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Premiê Theresa May deixa cargo com país no impasse sobre o Brexit

Candidato favorito à sucessão defende a saída com ou sem acordo, opção rejeitada pela maioria dos eleitores


Londres recebe nesta segunda-feira (3/6) a visita de Estado do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, na semana em que a despedida da primeira-ministra Theresa May coloca o país diante de um dilema existencial realçado pelo resultado da eleição para o Parlamento Europeu, conhecido há uma semana. O país deve se desligar do bloco continental em 31 de outubro, e só participou da votação porque o governo não conseguiu em tempo a aprovação do parlamento para o acordo que negociou em Bruxelas para o ;divórcio;. Nas urnas, o Partido Conservador, de May, foi castigado com o pior resultado da história recente: inacreditáveis 9% dos votos e a quinta colocação, atrás até dos ecologistas.

Os eleitores, no entanto, também não pouparam a principal força parlamentar de oposição, o Partido Trabalhista, que mal chegou a 14%, meros dois pontos acima dos verdes. E fizeram do recém-fundado Partido do Brexit, batizado com o nome do processo pelo qual o país se desliga da União Europeia (UE), o grande vencedor, com 32%. Em segundo lugar, apareceu o Partido Liberal Democrata (20%) ; ironia ou não, uma das forças mais resolutas em favor da permanência do país na UE.

Theresa May, que deixa formalmente o cargo na sexta-feira, assumiu a chefia do governo em 2016, na sequência da renúncia do correligionário David Cameron, um europeísta que aceitou submeter o Brexit a referendo, embora se opusesse à saída. A sucessora se apresentou para a missão fundamental de conduzir a separação, mas nem sequer conseguiu costurar a unidade entre os conservadores. Pior: deixa a liderança do partido, cujo ocupante é o primeiro-ministro, sem ter aprovado o acordo de ;divórcio; que negociou com a UE.

Formalmente, a disputa pela sucessão de May no Partido Conservador começa na próxima semana, mas ao menos 10 nomes já se apresentaram, e o Brexit desponta como a questão central para a escolha, que deve se prolongar até o fim de julho. Quem larga como favorito é o ex-chanceler Boris Johnson, o adversário mais ácido da premiê no âmbito interno. Sua campanha tem como lema implantar a ferro e fogo a decisão tomada por 52% dos eleitores britânicos, há três anos: deixar a UE em 31 de outubro, ainda que sem acordo com Bruxelas sobre os termos da futura relação, um salto no escuro temido por boa parte do empresariado britânico.

Johnson, que construiu popularidade como prefeito de Londres, tem o apoio insólito de Donald Trump, que se permitiu tomar partido sobre a sucessão no gabinete e sobre o Brexit em uma série de entrevistas para a imprensa britânica, antes de embarcar para Londres (leia abaixo). Tem a companhia, no apoio a um ;Brexit duro;, de concorrentes como Dominic Raab, ex-ministro extraordinário para o assunto, e Andrea Leadsom, que recém deixou o posto de ministra para relações com o parlamento.


Desafio existencial

É um candidato do campo moderado, o chanceler Jeremy Hunt, defensor de uma saída pactuada do bloco europeu, quem alerta para o perigo representado pelo prolongado impasse parlamentar sobre o Brexit. Sem maioria para aprovar seu acordo, Theresa May viu-se obrigada a adiar duas vezes a separação, originalmente prevista para o fim de março. Após quatro derrotas e a derrocada do partido nas eleições europeias ; cuja participação ela fez tudo para evitar ;, a premiê se decidiu pela renúncia. ;A menos que consigamos resolver esse impasse, o Partido Conservador enfrenta um risco existencial;, alertou Hunt.

O resultado das urnas apresenta para a elite política britânica um dilema existencial na linha do ;ser ou não ser;, tornado clássico pelo dramaturgo seiscentista William Shakespeare em Hamlet. Se, de um lado, a impaciência do eleitorado deu a vitória ao Partido do Brexit, de outro lado apenas um terço dos eurodeputados britânicos eleitos defende a saída incondicional, com ou sem acordo. Mais que isso, a bancada do país na próxima legislatura do Parlamento Europeu terá maioria contrária à separação.

A crise existencial só não arrasta os conservadores à depressão profunda, ao menos por ora, porque os eleitores foram igualmente duros com a oposição trabalhista. O líder Jeremy Corbyn, que nos últimos meses multiplicou os chamados à convocação de eleições parlamentares antecipadas, parece conformado com a ideia de mais alguns anos à frente da minoria, diante da clara indicação de que, caso o país voltasse hoje às urnas, nenhum dos dois grandes partidos teria votos suficientes para governar.