Medidas de forte distanciamento social tomadas por 11 países europeus para impedir a disseminação do novo coronavírus já evitaram até 120 mil mortes. A conclusão é de um estudo divulgado ontem pelo Imperial College London, no Reino Unido. Entre as ações anunciadas pelos governos, estão o isolamento de infectados e dos suspeitos de terem contraído o coronavírus, o fechamento de escolas e de universidades, a proibição de aglomerações e a imposição do chamado “lockdown” (fechamento total de uma área ou país). A pesquisa foi divulgada no mesmo dia em que autoridades da Espanha e do Reino Unido confirmaram uma desaceleração no crescimento de infecções. Além das duas nações, o estudo contempla Alemanha, Áustria, Bélgica, Dinamarca, França, Itália, Noruega, Suécia e Suíça.
Em entrevista ao Correio, Axel Gandy, diretor de estatística do Departamento de Matemática do Imperial College London, afirmou que ele e seus colegas analisaram o impacto das intervenções estatais usando mortes observadas atribuídas à Covid-19. “Nosso modelo sugere que os países conseguiram reduzir o número de novas infecções por infectado. Nossos resultados também sugerem que as intervenções já salvaram e continuarão a salvar muitas vidas”, explicou. “O impacto da pandemia é extremo. No entanto, teria sido muito pior sem as intervenções. Mantê-las é crucial para controlar a pandemia. Acreditamos que essas intervenções evitaram até 120 mil mortes.”
Em todo o planeta, mais de 757 mil casos de Covid-19 foram detectados, com pelo menos 36 mil mortes. A Organização Mundial de Saúde (OMS) prevê que 1 milhão de pessoas terão sido infectadas até o fim desta semana. A ministra das Relações Exeriores da Espanha, Arancha González, admitiu que a curva ascendente de transmissão do coronavírus parece estar se “achatando” — até o fechamento desta edição, o país contabilizava 7.368 mortos e 85.195 casos, ultrapassando a China. Ontem, os espanhóis proibiram cerimônias fúnebres e limitaram a três os assistentes permitidos nos enterros, respeitando-se a distância de dois metros.
Apesar dos resultados positivos obtidos com o isolamento social, a OMS alertou a Espanha que o confinamento não será o bastante para o controle real da epidemia em seu território e aconselhou as autoridades a duplicarem os esforços dos sistemas de saúde. Brasileiras que vivem e trabalham na Espanha reconhecem os esforços do governo do premiê socialista Pedro Sánchez como cruciais para reduzir o avanço da doença.
Relatos
Natural de Rubiataba (GO), Helaine Coutinho da Silva, 44 anos, trocou Brasília por Madri em 2018, onde trabalha como doméstica. De acordo com ela, as medidas restritivas impostas pelo governo do primeiro-ministro espanhol, o socialista Pedro Sánchez, foram cruciais para reduzir o ritmo de infecções. “Nós permaneceremos de quarentena até 11 de abril, mas o governo pode ampliar o isolamento em mais 15 dias”, disse ao Correio. “Podemos sair apenas para comprar alimentos e remédios.” Helaine contou que ela e o filho estão sem sair de casa desde o início do isolamento. “Lavo sempre as mãos. Quando vou ao mercado, uso máscara e luvas. Ao chegar, tiro as roupas, tomo banho e limpo tudo com água sanitária.”
Em Barcelona, a advogada catarinense Maria Ivonete de Souza, 53, disse que a quarentena costuma ser “muito rigorosa” até a realização de testes para separar os infectados da população. Desde 16 de março, ela não sai à rua. “Naquele dia, passei no mercado e comprei o suficiente para um mês. Participo de um grupo de WhatsApp de colegas advogados. Uma amiga está internada, assim como o marido, a irmã e o cunhado, acometidos de Covid-19. Ela me enviou mensagem dizendo que não consegue notícias dos familiares, pois todos estão isolados”, afirmou à reportagem. Maria Ivonete relatou que soube de dois brasileiros mortos na Espanha supostamente pelo novo coronavírus.
Com mais de 10 mil mortos, a Itália contabiliza mais de 10 mil mortes. Moradora de Bottanuco, cidade situada a 20km de Bergamo, na região de Lombardia, a dona de casa baiana Janda Santos, 49, lamenta: “Aqui, já morreu muita gente”. Ela toma cuidados especiais para não se infectar. “Não podemos sair de casa, a não ser para ir ao supermercado uma vez por semana ou em caso de emergência. Quando saímos, vamos com luvas e máscaras. O governo tem feito o possível para conter a pandemia”, explicou.
» Vozes brasileiras
Helaine Coutinho da Silva, 44 anos, doméstica.
Natural de Rubiataba (GO), mora em Madri
“Aqui, você é obrigado a ficar em casa. Se sair, pode ser preso ou pagar multa. Se o Brasil não se conscientizar, as coisas vão ficar muito complicadas, viu?”
Maria Ivonete
de Souza, 53 anos, advogada. Natural de Blumenau (SC), mora em Barcelona
“No começo, tudo foi muito flexível, infelizmente. Era possível sair às ruas e não perguntavam nada. Não é que o isolamento não funcione. É que pessoas insistem em não cumpri-lo. Eu fico só dentro de casa. Não saio nem para olhar se tem correspondência. Limpei toda a casa com álcool e desinfetante.”
Emillie Lopes Correia
33 anos, administradora de empresas. Natural de Brasília, mora em Sesto San Giovani, na Lombardia (Itália)
“Por aqui é muito frio e não há o costume de banhos diários. Alguns se opõem à vacinação. Acho que isso tudo colabora para a propagação do vírus.”
Ivone Rocha Farias
43 anos, empresária. Natural de Teresina, mora em Zaragoza (Espanha)
“O isolamento é importantíssimo. É proibido sair de casa, sob pena de multa de 600 a 1.200 euros. Estamos em casa desde o dia 12. Fazemos a higiene frequente das mãos e lavamos roupas com água quente, além de usarmos álcool e água sanitária na limpeza de casa.”