Jornal Correio Braziliense

Mundo

Voltando para ficar


Além dos avanços tecnológicos, a Apollo 11 foi responsável por colocar o homem em um novo patamar da exploração espacial, onde a Terra já não é o limite. Para o professor da Universidade de Brasília (UnB) Renato Borges, coordenador do Laboratório de Simulação e Controle de Sistemas Aeroespaciais (Lodestar) da instituição, a ousadia da Nasa permitiu à humanidade pensar ainda mais longe. Ele considera a volta à Lua ;extremamente importante; porque permitirá a construção de uma base de onde será possível lançar missões para o espaço profundo, inclusive rumo a Marte.

O Brasil jamais pensou em ir para tão longe. A vocação aqui é outra: bases de lançamento e nanossatélites com aplicações civis e militares. Em entrevista ao Correio, Borges, membro do Instituto de Engenheiros Eletricistas Eletrônicos (IEEE) e da Sociedade de Sistemas Aeroespaciais e Eletrônicos, considera que o programa espacial brasileiro avançou, mas questiona se há uma velocidade suficiente. ;É preciso avaliar se nossa taxa de crescimento está satisfatória ou não;, diz.


Quais os principais legados da Apollo 11?
Para a ciência, os ganhos com a missão Apollo 11 são vários. Desde em relação ao estudo do nosso satélite natural propriamente dito, com coleta de amostras que foram trazidas à Terra, a questões relativas ao comportamento do homem em missões do tipo. A missão expôs os nossos astronautas a certas condições inéditas. Em relação aos aspectos tecnológicos, foi desenvolvida uma série de dispositivos tecnológicos para esse tipo de aplicação. Pelo fato de ser a primeira missão com sucesso que levou o homem a pousar no solo lunar, a Apollo 11 abriu uma nova porta para o conhecimento. Você quebra uma barreira, que é o homem saindo da Terra e pisando em um astro no espaço. Isso é um passo importantíssimo para o início de uma nova era de exploração espacial, de espaço profundo. Agora, estamos olhando não só para a Lua, mas para planetas próximos, que poderiam ser explorados em prol do ser humano.

Por que voltar à Lua?
Considero o retorno extremamente importante. O olhar para essa missão é outro: é irmos não apenas para obter algumas amostras, mas para, de certa forma, ficar. Ficar no sentido de que o objetivo agora é, de fato, construir uma infraestrutura para a gente colonizar a Lua. O propósito agora é outro, é termos condições de permanecer lá por um período longo, ter infraestrutura para a permanência do homem por um período maior, para o entendimento melhor do ambiente e para projeção de missões em espaço profundo que estão por vir; por exemplo, Marte. A Lua passa a ser um ponto de apoio para outros tipos de missão, passa a ser um ambiente para se permanecer por um período maior de tempo. Hoje, temos a Estação Espacial Internacional orbitando próximo à Terra, e teríamos uma infraestrutura semelhante em alguns aspectos, mas em solo lunar. Certamente, isso será explorado de diversas formas. Amanhã, teremos turismo na Lua, o homem tendo essa forma muito fácil de ir até lá. Essa é a grande meta, o grande passo a ser dado por nós.

Qual avaliação o senhor faz do programa espacial brasileiro?
Nós temos equipe qualificada no país, temos pesquisadores e profissionais com norral no setor, com uma excelente capacidade técnica. Em relação ao programa espacial brasileiro, é possível perceber indicadores que apontam uma evolução nos últimos anos, e digo isso pelas missões espaciais de grande porte que o Brasil tem desenvolvido em parceria com outros países, como a China. Recentemente, houve a entrada do país em missões preliminares com nanossatélites, o que, de fato, é uma tendência, principalmente em relação a serviços de comunicação, margeamento; serviços que o homem utiliza no dia a dia e que antes eram executados e prestados por grandes agências espaciais. Hoje, esses serviços estão cada vez mais absorvidos por missões de satélites pequenos, que são colocados em órbitas baixas, têm custo reduzido e estão permitindo o acesso ao espaço de forma mais rápida. Temos o Brasil entrando nessas questões e já estabelecendo também missões em parceria com países como Estados Unidos, dentre outros. Temos o primeiro geoestacionário que o Brasil assume o comando e o controle... Então, é uma série de ações que, se elencarmos, é possível perceber essa evolução histórica. A questão da velocidade com que a gente tem desenvolvido é outro aspecto importante, que envolve não apenas competência técnica, mas questões econômicas e políticas. Estamos falando de um setor estratégico, com aplicações tanto na área civil quanto na militar. Então, há vários aspectos para serem considerados e para avaliar se nossa taxa de crescimento está satisfatória ou não. Eu diria que, por ora, existem a competência, os indicadores que apontam um crescimento e uma série de elementos para a gente fazer uma análise mais precisa se estamos andando numa velocidade lenta, se deveríamos estar mais rápidos.

Qual a vocação espacial do Brasil?
Eu diria que nós temos uma posição geográfica muito favorável para lançamentos. A linha do Equador corta nosso país. Então, temos duas bases de lançamentos e um aspecto que precisa, de fato, ser mais explorado. Nós temos uma família de veículos de sondagem ; aqueles que vão fazer voos suborbitais ; muito boa. Tivemos uma iniciativa muito boa no VLS, o veículo lançador de satélite. Infelizmente, houve um acidente, uma tragédia que o país enfrentou (a explosão da base de Alcântara, no Maranhão, há 16 anos), mas existem vários pesquisadores e profissionais trabalhando nessa área de desenvolvimento de veículos e, certamente, essa é uma área estratégica para o país. É um tópico que continua sendo desenvolvido e investigado e que precisa receber uma atenção cada vez maior. A gente precisa, de fato, avançar e acelerar esse processo para que possa retomar a exploração de nossa base de lançamento. (PO)


;O objetivo agora é, de fato, construir uma infraestrutura para a gente colonizar a Lua. O propósito agora é outro, é termos condições de permanecer lá por um período longo (...) Amanhã, teremos turismo na Lua;