Juan José Rendón — o homem responsável pela estratégia política do presidente autodeclarado da Venezuela, Juan Guaidó — causou surpresa ao revelar o próprio envolvimento na chamada Operação Gideão, uma tentativa frustrada de invasão marítima ao país para depor Nicolás Maduro. “Era uma exploração para ver a possibilidade de capturar e entregar à Justiça membros do regime (de Maduro), com acusações, ordens de captura, etc”, admitiu Rendón, em entrevista à rede de tevê CNN em espanhol. Ele confessou que assinou o contrato com a empresa de segurança Silvercorp, sediada na Flórida, a quem pagou um adiantamento de US$ 50 mil.
No entanto, J. J. Rendón, como é conhecido, disse que o acordo era “preliminar” e não chegou a ser cumprido. Jordan Goudreau, diretor da Silvercorp, não teria recebido “sinal verde” para a operação. O Correio tentou entrar em contato com Rendón por e-mail e por mensagens no Messenger e no Instagram. No entanto, até o fechamento desta edição, não houve resposta.
Na noite de ontem, Maduro tornou a acusar Trump pela conspiração, ao ser entrevistado pela emissora Telesur. “Ele é informado pela CIA (Agência Central de Inteligência), pelo Pentágono e pela NSA (Agência de Segurança Nacional), ao menos duas vezes por dia. O tema ‘Venezuela’ é uma obsessão para Trump”, disse, ao qualificar de “estranhamente tardias” as respostas dos Estados Unidos sobre a Operação Giderão. “É impossível que não soubessem (dos planos de invasão)”, reforçou. “Chegaram à loucura de imaginar que entrariam em nosso país e nada ocorreria. Nossa nação tem um escudo bolivariano, o qual está em alerta 24 horas por dia. Nosso povo está pronto para o combate. (...) Queriam banhar de sangue o nosso país”, acrescentou.
Maduro responsabilizou o presidente colombiano, Iván Duque, por supervisionar as operações da Silvercorp na Colômbia. E atacou o líder da oposição na Venezuela. “Guaidó preparou meu assassinato político”, disparou. O ministro da Comunicação da Venezuela, Jorge Rodríguez, anunciou a captura de 23 “terroristas” e sublinhou que Rendón reconheceu ter firmado o contrato.
O secretário de Estado norte-americano, Mike Pompeo, exortou Maduro a abandonar o poder a fim de “restaurar a democracia” na Venezuela. O chefe da diplomacia de Washington negou qualquer participação dos EUA na suposta operação, mas defendeu o fim do regime socialista. “Essa operação dos últimos dias não foi um esforço americano, mas acreditamos que Maduro deve sair”, disse a uma rádio. Dois cidadãos norte-americanos que participaram da tentativa de invasão — os veteranos de guerra Luke Alexander Denman e Airan Berry — foram capturados e deverão ser julgados em Caracas.
Comunicado
No fim da tarde de ontem, o Correio entrou em contato com o porta-voz de Guaidó, que se recusou a falar. “Não haverá entrevistas”, afirmou. Ele confirmou à reportagem que J. J. Rendón “tinha acesso à sala de estratégias do presidente interino (Guaidó)”. “Isso está claro”, afirmou. Mais cedo, as chamadas Forças Democráticas, integradas pelos nove maiores partidos de oposição, emitiram um comunicado em que asseguram não promover nem financiar “guerrilhas, focos de violência ou grupos paramilitares”. Também convocaram a sociedade, os civis e os militares, a lutarem pela mudança democrática. “A Venezuela não quer mais violência. A violência somente é promovida por aqueles que usurpam o poder desconhecendo que a soberania reside no povo. As forças democráticas apostam por uma saída de paz, que brinde tranquilidade e estabilidade a todos os venezuelanos e às suas famílias.”
Por telefone, Juan Palencia, deputado da Assembleia Nacional pelo partido Acción Democrática (parte das Forças Democráticas), reforçou ao Correio que a oposição “não fez nenhum tipo de incursão armada à Venezuela”. “Mesmo que ela seja justificada, pois o regime narcotraficante e terrorista de Nicolás Maduro empobrece o país a cada dia e viola os direitos humanos. Nós enaltecemos a atitude assumida por um grupo de oficiais das Forças Armadas venezuelanas que assumiram as armas para tratar de estabelecer a ordem constitucional. Enaltecemos a valentia, a coragem e o patriotismo que tiveram e pedimos que respeitem os seus direitos humanos e não sejam torturados”, declarou.
Palencia rechaçou a confissão de Rendón. “Nós, da Mesa de Unidade Democrática, não compactuamos com esse tipo de atitude, ainda que justificada. Temos que dar passos firmes, ao lado do povo, por uma estratégia inclusiva e de unidade, para se materializar o sonho da reunificação nacional e o renascimento da Venezuela livre”, acrescentou.
A Operação Gideão
Saiba detalhes da suposta conspiração contra o regime do presidente Nicolás Maduro