Transferidos para Helsinque, os Jogos de 1940 acabaram não sendo disputados, vítimas da Segunda Guerra Mundial, e entraram na história com o apelido de 'The Missing Games' (Os Jogos Ausentes). Seria um mau presságio este precedente histórico? A situação atual apresenta alguns pontos em comum com o ocorrido no século passado.
Para promover a candidatura, os japoneses venderam a resiliência de seu povo, que havia sido vítima de um terremoto devastador em 1923, explica David Goldblatt, autor do livro 'Os Jogos: Uma História Global das Olimpíadas'. Nesse sentido, é possível fazer um paralelo com os Jogos de 2020, agendados para nove anos após a catástrofe nuclear de Fukushima.
Diplomacia cultural
Outra semelhança: como nos dias de hoje, as alegações de Tóquio para se tornar a primeira cidade asiática a sediar os Jogos ia muito além do plano esportivo.
A candidatura "era parte integrante de uma diplomacia cultural internacional destinada a melhorar as relações com as democracias ocidentais, em particular com o Reino Unido e os Estados Unidos", afirma Asato Ikeda em matéria publicada no Asia-Pacific Journal sobre os Jogos de 1940.
Internamente, o ano de 1940 marcava os 2.600 anos da tomada do poder do imperador Jinmu, o lendário fundador da dinastia imperial. A defesa do projeto japonês diante do Comitê Olímpico Internacional (COI) certifica a importância que deram os japoneses a esta empreitada lançada em 1932.
"Os Jogos Olímpicos devem vir naturalmente ao Japão. Se este não for o caso, o motivo será forçosamente injusto", dizia naquela época Jigoro Kano, primeiro membro japonês do COI e artífice da candidatura de Tóquio.
E, na disputa contra Roma e Helsinque para ser a sede olímpica, valia tudo. O ditador italiano Benito Mussolini, por exemplo, concordou em apoiar a candidatura de Tóquio para os Jogos de 1940 em troca do respaldo japonês para que Roma fosse escolhida quatro anos depois. A estratégia da retirada da candidatura romana funcionou e Tóquio acabou escolhida com 37 votos, contra 26 para Helsinque.
Tensões
Com a oficialização da vitória da candidatura japonesa, os preparativos começam: cartazes são impressos, um programa é elaborado e a data para a abertura dos Jogos é fixada: 21 de setembro de 1940.
Mas a geopolítica veio novamente atrapalhar os planos. Desde a invasão da Manchúria chinesa pelo exército imperial, em 1931, a pressão internacional sobre o Japão é forte. A Liga das Nações rejeita a anexação da província ao território japonês, o que levou o Japão a se retirar em 1933 da entidade internacional, que deu origem à Organização das Nações Unidas (ONU).
Neste contexto de tensões, a população japonesa pede para que o dinheiro reservado para a organização dos Jogos seja usado para fins militares.
Diante das ameaças de eventuais boicotes britânico e americano dos Jogos de Tóquio, os diplomatas tentam primeiramente acalmar os ânimos. "Os cidadãos de Tóquio fazem todo o possível para fazer dos Jogos de 1940 um sucesso", escreve na época a prefeitura da capital em mensagem enviada ao COI.
Finalmente, o Comitê Olímpico Japonês cede às pressões e abdica de sediar os Jogos em julho de 1938, citando "insolucionáveis problemas com a China". "Nas atuais circunstâncias, não havia outro caminho", dizia um boletim de informação de Tóquio dedicado aos Jogos Olímpicos.
"O cancelamento não foi tão surpreendente, num contexto de relações internacionais degradadas e de atividade militar crescente no continente asiático", julga retrospectivamente Asato Ikeda.
A história só foi concluída 24 anos depois: em 1964, Tóquio finalmente conseguiu se tornar a primeira cidade asiática a sediar os Jogos Olímpicos. Agora, será que terá que esperar até 2044?