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Caos em Barcelona

Pelo terceiro dia consecutivo, manifestantes pró-independência da Catalunha entram em confronto com policiais. Ativistas radicalizam e lançam ácido contra agentes. Líderes secessionistas pedem contenção. Premiê da Espanha promete firmeza e moderação

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Os rolos de papel higiênico lançados ao céu salpicaram de branco a imensa massa humana, no cruzamento da Gran Via de les Corts Catalanes com a Carrer de la Marina, no centro de Barcelona. O terceiro dia de protestos contra sentenças impostas pelo Tribunal Supremo de Madri a 12 líderes secessionistas da Catalunha foi convocado pelos chamados Comitês de Defesa da República (CDR) sob o lema ;Temos muita m... para limpar;. Poucas horas depois, as ruas da cidade de 1,9 milhão de habitantes se transformaram no palco de uma batalha campal. Até o fechamento desta edição, 10 carros tinham sido incendidados pelos manifestantes, que também atearam fogo a barricadas improvisadas com contêineres de lixo e lançaram pedras, coquetéis molotov e ácido, contra os agentes da Mossos d;Esquadra, a polícia autônoma da Catalunha.

Enquanto as forças de segurança lutavam para conter o caos em Barcelona, a 620km dali, em Madri, o primeiro-ministro da Espanha fazia um chamamento à serenidade. ;O governo da Espanha garantirá os direitos de todos na Catalunha, respeitando o Estado de direito. Com firmeza, moderação e unidade. Estou convencido de que superaremos esses episódios de violência;, declarou Pedro Sánchez. ;Temos que ser firmes, mas proporcionais na resposta. (;) Estou convencido de que, apesar das imagens dramáticas dos últimos dias e das últimas horas, a tranquilidade será restabelecida na Catalunha;, acrescentou.

Condenado a 13 anos de prisão pelo Tribunal Supremo, na última segunda-feira, Orio Junqueras ; ex-vice-presidente da Catalunha ; publicou uma mensagem no Twitter por meio da qual condenava a violência. ;Este país é o resultado de lutas sociais, uma nação que custa muito para construir e costurar. Precisamos da república e de todos. Precisamos nos mobilizar, mas rejeitar a violência, de onde ela vier. Não nos dividirão nem nos farão cair na armadilha da violência, escreveu.;

Em entrevista coletiva no fim da noite, o presidente da Catalunha, Quim Torra, pediu pelo fim imediato da violência. ;Não podemos aceitar que poucos, que não nos representam, rompam o caminho seguido pelo independentismo. (;) Não podemos permitir que grupos de infiltrados e provocadores destruam a imagem do independentismo, não podemos cair em uma armadilha. (;) Não há justificativa nem para queimar carros nem para nenhum ato de vandalismo. O protesto tem de ser sempre pacífico;, declarou.

;Tiro no pé;
Professor do Departamento de Ciência Política, Direito Constitucional e Filosofia do Direito da Universitat de Barcelona, Cesareo Rodriguez-Aguilera afirmou ao Correio que o independentismo catalão está dando um tiro no próprio pé. ;Há uma faixa eleitoral de centro-direita do movimento que não seguirá o rumo da violência, fazendo com que o independentismo perca apoios;, advertiu. ;Os grupos ativistas mais fanáticos começaram a agir com a intenção de desestabilizar.; Cesareo admite que as penas de 9 a 13 anos aos líderes secessionistas são severas, mas crê em benefícios de semiliberdade em breve.

Morador de Manrresa, a 60km de Barcelona, o engenheiro de software Mois;s Trullàs Parrot, 52 anos, explicou que os catalães estão indignados e alterados, por considerarem a sentença uma agressão. ;O independentismo estava um pouco dividido, e isso parece que está o unindo novamente. Suspeito que estejam dando origem a mais secessionistas;, disse à reportagem. Ele destaca, no entanto, que 99,9% dos independentistas defendem uma luta pacífica. ;Espero de Madri qualquer ação, menos o diálogo e a negociação. Por isso, mentem, afirmando que somos todos violentos. Acho que haverá mais ações policiais, sanções políticas e prisões sem motivos. Enfim, mais repressão, mais castigo e um retrocesso à ditadura de Francisco Franco;, lamentou Parrot.

Sob condição de não ter o sobrenome revelado, Jaume, 38 anos, recepcionista de hotel em Terrasa, a 40km de Barcelona, disse desconfiar de ação orquestrada. ;A intenção foi ganhar repercussão internacional depois das sentenças. Sem apoio, não podem obter a independência;, comentou. ;Manifestar-se é um direito fundamental, incendiar coisas e enfrentar a polícia, não.;