Portugal é um dos países mais procurados por brasileiros para morar. Em 2019, o número de imigrantes brasileiros ultrapassou os 150 mil, o que representa novo recorde e crescimento de 43% em relação a 2018, segundo divulgou no mês passado o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) português. Com mais de 48 mil títulos de residência emitidos no ano passado, a comunidade brasileira é a maior de estrangeiros no país lusitano. Mas o que torna a antiga metrópole do Brasil tão atraente para os imigrantes?
Para os advogados Marcelo Salomão e Fernando Senise, do escritório de advocacia Brasil Salomão e Matthes, Portugal é um país seguro, com excelente qualidade de vida, clima ameno e custo de vida baixo se comparado com outras nações europeias. “Além dessas características, o idioma e familiaridade com a cultura e hábitos facilitam a emigração dos brasileiros”, afirmam.
Na avaliação do escritório, que presta serviços de assessoria de imigração, não há um perfil específico para quem quer se mudar para Portugal. Os advogados percebem, porém, que investidores em empresas e no setor imobiliário procuram cada vez mais ir para Portugal, já que o país é porta de entrada para o Mercado Comum Europeu e tem uma atividade turística crescente. Mesmo assim, Salomão e Senise apontam que isso não torna a nação europeia menos atraente para estudantes e aposentados.
Então, qual deve ser o primeiro passo para quem pensa em se mudar para Portugal? Já que não é um território muito grande, a recomendação dos advogados é visitar o país para conhecer as diferentes regiões e avaliar as possibilidades. “É vital conhecer as regiões e locais em que pretende residir, pois, apesar da facilidade na comunicação e amabilidade do povo, ainda é um país estrangeiro e tem regras e costumes diferentes do Brasil”, afirmam.
Qual cidade e região escolher depende do perfil e dos interesses de cada um. Os advogados afirmam que além de Lisboa e Porto, as maiores cidades, há vilas “encantadoras no interior”, nas regiões de Alentejo e Algarve. Já nos arredores das metrópoles também é possível encontrar a tranquilidade do interior, bem como ter a proximidade dos serviços dos grandes centros urbanos.
Vistos
Escolhido o local de interesse, é necessário iniciar o processo de obtenção de visto. Não há necessidade de visto para quem fica até 90 dias em Portugal para fazer turismo e negócios. A partir desse período, é necessário portar o documento. Por isso, o escritório de advocacia orienta que é importante tomar a decisão final de imigrar apenas depois da concessão dos vistos. “Paralelamente a isso, deve-se ter uma assessoria adequada para a obtenção do visto que melhor se adapte à situação atual e futura do requerente”, dizem.
Portugal emite uma série de vistos específicos para diferentes interesses. Os mais solicitados são os chamados de D1 e D2. O visto D1 se destina a trabalhadores que tenham contrato com uma empresa, válido por período superior a um ano ou para trabalho sazonal, por três meses. Já os vistos D2 se estendem tanto para prestadores de serviços como empreendedores. Segundo os advogados, destina-se “a estrangeiros que tenham efetuado operações de investimento, ou comprovem ter meios financeiros disponíveis em Portugal”.
Já para os brasileiros que não se encaixam nas categorias do D1 e D2, como aposentados e quem vive de rendimentos, uma boa opção é o visto D7. O documento é válido para quem pretende ficar no país por período superior a um ano. Desde abril de 2019, a empresa VSF Global faz o agendamento do processo de vistos para Portugal, e não mais os consulados. As listas completas de documentos necessários para as aplicações de cada visto podem ser verificadas no site da empresa.
Para a maioria dos vistos a renovação é anual. Já os prazos e custos variam. O custo do visto D1, por exemplo, é de cerca de R$ 500, com as taxas inclusas. A cobrança é feita no dia da entrevista com os interessados, sendo que somente o cartão de débito é aceito.Também é possível pagar por meio de depósito bancário no site da VSF Global.
Porém, esses vistos são apenas uma permissão temporária emitida pelos consulados de Portugal a um cidadão estrangeiro para ficar temporariamente no país. Nesse meio tempo, se o imigrante quiser morar definitivamente em Portugal, é preciso solicitar uma autorização de residência.
A autorização é concedida pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, e inicialmente é válida por um ano. A lista completa de documentos necessários pode ser verificada no site do SEF. Passado um ano, é possível pedir a renovação por dois anos, e depois, por mais dois. Se o imigrante morar legalmente em Portugal por cinco anos, ele pode pedir a autorização de residência permanente, a cidadania portuguesa.
Há ainda o chamado visto gold, que é uma autorização de residência especial concedida a investidores estrangeiros de modalidades específicas. As principais são: a compra de imóvel no valor igual ou superior a 500 mil euros (R$ 2,3 milhões), o investimento de 350 mil euros em fundos de risco e o depósito de 1 milhão de euros em uma instituição financeira portuguesa.
No mês passado, porém, o Parlamento português autorizou ao governo a promover mudanças nas regras do visto gold, que, após sanção presidencial, passa a ser válido para aquisições de imóveis nas cidades do interior ou em regiões autônomas dos Açores e da Madeira. Lisboa e Porto, os dois principais destinos dos brasileiros, estão fora do programa. Quem já tem o benefício poderá renová-lo.
Moradia
Com o visto resolvido, é preciso pensar na moradia. Porém, deve-se avaliar entre a compra de um imóvel e o aluguel, qual é a opção mais vantajosa. “Se o imigrante já conhece bem a região em que pretende morar, já criou familiaridade e dispõe de capital para pagamento de parte do imóvel, comprar pode realmente ser uma opção, especialmente em função das taxas praticadas para acesso ao crédito”, afirmam Salomão e Senise.
Já o aluguel tem algumas dificuldades. De acordo com os advogados, os proprietários dos imóveis em Portugal costumam cobrar três aluguéis como garantia, além de exigir um fiador. “Ainda, a depender das condições em que se consiga crédito, os valores de aluguéis, por vezes, podem ser superiores ao valor da parcela de um financiamento utilizado para a compra de imóvel”, analisam os advogados.
Quanto ao planejamento financeiro para a mudança, a recomendação é ter recursos suficientes em um banco português para poder pagar os vistos e a autorização de residência. “Nos procedimentos de obtenção de vistos e autorizações de residência, os requerentes são chamados a comprovar que têm recursos para se manter no país por determinado período. Tais recursos devem estar disponíveis e em Portugal”, argumentam Salomão e Senise. Já em relação ao mercado de trabalho, os advogados recomendam que o imigrante se prepare para a competição, já que os concorrentes locais conhecem a realidade do país, e estão inseridos no contexto europeu de tecnologia e inovação.
"Cheio de possibilidades"
A administradora e psicóloga Evelyn Cris Pechir, de 43 anos, se mudou para Portugal há seis meses. Ela conta que o marido, que é engenheiro civil, foi em julho para a Europa para estudar o mercado de trabalho e a possibilidade de emigrar para lá. “Ele achou que o mercado na área dele estava em alta. É um país que está velho, que envelheceu e se esqueceu de se renovar. É um país cheio de possibilidades na construção civil”, explica. Além disso, Evelyn afirma que a família estava insatisfeita com alguns problemas no Brasil, como a falta de segurança e a corrupção. Assim, ela decidiu se mudar com os dois filhos para encontrar o marido do outro lado do Atlântico.
Em Portugal, o marido de Evelyn se matriculou em um mestrado em engenharia e também começou a trabalhar. “Em 40 dias, ele conseguiu o título de residência. Ele conseguindo, eu e meus filhos conseguimos em seguida”, conta. Enquanto para o marido arrumar um emprego foi relativamente fácil, para ela está sendo mais difícil. “Estou trazendo todos os documentos e fazendo a equivalência. Para aí, sim, procurar um trabalho na minha área”, explica. Conseguir um lugar para morar também não foi fácil. “Moradia foi um caos. Os aluguéis são caríssimos. Aqui vale mais a pena comprar do que alugar. E os preços de um ano pra cá se elevaram. Isso foi um dificultador enorme”, conta a psicóloga.
Porém, se o emprego e a moradia apresentaram dificuldades, a adaptação ao clima e aos costumes de Portugal foi mais fácil para a família de Evelyn. “O clima é muito bom. Moro no Sul de Portugal, então, não é muito gelado”, diz. A língua também foi um facilitador. “Principalmente para meus filhos, que têm 6 e 7 anos. Eles se sentem inseridos na escola e nos lugares que frequentam”, afirma.
Na opinião da psicóloga, as principais vantagens de Portugal em relação ao Brasil são a segurança e a educação. Além disso, afirma que a família foi bem recebida. “A gente não sofreu xenofobia ou preconceito. Mas de uma forma geral as exigências para um brasileiro, como qualquer outro imigrante, são maiores do que para portugueses.” Outro ponto negativo para ela é a saudade da família, que ficou por aqui.
Agora, ela pensa em solicitar a cidadania portuguesa, depois dos cinco anos necessários. “Pretendo tirar principalmente pensando nos meus filhos. Gostamos do Brasil, mas o futuro deles é muito mais promissor aqui. Mesmo porque, Portugal abre portas para a Europa inteira”, diz. Ao ser questionada se recomendaria para um brasileiro se mudar para Portugal hoje, Evelyn responde que é algo difícil de responder. “Depende muito do seu momento de vida, do seu histórico. A gente tá muito feliz aqui, juntos”.
O que você precisa saber
» Escolha bem a região onde deseja morar. Cidades maiores oferecem melhores serviços, mas as menores, como vilas e aldeias, oferecem boas oportunidades.
» Permanência até 90 dias para turismo ou negócios no país dispensa visto.
» A partir desse período, o visto é necessário para posterior autorização de residência.
Tipos de vistos
D1 – Para trabalhadores que tenham contrato com uma empresa, válido por período superior a um ano ou para trabalho sazonal, por três meses.
D2 – Serve tanto para prestadores de serviços quanto empreendedores. Vale, por exemplo, para estrangeiros que tenham efetuado operações de investimento, ou comprovem possuir meios financeiros disponíveis em Portugal.
D7 – Para aposentados e quem vive de rendimentos
Autorizações de residência – Necessárias para quem quer morar permanentemente no país, já que os vistos são permissões temporárias. Inicialmente, são válidos por um ano, e depois podem ser renovadas por até quatro. Com cinco anos morando legalmente em Portugal, é possível pedir a cidadania portuguesa.
Visto gold – Trata-se de uma autorização de residência especial a investidores estrangeiros de modalidades específicas, como compra de imóvel de valor igual ou superior a 500 mil euros; investimento de 350 mil euros em fundos de risco e o depósito de 1 milhão de euros em instituição financeira portuguesa. Novas regras, autorizadas pelo Parlamento no mês passado, estabeleceram que o visto gold será válido para aquisições de imóveis nas cidades do interior. Lisboa e Porto, os dois principais destinos dos brasileiros, estão fora do programa. A lei ainda depende de elaboração e sanção pelo governo.
» Custo – Cerca de R$ 500, com as taxas inclusas, para o visto D1. Os demais têm valores variados.
» O agendamento para dar entrada no pedido de visto é feito pela empresa VSF Global, e não mais pelos consulados.
» Comprar ou alugar uma casa depende. O acesso ao crédito é facilitado. Se o imigrante tem capital, o ideal é comprar um imóvel. Caso a opção seja o aluguel, há algumas dificuldades. Donos de imóveis em Portugal costumam cobrar três aluguéis como garantia, além de exigir fiador.
» O imigrante deve ainda provar que tem recursos para se manter no país por determinado período.
Fonte: Escritório de advocacia Brasil Salomão e Matthes e governo português
Incentivo para trazer cidadãos de volta
Os descendentes e familiares próximos de emigrantes portugueses têm ainda mais incentivos para se mudar para o país. Com o objetivo de trazer de volta para Portugal os cidadãos que foram morar no exterior, o governo lançou o programa Regressar, que oferece apoio financeiro, entre outros benefícios, para quem foi morar fora do país e retorna. A inscrição é válida para cidadãos portugueses – e seus cônjuges e familiares de até 3º grau – que tenham morado em Portugal antes de 31 de dezembro de 2015 e tenham residido no exterior permanentemente por pelo menos 12 meses. Além disso, é preciso que a família tenha a situação tributária regularizada em Portugal.
Além de uma quantia em dinheiro, o governo oferece ajuda com custos para viagem e transporte de bens, bem como desconto de 50% no Imposto de Renda por cinco anos. Para quem pensa em abrir uma empresa no país, o Regressar tem linha de crédito de até 1 milhão de euros (cerca de R$ 4,6 milhões), com período máximo de oito anos. Porém, para ser elegíveis, as micro, pequenas e médias empresas têm que cumprir requisitos disponíveis no site do Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas e à Inovação (Iapmei).
As famílias de portugueses que se mudarem para o país pelo programa também têm direito a cotas em universidades públicas, que são válidas para quem não concluiu um curso superior em Portugal ou em outro país. Por fim, o governo também oferece ajuda para encontrar emprego para essas pessoas. A inscrição no Programa Regressar é feita on-line, no site no IEFP, e requer a comprovação da situação de emigrante do cidadão português e da família – que é emitida por autoridades consulares e diplomáticas de Portugal – além de prova da regularização fiscal.
Falta de apoio
O empresário e jornalista brasileiro Fabiano de Abreu, de 38 anos, mora há três em Portugal. Ele tem nacionalidade portuguesa e já tinha o desejo de se mudar para o país, mas tomou a decisão com a crise econômica e a “falta de apoio” do governo brasileiro às empresas. Fabiano não foi para a Europa com os benefícios do Programa Regressar, mas pensa em inscrever os pais e as irmãs, que são portugueses. “Se a pessoa tem cidadania europeia, vir pra cá hoje vale a pena. Mas não pode vir às cegas”, diz. O empresário acredita que ter uma base de conhecimento em uma área ou conhecer pessoas no país é importante.
Segundo o brasileiro, os benefícios do programa dependem da região de Portugal para a qual o imigrante escolhe se mudar. “Se você for para Lisboa, não vai ter tantos benefícios, já que é para onde todo mundo quer ir. Melhor que seja uma vila ou aldeia", afirma.
*Estagiário sob supervisão da editora-assistente Vera Schmitz