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Testes para todos

Organização Mundial da Saúde (OMS) defende diagnóstico em massa para conter o avanço da doença, que já afeta 350 mil pessoas em todo o mundo. Diretor da entidade criticou a utilização de medicamentos cuja eficácia não tenha sido comprovada por pesquisas



Com o número de novos casos aumentando em ritmo acelerado, a Organização Mundial da Saúde (OMS) defendeu o desenvolvimento de testes rápidos e a testagem em massa da população. Em uma coletiva de imprensa virtual, Tedros Adhanom Ghebreyesus, diretor-geral da OMS, afirmou que diagnosticar o maior número de pessoas possível é, ao lado da quarentena, a medida que poderá “alterar a trajetória” do coronavírus.

Ghebreyesus destacou que, em 67 dias, 100 mil foram infectados, mesmo número registrado 11 dias depois. Passados quatro dias da penúltima contagem, já eram 300 mil casos. Um balanço da agência France Presse indicou que, desde o surgimento do vírus, em dezembro, 341 mil pessoas foram contagiadas, com 15,1 mil mortes em 174 países. Porém, a quantidade de infecções pode ser muito maior, já que, em muitos lugares, incluindo o Brasil, nem todo paciente com sintomas é testado.

“Pedir às pessoas que fiquem em casa e estabelecer outras medidas físicas de distanciamento é uma maneira importante de retardar o avanço do vírus e de economizar tempo, mas são medidas defensivas, que não nos ajudarão a vencer”, afirmou. O diretor-geral da OMS reconheceu, contudo, que muitos países não têm recursos para oferecer testes em massa.

Crítica

Na coletiva, Ghebreyesus condenou o uso de medicamentos que ainda não passaram pelas fases necessárias de ensaio clínico. Na semana passada, o anúncio, por parte do presidente norte-americano, Donald Trump, de que um remédio antimalária seria aprovado para uso contra a Covid-19 levou milhares de pessoas no mundo todo a esgotá-lo das farmácias. Mesmo com a Food and Drugs Administration (FDA) desmentindo Trump em seguida — o órgão esclareceu que essa droga tem prioridade nas avaliações, mas ainda não foi liberada com esse fim —, a cloroquina sumiu das farmácias, com pessoas se automedicando e arriscando as próprias vidas. “Pequenos estudos, feitos a partir de observações, não nos darão as respostas que precisamos”, alertou. 

O estudo sobre a eficácia da cloroquina com maior número de pacientes incluiu somente 100 pessoas, internadas em hospitais chineses, que receberam a droga em combinação a outros retrovirais. Embora a substância seja considerada promissora, ainda é preciso investigar a ação e a segurança no organismo em um número muito maior de participantes. “O uso de medicamentos que não foram testados e cuja eficácia é desconhecida pode gerar falsas esperanças e causar mais mal do que bem, além de levar à escassez de medicamentos essenciais para o tratamento de outras doenças”, destacou o diretor-geral da OMS.

O editor-chefe de uma das revistas científicas mais importantes do mundo, a Science, condenou ontem, em um editorial, a oferta de falsas esperanças à população. “Estão pedindo à ciência uma solução rápida para um problema que nem foi descrito completamente”, afirmou H. Holden Thorp, referindo-se ao fato de que o vírus ainda não é totalmente conhecido. “Estou preocupado que a ciência acabe prometendo em excesso soluções em resposta à Covid-19”, disse. Segundo o editor, não que se faça isso de propósito. Os cientistas precisam divulgar os resultados do que vêm estudando. O problema, de acordo com Thorp, é que esses dados ainda básicos, que precisam ser replicados em diversas outras pesquisas, vêm sendo usados politicamente para “criar falsas expectativas”.