A percepção dentro da Casa Branca é de que Donald Trump enfrenta um problema sério depois que um informante de inteligência denunciou um telefonema no qual o presidente norte-americano teria pressionado o colega ucraniano, Volodymyr Zelensky, a investigar o ex-vice-presidente democrata Joe Biden e o filho Hunter (leia o Entenda o caso). No Capitólio, sede do Congresso, intensificam-se as cobranças para que o governo divulgue documentos sobre a conexão entre Trump e Zelensky. A presidente da Câmara dos Representantes, Nancy Pelosy, estabeleceu um prazo até quinta-feira para o diretor da Inteligência Nacional, Joseph Maguire, entregar a denúncia completa do informante ao Comitê de Inteligência da Câmara.
Ex-governador de Massachusetts e potencial adversário de Trump nas primárias republicanas, Bill Weld acusou o chefe de Estado de ;traição;. ;A pena para traição, sob o código penal dos Estados Unidos, é a morte. Esta é a única pena. A pena sob a Constituição é a remoção do cargo e isso pode parecer uma boa alternativa se ele puder trabalhar em um acordo judicial;, declarou.
Trump admitiu o diálogo com o ucraniano, tornou a apontar perseguição política e exigiu o nome do informante. ;Tivemos um telefonema perfeito. (;) Todo mundo sabe que é apenas uma caça às bruxas dos democratas;, afirmou a jornalistas. O magnata republicano negou ter ameaçado reter ajuda militar a Kiev caso a Ucrânia não investigasse Biden, seu potencial adversário nas eleições de 2020. ;Eu não dei uma declaração de que ;você tem de fazer isso ou não irei ajudá-lo;. Eu não faria isso;, disse.
No início do mês, a Casa Branca liberou US$ 250 milhões em assistência militar aos ucranianos. Trump partiu para a ofensiva e atacou o ex-vice-presidente democrata. ;Joe Biden e seu filho são corruptos. Tudo bem? Mas as fake news não querem divulgar isso porque eles são democratas.; Perguntado se ele estava levando a ameaça de alguns democratas a sério, respondeu: ;Não é nada sério;.
Em seu perfil no Twitter, o presidente forneceu a sua versão da história. ;O governo ucraniano disse que não foram pressionados durante o telefonema ;bacana;. O sonolento Joe Biden, por outro lado, forçou um promotor durão a não investigar a empresa de seu filho, sob ameaça de não dar muito dinheiro à Ucrânia. Essa é a história real;, escreveu. ;Agora, a mídia fake news diz que eu ;pressionei o presidente ucraniano pelo menos oito vezes durante meu telefonema para ele;. Isso supostamente vem de um chamado ;informante;, que dizem nem sequer ter um relato em primeira mão do que foi dito.;
Traição
Jeffrey Cramer, ex-procurador federal por 12 anos no Departamento de Justiça e analista do Berkeley Research Group (na Califórnia), avaliou ao Correio que a denúncia contra Trump é ;muito grave;. ;Indiscutivelmente, seria traição se o presidente estivesse trocando ajuda militar dos Estados Unidos em troca de um favor político pessoal;, advertiu. ;Muito menos crucial é o fato de que isso seria uma violação da lei de financiamento de campanha, a qual proíbe a aceitação de qualquer valor de um governo estrangeiro. É provável que não exista um caso criminal devido a várias questões legais, incluindo a impossibilidade de um presidente em exercício ser indiciado, segundo a política do Departamento de Justiça. A única ação é por meio do Congresso, através de um impeachment;, acrescentou. Nesse caso, Trump poderia ter violado o juramento.
No domingo, o influente deputado democrata Adam Schiff, presidente do Comitê de Inteligência da Câmara dos Representantes, admitiu que suas principais dúvidas sobre um eventual impeachment estavam desaparecendo depois da ligação de Trump a Zelensky. ;Estamos falando de abuso grave ou flagrante e possível violação da lei;, disse Schiff à rede de TV CNN. ;Eu tenho muita relutância em seguir o caminho da destituição, (mas) o presidente está nos empurrando nesse caminho.; De acordo com o site The Hill, estrategistas democratas acreditam que o suposto escândalo possa beneficiar Biden e fazê-lo vencer a nomeação para candidato às eleições. Eles entendem que as ações de Trump sugerem que o presidente se sente mais ameaçado por Biden em uma disputa direta.
Foguete cai perto da embaixada americana em Bagdá
Um foguete caiu, na noite de ontem, perto da Embaixada dos Estados Unidos em Bagdá, informou uma fonte dos serviços de segurança à agência France-Presse (AFP), enquanto o comando militar iraquiano indicou que houve no total dois disparos de projéteis. As sirenes da representação diplomática soaram em duas ocasiões, informaram fontes estrangeiras presentes no local. O ataque ocorre em um contexto de fortes tensões entre Estados Unidos e Irã, as duas potências com maior presença no Iraque. ;Um foguete Katiusha atingiu às 23h40 (17h40 em Brasília) a Zona Verde, não muito distante da embaixada americana;, disse à AFP um oficial da polícia. Por sua vez, o comando militar iraquiano informou que ;dois disparos de morteiro; caíram próximo à Zona Verde, mas não citou a embaixada dos EUA. Até o fechamento desta edição, a autoria dos disparos não tinha sido reivindicada.
Entenda o caso
Telefonema indiscreto
Um informante anônimo denunciou que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, tentou persuadir o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, a prover informações prejudiciais sobre o ex-vice-presidente Joe Biden, possível adversário do magnata nas eleições de 2020. Durante a conversa, ocorrida em julho, os dois chefes de Estado teriam abordado as supostas denúncias de corrupção que envolvem Biden e o filho Hunter.
Segundo o jornal The Wall Street Journal, no telefonema, Trump pressionou Zelensky cerca de oito vezes para investigar o possível caso de corrupção envolvendo Hunter, que trabalhou com uma companhia ucraniana de gás natural quando o pai era vice-presidente de Barack Obama. Biden comentou o assunto no domingo, classificando as ações de Trump como ;um aterrador abuso de poder;. ;Sei o que estou enfrentando, um abusador em série. É isso que esse cara é;, afirmou Biden.
Trump, por sua vez, reconheceu que teve ;uma grande conversa, muito direta, muito honesta;. ;A conversa foi, em grande medida, de parabenização, em grande parte, (sobre) corrupção (...) e em grande parte (sobre) o fato de que não queremos nosso povo, como o vice-presidente Biden e seu filho, criando corrupção (...) que já existe na Ucrânia;, admitiu o mandatário.
Análise da notícia
Credibilidade
em xeque
A suposta pressão de Trump para que o presidente da Ucrânia investigasse Joe Biden indicaria ao menos um grave desvio ético do magnata republicano, ao tentar levantar indícios de corrupção cometida pelo adversário democrata. Tudo em benefício próprio, a fim de prejudicar o rival nas eleições de 2020. Um comportamento obscuro por parte de um chefe de Estado.
O escândalo põe em xeque a credibilidade de Trump, já arranhada pelas suspeitas de interferência da Rússia no processo eleitoral de 2016. Caso as denúncias do informante se confirmem, a atitude do republicano seria a de alguém que busca o poder a todo custo, sem se importar com as consequências.
Não cabe a um mandatário usar o cargo para obter algum tipo de vantagem ou de regalia ; nesse caso, a vantagem nas urnas. A conduta de Trump tinha sido desqualificada por Robert Mueller. O procurador especial sobre o caso do conluio russo não descartou obstrução de Justiça por parte do titular da Casa Branca.
Trump insiste na tese da ;caça às bruxas; e adota o vitimismo ao abordar mais uma denúncia. Se a Casa Branca nada teme, então que publique a íntegra da conversa entre Trump e Zelensky, e permita ao cidadão norte-americano dissipar quaisquer dúvidas sobre o seu líder. Se não o fizer, dará pretexto para que os simpatizantes do impeachment impulsionem uma investigação no Congresso. (RC)
Eu acho...
;Precisamos conhecer os fatos. O Congresso deve receber a denúncia do informante. Certamente, este presidente tem um histórico de fazer acordos, tanto como magnata do ramo imobiliário, quanto como apresentador de programa de televisão.;
Jeffrey Cramer, ex-procurador federal por 12 anos e analista do Berkeley Research Group (na Califórnia)
Bastidores
Giuliani no furacão
Rudolph Giuliani (foto), ex-prefeito de Nova York e consultor judicial de Trump, trabalharia com o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, na investigação sobre Biden e o filho. Andriy Yermak, advogado e assistente de Zelensky, admitiu ao site LB.ua (da Ucrânia) que decidiu entrar em contato com Giuliani ao saber que tinha cancelado uma visita a Kiev, em maio, para forçar o país a investigar Joe Biden. Segundo a rede de TV CNN, Yermak teria prometido a Rudy ;investigações transparentes;.
Pressão de aliado
O ex-governador republicano de Ohio John Kasich (foto) instou os membros de seu partido a se unirem aos democratas em um apelo para que a Casa Branca divulgue a informação vazada pelo denunciante. ;Você precisa ter certeza de que não está colocando seu partido e seu próprio pequeno esconderijo à frente do que é correto nesse caso;, advertiu. ;Estou esperando que um ou dois republicanos fortemente digam que isso é errado e que vamos investigar.;
Comportamento obsceno
O ex-vice-presidente Al Gore (foto) defendeu a abertura de um processo de impeachment contra Trump. ;Se for verdade (a mais recente acusação), e não for abordada, isso normalizará o mais obsceno e ultrajante comportamento, ameaçará o Estado de direito e a promessa de democracia e autogovernança. Tudo isso está em jogo, declarou, em entrevista à CNN. ;O único remédio é uma investigação de impeachment;, disparou.
Eu quero o Nobel
Em entrevista a jornalistas paquistaneses, Donald Trump deixou a modéstia de lado e disse que receberia o Prêmio Nobel da Paz, ;se eles o distribuíssem de maneira justa;. A declaração foi dada depois que um repórter disse que o republicano ;definitivamente mereceria; um Nobel da Paz se fosse capaz de mediar uma solução para o conflito na Caxemira. ;Eu acho que ganharia o Prêmio Nobel por uma série de coisas, se eles o distribuíssem de maneira justa,
o que não acontecerá;, afirmou o norte-americano.