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Potências advertem o Irã

Estados Unidos e União Europeia condenam o regime de Teerã por retomar o enriquecimento de urânio e retirar o credenciamento de uma inspetora da ONU retida quando tentava acesso a uma instalação atômica

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Estados Unidos e União Europeia (UE) expressaram ontem, em graus diferentes, preocupação pelo incidente com uma inspetora da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA, órgão da ONU) que foi barrada em uma instalação e retida no país, além de ter o credenciamento suspenso pelo Irã. Os atritos entre o regime islâmico e a comunidade internacional coincidem com a confirmação, por parte de Teerã, de que foi retomado ontem o enriquecimento de urânio na usina subterrânea de Fordo, mais um passo na política assumida pelo governo de se descomprometer com termos do acordo nuclear firmado em 2015 com seis potências, mas do qual os EUA se retiraram em maio de 2018 ; com o restabelecimento de sanções contra a economia iraniana.

;Pedimos ao Irã que garanta que os inspetores da AIEA possam realizar seu trabalho corretamente;, disse um representante da UE durante uma reunião do Conselho de Governadores da agência, em Viena. O diretor-geral do órgão, Cornel Feruta, condenou as autoridades iranianas por terem retido a funcionária. ;Impedir que um inspetor saia do país, principalmente quando recebeu instruções a esse respeito, é algo inaceitável e que não deve ocorrer;, advertiu, em um comunicado.

As autoridades iranianas explicaram, em comunicado, que o episódio envolvendo a inspetora, na semana passada, foi iniciado quando ela entrava na usina nuclear de Natanz. Um alarme de segurança foi disparado, indicando que a visitante poderia estar portando ;algum produto suspeito;. ;Consequentemente, a entrada da inspetora nas instalações foi proibida e sua credencial foi retirada;, completa o comunicado.

Em tom sensivelmente mais enérgico que o do bloco europeu, a missão norte-americana perante a AIEA classificou como ;provocação escandalosa; o cancelamento da credencial da funcionária. ;Todos os membros deste conselho devem indicar claramente que esses fatos são inaceitáveis;, disse a embaixadora dos EUA no organismo, Jackie Wolcott. Os 35 países-membros da Assembleia de Ministros da AIEA foram convocados a uma reunião extraordinária dedicada a analisar o impasse com o Irã e estudar uma resposta oficial ao incidente.

O regime de inspeções nas instalações atômicas iranianas são um dos pilares do acordo firmado em 2015 por Teerã com EUA, Rússia, China, Reino Unido, França e Alemanha. Desde que Trump anunciou a retirada de Washington e o restabelecimento de sanções que tinham sido suspensas, em troca do congelamento do programa nuclear, os dois países entraram em um novo período de tensão (leia quadro). Como parte desse processo, o regime islâmico comunicou a decisão de retomar paulatinamente as atividades que havia abandonado nos termos do tratado de 2015.


;Chantagem;
O governo americano reagiu ao anúncio oficial de Teerã sobre a retomada do processamento de urânio e convocou os parceiros internacionais a acompanhar Washington na imposição de represálias. ;Agora é o momento para que todas as nações rejeitem a chantagem nuclear desse regime e tomem medidas severas para aumentar a pressão;, diz um comunicado emitido pelo secretário de Estado Mike Pompeo.

A Organização Iraniana de Energia Atômica confirmou oficialmente a reativação dos trabalhos na usina de Fordo, mas assegurou que ;todas as atividades foram realizadas sob o controle da AIEA;. A iniciativa tinha sido antecipada para a imprensa na segunda-feira, quando expirou o prazo dado por Teerã aos cinco países que se mantêm no acordo para que tomassem medidas destinadas a contornar o impacto da nova rodada de sanções dos EUA, em particular quanto à exportação de petróleo.

O ministro de Relações Exteriores da Alemanha, Heiko Maas, considerou o gesto do Irã ;inaceitável;. O presidente da França, Emmanuel Macron, alertou o regime islâmico sobre as consequências de ;sair da estrutura do acordo, pela primeira vez, de maneira explícita e não limitada;. A Rússia, que tem participação no programa nuclear iraniano, afirmou que ;observa com preocupação; o desenrolar dos acontecimentos.


;Agora é o momento para que todas as nações rejeitem a chantagem nuclear desse regime e tomem medidas severas para aumentar a pressão;
Mike Pompeo, secretário de Estado dos EUA



Relações
turbulentas


EUA e Irã em nova rodada do impasse nuclear

Acordo rompido
Em 8 de maio de 2018, o presidente Donald Trump anunciou a retirada dos EUA do acordo internacional sobre o programa nuclear iraniano e o restabelecimento de sanções a Teerã.

Sanções
Em 7 de agosto, Washington restabelece severas sanções econômicas contra o Irã. Grandes empresas internacionais cessam atividades e projetos na República Islâmica. Em 5 de novembro, entram em vigor medidas contra os setores petrolífero e financeiro iraniano.

Resposta
Em 8 de maio de 2019, o Irã decide iniciar o descumprimento de algumas cláusulas do acordo firmado em 2015 com as seis potências (EUA, Rússia, China, Reino Unido, França e Alemanha).
Em 1; de julho, Teerã anuncia que superou o limite de 300kg fixado para as reservas de urânio enriquecido de baixo teor.

Ensaio diplomático
Em 25 de agosto, o chanceler iraniano, Mohammad Javad Zarif, faz visita surpresa à França, às vésperas do encontro do G7, como parte de uma tentativa para reatar conversações diretas com Washington. Em 4 de setembro, o regime islâmico dá por encerrada a mediação francesa, diante da recusa dos EUA a suspender as sanções.

Urânio enriquecido
Em 26 de setembro, a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) anuncia que o Irã recomeçou a enriquecer urânio em novas centrífugas. No dia 7, Teerã declara que retomou o processo na usina subterrânea de Fordo (180km ao sul da capital). A ação consuma a quarta fase de redução dos compromissos do país com os termos do acordo nuclear de 2015.