Chicago ; Cientistas franceses e holandeses conseguiram reduzir as chances de progressão do tumor e aumentar o tempo de vida de pacientes com mieloma múltiplo usando um anticorpo monoclonal. O remédio surtiu os resultados positivos em indivíduos submetidos a transplante de medula óssea, uma das abordagens usadas contra a doença. A mesma droga já é prescrita para pessoas que não podem fazer a cirurgia. Recentemente, foi aprovada para o uso ampliado no Brasil, tendo como base resultados de pesquisa apresentada no Encontro da Sociedade Americana de Oncologia (ASCO), na semana passada, em Chicago, nos Estados Unidos.
A linha de pesquisa explorada pelos cientistas ; usar medicamentos já disponíveis no mercado ; foi uma das mais apresentadas no congresso internacional. Nesse caso, a equipe americana escolheu o anticorpo monoclonal anti-CD38, chamado daratumumabe, para tratar pacientes com mieloma múltiplo elegíveis ao transplante de medula óssea.
O trabalho, chamado CASSIOPEIA, contou com a participação de 1.085 pacientes e foi conduzido na França e na Holanda. Os pacientes receberam, inicialmente, quatro ciclos de indução com o anticorpo anti-CD38 e o coquetel de medicamentos usados no tratamento padrão da doença ; bortezomib (Velcade), talidomida e dexametasona (VTD). Um grupo de controle recebeu apenas o VTD.
Em seguida, todos foram submetidos ao transplante de medula óssea e a mais dois ciclos medicamentosos. Depois de 100 dias do transplante, a taxa de resposta completa melhorou 20% nos voluntários que receberam VTD e 29% naqueles tratados também com daratumumabe. ;Tivemos também redução de 53% no risco de progressão do tumor ou morte. A combinação pode ser considerada uma opção de tratamento válida para pacientes recém-diagnosticados elegíveis para tratamento autólogo;, ressalta Philippe Moreau, pesquisador do Hospital Universitário Hotel-Dieu, na França, e autor do trabalho, que também foi publicado na revista especializada The Lancet.
Vantagem brasileira
Angelo Maiolino, professor de hematologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e oncologista do Américas Centro de Oncologia Integrado (RJ), destaca que o estudo e a recente aprovação do uso do anticorpo no Brasil são extremamente positivos. ;A adição dessa quarta droga, o daratumumabe, causou uma grande vantagem aos pacientes tratados no trabalho, e o Brasil, agora, é o primeiro país do mundo que aprovou esse uso baseado nos dados apresentados no CASSIOPEIA, antecedendo até as agências regulatórias americana e europeia, o que, possivelmente, vai ocorrer futuramente com base nos dados. É importante sair na frente, pois podemos servir de exemplo para análises futuras também;, justifica.
Maiolino ressalta que, nos últimos 10 anos, novas opções para tratar o mieloma múltiplo têm surgido. ;Há 30 anos, as opções eram extremamente limitadas, com o transplante autólogo, que é feito com material do próprio paciente. Isso mudou muito, gerando avanços na década de 1990. Agora, temos essa nova onda, com a incorporação desses fármacos surgindo;, diz.
Demanda mundial
Os avanços, segundo ele, são ainda mais relevantes considerando o envelhecimento da popu-lação. ;Com esse aumento de idosos, a incidência da doença aumentará. É importante ter esse progresso;, justifica. ;Outro ponto importante é melhorar o diagnóstico. Principalmente no Brasil, recebemos grande parte dos pacientes já com a doença avançada, e isso dificulta o tratamento e até a entrada deles nesses estudos clínicos;, afirma.
Para o especialista, o próximo passo é fazer com que o medicamento recém-aprovado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) chegue aos pacientes. ;Agora, temos que nos dedicar para que todos tenham acesso a eles, seja na rede pública, seja na privada, além de conscientizar os próprios médicos para ficarem alertas em relação à identificação da doença;, disse.
* A repórter viajou a convite da Janssen
53%
Redução de risco de progressão do tumor ou de morte em pacientes submetidos ao tratamento experimental