de 120 mil. Esse recorde levou seu governador, Greg Abbott, a pedir que seus moradores não saiam de casa. Com mais de 330 milhões de habitantes, os Estados Unidos registram o pior saldo do mundo em números absolutos. São 2.369.806 casos de covid-19 e 121.846 mortes.
50%
Total de eleitores que votariam em Joe Biden, contra 36% para Trump, segundo pesquisa feita pelo The New York Times e pelo Siena College