Se o Brexit torna quase em inferno o breve governo de Boris Johnson, nem por isso a vida é mais fácil para o principal líder da oposição britânica. Jeremy Corbyn sobreviveu a duras penas a uma votação crítica na Conferência Nacional do Partido Trabalhista, na semana passada. Expoente da ala esquerda, Corbyn conseguiu derrotar uma moção pela qual a facção centrista pretendia atrelar o partido a uma posição mais clara e combativa contra a saída do país da União Europeia (UE).
Atento às bases históricas do trabalhismo em cidades industriais, que votaram por maioria expressiva a favor do Brexit, no referendo de 2016, Corbyn traçou para si mesmo uma estratégia baseada na ambiguidade. Confiante no fracasso de Boris Johnson e de seu governo conservador, o líder da oposição aposta em se apresentar às urnas, em uma eleição antecipada que considera inevitável, apenas como adversário da condução do processo pelos tories.
;A identidade de cada um no tratamento da questão do Brexit tornou-se um divisor de águas na política britânica;, observa a professora de ciência política Sara Hobolt, da prestigiada London School of Economics. ;É isso que interessa para as pessoas, é isso que define as opiniões. Hoje, os britânicos se identificam muito mais como os do ;fica; ou os do ;sai; do que como partidários dos conservadores ou dos trabalhistas.;
As duas legendas que se alternam no governo em Londres, na última década, tiveram uma amostra desse fenômeno no fim de maio, nas eleições para a renovação do Parlamento Europeu ; um processo do qual o Reino Unido só veio a participar por ter sido forçado a adiar a separação com a UE. Ainda que a participação no pleito seja tradicionamente inferior à verificada nas eleições legislativas, os resultados falam por si.
O Partido do Brexit, recém-fundado pelo líder da campanha vitoriosa no referendo de 2016, foi o mais votado, seguido pelos liberal-democratas, uma das legendas que se atrelaram à defesa incondicional da permanência no bloco continental. O Partido Trabalhista ficou com o terceiro lugar, com 14% dos votos, superando por margem mínima os Verdes ; outra legenda claramente pró-UE. Os conservadores amargaram o quinto lugar, abaixo dos 10%, desgastados pelo impasse e divididos entre os que defendem a separação a qualquer custo, como Boris Johnson, e os que rejeitam a saída sem um acordo firmado com Bruxelas. (SQ)