Milhares de soldados patrulhavam, ontem, as principais cidades americanas, após seis noites consecutivas de protestos contra o racismo e a brutalidade policial. Alguns atos resultaram em distúrbios e violência, que o presidente americano, Donald Trump, atribui a radicais da esquerda.
A indignação no país após a morte, em Minneapolis, do afro-americano George Floyd, 46 anos, por um policial branco, na última segunda-feira, provocou distúrbios acompanhados de saques e incêndios na cidade. “Não podemos e não devemos permitir que um pequeno grupo de criminosos e vândalos destrua nossas cidades e provoque devastação em nossas comunidades”, afirmou Trump. “Meu governo vai interromper a violência da multidão”, advertiu ele, que acusou o grupo Antifa (antifascista) de orquestrar a escalada.
Trump escreveu, no Twitter, ontem, que os Estados Unidos classificarão o Antifa como um grupo terrorista, mas não deu detalhes. O presidente e alguns de seus principais assessores culparam o movimento e grupos que chamam de “extrema esquerda” por se apropriarem de protestos pacíficos antirracistas.
O Antifa — o nome é uma contração para antifascista — é um agrupamento secreto de ativistas radicais que surgiu nos últimos anos, em parte em oposição às manifestações racistas em Charlottesville, Virgínia, em 2017. Não se sabe se o movimento conta com lideranças. Seus membros, geralmente vestidos de preto, protestam contra o racismo, os valores de extrema direita e o que consideram fascismo. Eles dizem que táticas violentas, às vezes, são justificadas para autodefesa.
Na noite de sábado para domingo, manifestações, algumas violentas, ganharam as ruas de Nova York, Filadélfia, Dallas, Las Vegas, Seattle, Des Moines, Memphis, Los Angeles, Atlanta, Miami, Portland, Chicago e Washington D.C., além de Minneapolis, na maior onda de protestos nos Estados Unidos nos últimos anos. Dezenas de milhares de pessoas exigiram acusações mais duras contra os policiais envolvidos na morte de Floyd.
A tragédia do afro-americano tornou-se o mais recente símbolo da violência policial contra negros. Cidadãos em todo o país gritaram frases como “black lives matter” (vidas negras importam) e “não consigo respirar”, as palavras de Floyd antes de morrer.
Os governadores dos estados envolvidos convocaram a Guarda Nacional. Cerca de 5 mil soldados da corporação foram mobilizados em 15 unidades da federação e na capital, e outros 2 mil estavam prontos para intervir, se necessário. Segundo Tim Walz, governador de Minnesota, os responsáveis pelo caos podem ser anarquistas, supremacistas brancos ou narcotraficantes.
Toque de recolher
A cidade de São Francisco, no Estado americano da Califórnia, decidiu instaurar um toque de recolher por tempo indeterminado para dirimir os protestos violentos. “As pessoas estão se ferindo neste momento, estão com raiva. Eu mesma estou com raiva. A cidade e a polícia vão dar apoio a protestos pacíficos. Nós não toleraremos violência e vandalismo. Agora é hora de ir para a casa”, escreveu, no Twitter, a prefeita de São Francisco, London Breed, que é negra.
São Francisco é uma das mais de 20 cidades que já decretaram toques de recolher na tentativa de evitar mais confronto entre manifestantes e policiais, bem como cenas de vandalismo. Gestores de localidades de 16 estados americanos, além do distrito de Columbia, já pediram ajuda da Guarda Nacional para conter os manifestantes.
- Intimidação
O FBI define como terroristas domésticos aqueles que promovem “o uso ilegal ou ameaçado de violência contra pessoas ou propriedades a fim de intimidar ou coagir um governo, a população civil
ou qualquer segmento dele, em defesa da política ou objetivos sociais”. - Corpo encontrado
Em Minneapolis, o corpo de um homem foi encontrado, na madrugada de ontem, perto de um veículo incendiado, informou a polícia da cidade. O cadáver, ainda não identificado, apresenta sinais evidentes de traumatismo, segundo John Elder, porta-voz da polícia, antes de indicar que a unidade de homicídios da cidade investiga o caso. Ainda não foi determinado se o óbito está vinculado aos protestos na cidade. - Medidas de segurança na Casa Branca
Washington decretou um toque de recolher, ontem, após novos protestos perto da Casa Branca. O anúncio foi feito pela prefeita da capital dos Estados Unidos, Muriel Bowser, horas depois de uma noite de tumultos em várias cidades do país. No sábado, o presidente Donald Trump disse aos manifestantes que chegavam muito perto da Casa Branca que ia recebê-los com “os cães mais ferozes e as armas mais perigosas”. De acordo com The New York Times, o mandatário foi levado pelo Serviço Secreto para um bunker na própria sede do governo, mas o jornal não menciona quanto tempo ele permaneceu no local. Ontem, a presidente democrata da Câmara dos Representantes, Nancy Pelosi, criticou o republicano pela declaração. “Ele deve unir o nosso país, não aumentar o fogo”, disse em entrevista à rede de TV ABC. O rival democrata de Trump na eleição presidencial de novembro, Joe Biden, condenou a violência, mas afirmou que os americanos têm o direito de se manifestar. “Protestar contra tal brutalidade é correto e necessário. É uma resposta totalmente americana”, frisou. “Mas queimar comunidades e destruição desnecessária, não. Violência que coloca vidas em risco não é. Violência que destrói e fecha negócios que atendem à comunidade não é.” - Entenda o caso
“Não consigo respirar”
George Floyd, um homem negro de 46 anos, foi morto durante uma abordagem policial em Minneapolis, na segunda-feira. O policial Derek Chauvin foi acusado formalmente, na sexta-feira, por assassinato em terceiro grau e morte imprudente. O agente aparece em um vídeo ajoelhando sobre o pescoço de Floyd durante oito minutos, enquanto a vítima grita: “Não consigo respirar”, até perder a consciência.
Floyd era considerado suspeito pela polícia de utilizar uma nota falsa de US$ 20 em um supermercado da região. Segundo a legislação do estado de Minnesota, o assassinato de terceiro grau é aquele em que a morte é causada de maneira não intencional, por um ato eminentemente perigoso. A pena para o crime é de até 25 anos de prisão.
No sábado, a esposa de Derek Chauvin, Kellie Chauvin, anunciou que vai se separar do policial. Em nota divulgada à imprensa, ela disse estar “devastada” com o caso.