Funcionários do serviço de inteligência da Índia entraram em contacto com colegas do Sri Lanka para alertar sobre possíveis ataques contra igrejas duas horas antes dos atentados, revelaram fontes dos dois países à agência Reuters. Outro alerta tinha sido feito pela Índia no dia 4. As autoridades dos dois países não quiseram comentar a informação.
"Investigações preliminares revelaram que o que aconteceu no Sri Lanka foi uma represália pelo ataque contra os muçulmanos de Christchurch", disse Ruwan Wijewardene, ministro da Defesa cingalês, em referência ao ataque que deixou 50 mortos no dia 15 de março em duas mesquitas da cidade da Nova Zelândia.
O ministro não detalhou por que as autoridades acreditam que haja um elo entre as explosões no Sri Lanka e o ataque em Christchurch, cometido por um supremacista branco com ideário de extrema direita durante as orações de sexta-feira. A primeira-ministra da Nova Zelândia, Jacinda Ardern, disse que seu governo não tinha nenhuma informação de inteligência sugerindo que os atentados no Sri Lanka foram em retaliação ao ataque de Christchurch.
Segundo as autoridades do Sri Lanka, os ataques foram realizados por pelo menos sete homens-bomba, em três igrejas e quatro hotéis. Fontes ligadas à investigação contaram à agência France Presse que dois irmãos, de aproximadamente 20 anos, tiveram papel fundamental na articulação dos ataques.
O governo do Sri Lanka confirmou nesta terça que as investigações mostraram que o grupo Thowheeth Jamaath Nacional (NTJ, na sigla em inglês) está por trás dos ataques e tem vínculos com um desconhecido movimento islamista radical da Índia, o Jamaat-ul-Mujahideen India (JMI). O NTJ é considerado um grupo marginal extremista dentro de uma pequena minoria religiosa. Só 9,7% da população do Sri Lanka, de cerca de 21 milhões de pessoas, são muçulmanos, diante da maioria budista de 70%.
Acredita-se que o NTJ tenha sido criado há cerca de três anos, após um grupo de jovens muçulmanos radicais se separar de outro grupo islâmico extremista, o Thowheed Jamath do Sri Lanka. Segundo especialistas em contraterrorismo, desde então, sua base de operações foi instalada no leste do país, distante da costa ocidental mais cosmopolita. Já o JMI seria uma dissidência de um grupo terrorista com o mesmo nome, formado em Bangladesh, em 2015, que pretende instaurar o domínio islâmico na região.
Grupos tão jovens e inexperientes não conseguiriam cometer um ataque da magnitude do realizado no domingo. "Jovens muçulmanos do Sri Lanka lutaram para o EI nas guerras na Síria e no Iraque e, como o grupo perdeu seus últimos bastiões no Oriente Médio, muitos combatentes voltaram a seus países", disse ao jornal Guardian Alan Keenan, diretor para o Sri Lanka da ONG International Crisis Group. "É exatamente este modo operacional do EI: formar alianças com grupos extremistas locais e cometer atentados, dividir para conquistar."
O Estado Islâmico tem os motivos e os meios para ajudar a promover ataques como o do Sri Lanka. Extremistas novatos como os da NTJ precisariam de ajuda significativa para montar uma operação tão complexa.
O EI criou um modelo parecido com o já usado pela Al-Qaeda: a terceirização do terrorismo para franquias locais, com apoio logístico e operacional. Foi o que aconteceu em Bangladesh, em 2016 e 2017, e nas Filipinas, em 2016, quando jihadistas locais usaram apoio logístico do EI para promover atentados.
A estratégia também indica uma nova tendência dos grupos jihadistas sunitas, principalmente do EI. Por décadas, o jihadismo sunita se caracterizou pelo terrorismo transnacional e por ataques suicidas. Esses pilares não parecem ser tão firmes como antes. Segundo analistas, a transformação está ocorrendo em vários países, incluindo Afeganistão, Iêmen, Mali, Bangladesh e Filipinas.
A Jabhat al-Nusra, braço da Al-Qaeda na Síria, é um exemplo. Em 2016, o grupo montou um longo manual de treinamento para seus novos recrutas. No livro de aproximadamente 200 páginas, eles discutem os méritos da jihad sob um prisma nacional, em detrimento da jihad global. "Os extremistas sunitas estão mudando de rumo, afastando-se da agenda global que atingiu sua apoteose no ataque da Al-Qaeda ao World Trade Center, e em direção a um modelo hiperlocal", escreveu na Atlantic o sírio Hassan Hassan, analista de Oriente Médio e autor do livro ISIS: Inside the Army of Terror (Isis, por dentro do Exército do terror). "A tendência do grupo é esta: depois de perder o território conquistado na Síria e no Iraque e ver seu império dizimado, acionar sua extensa rede internacional de simpatizantes para promover múltiplos ataques.".