Milhares de manifestantes acenderam velas e gritaram frases a favor da democracia nesta quinta-feira (4/6) em Hong Kong, desafiando a proibição de uma vigília em memória das vítimas da repressão da Praça Tiananmen (Paz Celestial), em um momento de grande tensão sobre a influência de Pequim na ex-colônia britânica.
Pela primeira vez em três décadas, este ano, a polícia não autorizou a vigília tradicional, alegando os riscos oferecidos pela covid-19.
Vários manifestantes retiraram as barreiras que haviam sido instaladas ao redor do parque Victoria e uma multidão conseguiu entrar no local com velas nas mãos.
"Há 30 anos que venho para a vigília em memória das vítimas da repressão de 4 de junho, mas este ano tem uma importância ainda maior", declarou à AFP um homem que se identificou apenas como Yip, de 74 anos.
"Porque Hong Kong vive o mesmo tipo de repressão executado pelo mesmo regime, como o que aconteceu em Pequim", completou. "Não temos armas. Tudo que podemos fazer é falar".
Pouco depois, a polícia anunciou a detenção de vários manifestantes no distrito comercial de Mongkok, mas permitiu que o protesto continuasse no parque Victoria.
A vigília é organizada todos os anos na ex-colônia britânica e atrai muitas pessoas para recordar a violenta repressão do Exército chinês na madrugada de 4 de junho de 1989, nas imediações da famosa praça de Pequim.
A repressão deixou entre centenas e mais de mil mortos, de acordo com diferentes fontes, e acabou com sete semanas de manifestações de estudantes e trabalhadores que criticavam a corrupção e pediam democracia.
Na China, o tema é um tabu. Hong Kong é o único lugar no país que recorda o fato a cada ano, o que reflete as liberdades únicas que existem no território semiautônomo.
Lei sobre o hino
A vigília foi organizada em um momento de grande tensão entre Pequim e a ex-colônia britânica.
O Parlamento de Hong Kong aprovou nesta quinta-feira uma polêmica lei que prevê punições penais a qualquer ofensa ao hino chinês, uma norma que a oposição pró-democracia denuncia como mais uma tentativa de Pequim de acabar com a autonomia parcial da ex-colônia britânica.
A oposição boicotou a sessão, por considerar que a votação já estava decidida a favor da maioria.
As autoridades chinesas estão indignadas há muito tempo com as vaias e os gritos durante a execução do hino nacional, sobretudo nos estádios de futebol antes das partidas da seleção de Hong Kong, enquanto o movimento independentista do território semiautônomo ganha força.
A nova lei, que deve ser ratificada pela chefe do Executivo de Hong Kong, Carrie Lam, prevê até três anos de prisão para quem desrespeitar o hino.
Velas em recordação das vítimas
Para contra-atacar a proibição da vigília, milhares de pessoas acenderam velas em vários bairros da ex-colônia britânica durante a noite, como haviam solicitado os organizadores do evento.
No ano passado, a vigília para marcar os 30 anos da repressão aconteceu em um ambiente político tenso: o governo pró-Pequim de Hong Kong tentava impor a autorização de extradições para a China continental.
Uma semana depois começaram os sete meses de protestos quase diários na metrópole financeira.
Em resposta ao movimento, Pequim anunciou no fim de maio a intenção de impor uma lei de segurança nacional, que prevê sanções às atividades separatistas, "terroristas", subversão e interferência estrangeira no território.
Este ano, várias vigílias estavam previstas em Taiwan e em vários países ocidentais, organizadas pela diáspora chinesa.
O governo dos Estados Unidos recordou as vítimas.
O secretário de Estado americano, Mike Pompeo, reuniu-se na quarta-feira, em Washington, com quatro figuras do movimento, incluindo um dos principais líderes estudantis da época, Wang Dan.