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Macron chega como franco favorito para 2° turno da eleição presidencial

O centrista Emmanuel Macron chega como franco favorito para o segundo turno da eleição presidencial, que desenhará um cenário político inédito no país desde o pós-guerra, com as forças tradicionais em posição secundária

Os franceses aguardam ansiosos pelas 20h de hoje (15h em Brasília) para confirmar o nome do próximo ocupante do Palácio do Eliseu, que sucederá o impopular presidente socialista François Hollande até 14 de maio, quando expira seu mandato de cinco anos. As últimas pesquisas de opinião sobre o segundo turno da disputa deixaram pouca margem para alguma surpresa de última hora, apesar do sobressalto provocado pela divulgação de e-mails e documentos capturados por hackers nos computadores da campanha do favorito absoluto, o centrista Emmanuel Macron (leia mais abaixo). O candidato do movimento Em Marcha! aparecia no patamar de 60% das intenções de voto, com vantagem segura sobre Marine Le Pen, da Frente Nacional (FN, ultradireita).

O desempenho de cada um dos dois nas urnas é uma das incógnitas que intrigam políticos e observadores. Outro, igualmente importante, é a taxa de participação dos pouco menos de 47 milhões de eleitores. No primeiro turno, duas semanas atrás, cerca de 23% deixaram de ir às urnas. Hoje, a expectativa é de uma ausência ainda maior, em particular entre os 20% que votaram no candidato da esquerda radical, Jean-Luc Mélenchon. Depois de alguma relutância, ele chegou perto de recomendar o voto em Macron para derrotar Le Pen, cuja eleição considerou que seria ;um grande erro;.

[SAIBAMAIS]Nos números finais da votação de hoje os analistas buscarão pistas para delinear o futuro político do país, após uma eleição que quebrou tabus fixados desde o fim da 2; Guerra Mundial, em 1945. Pela primeira vez, nessas sete décadas, a sucessão presidencial será decidida sem a presença de um representante das formações clássicas da direita e da esquerda ; atualmente, republicanos e socialistas, que se alternam no poder desde o início dos anos 1980.

Na primeira rodada da votação, os franceses promoveram para a ;primeira divisão; da política a nova formação criada por Macron, dissidente do Partido Socialista (PS), e tiraram do gueto a legenda anti-imigração fundada por Jean-Marie Le Pen, pai de Marine. Para ela, em particular, a derrota esperada tem algum sabor de vitória: hoje com um discurso centrado na rejeição aos imigrantes e no questionamento da União Europeia (UE), a FN caminha para duplicar os 18% conquistados pelo patriarca em 2002, quando o partido chegou pela primeira vez ao segundo turno.

;Le Pen se fortalece pelo número inédito que deve fazer, próximo aos 40%;, disse ao Correio Yann Duzert, professor da Fundação Getulio Vargas ligado à Diretoria de Relações Internacionais. ;A atomização da esquerda e o desmoronamento dos republicanos ajudaram.; Na avaliação de Duzert, a expressiva votação de uma legenda antes associada à xenofobia e à ocupação nazista durante a 2; Guerra traduz em números o sentimento de uma parcela da população que vê a identidade nacional ameaçada. ;Os franceses estão dando nesta eleição uma última oportunidade à Europa.;

O professor doutor Weber Lima Bonfim, do Centro Universitário Iesb, acredita que o futuro político de Le Pen ;dependerá de sua capacidade de aglutinar setores importantes da sociedade francesa e mantê-los em torno de sua candidatura, mesmo que derrotada;. Para o estudioso, ;a FN é uma força que não pode ser desprezada, mas não é algo que não existisse anteriormente: a direita está presente no espectro político europeu desde a Revolução Francesa (1789);.

Governabilidade

Analistas na França e no exterior já se debruçam em projeções para as eleições legislativas, que terão o primeiro turno dentro de um mês. O sistema eleitoral francês, 100% distrital, tende a potenciar a representação dos grandes partidos em detrimento de formações com menor implantação local, como é o caso especialmente do movimento recém-criado por Macron, egresso do PS. A FN, que tem atualmente apenas dois deputados na Assembleia Nacional, a despeito da expressiva votação nacional, fez progressos nas últimas eleições municipais e regionais e aposta em um crescimento substancial.

;Até agora, o espectro tende para o centro;, arrisca o professor do Iesb. ;Mas há uma forte tendência para a direita no cenário mundial, com o enfraquecimento da retórica esquerdista diante de alguns problemas sociais, em especial a segurança pública e o enfrentamento da crise econômica herdada de 2008.; Para Duzert, da FGV, muito do futuro político da França ;depende de como Macron decidir formar seu primeiro governo; ; que será composto antes das eleições. ;Se mostrar moderação, aceitando diferenças e negociando com as demais forças e os parceiros externos;, avalia, o novo presidente poderá reunir capital político para seu recém-fundado movimento.

Três perguntas para
Yann Duzert, professor da Fundação Getulio Vargas

Qual é o saldo da eleição para republicanos e socialistas, que se alternaram no poder nas últimas três décadas?

Foi uma desmoralização para os republicanos. Com François Fillon, eles não conseguiram ocupar o espaço da direita, fechado por Marine Le Pen, nem o do centro, capturado por Emmanuel Macron. O Partido Socialista teve suas posições clonadas por Jean-Luc Mélenchon, da França Insubmissa. A esquerda se dividiu em duas e sofreu com a ascensão de Macron, e a facção radical virou parâmetro para o PS se posicionar.

Como Macron, em minoria na Assembleia Nacional, poderá negociar a aprovação do primeiro gabinete?

Pesquisas sugerem que ele poderia compor maioria agregando as forças de centro. Seria um novo jogo, com uma parte importante da França que não se sente em casa no país, com pessoas (imigrantes) que chegam e não se incorporam. Os mais velhos não se identificam com esse processo. Foi o que os americanos disseram com a eleição de Trump.

Quais são as perspectivas para as eleições legislativas?

Tudo depende de como Macron formar o próximo governo. Se mostrar moderação, vamos ver se consegue negociar mostrando que aceita diferenças, embora sem ceder excessivamente às demais forçar políticas francesas e aos parceiros europeus.