Caracas, Venezuela - O máximo tribunal venezuelano irá revisar duas sentenças, com as quais assumiu as faculdades do Parlamento e retirou a imunidade de seus deputados, segundo um acordo entre os poderes públicos anunciado na madrugada deste sábado. Os representantes destas instituições - menos o Legislativo, de maioria opositora - decidiram "exortar o Supremo Tribunal de Justiça (TSJ) a revisar as decisões (...) com o propósito de manter a estabilidade institucional e o equilíbrio de poderes mediante os recursos contemplados na ordem jurídica", diz o texto.
O chamado Conselho de Defesa, integrado pelos poderes do Estado, havia sido convocado pelo presidente Nicolás Maduro para solucionar as diferenças, depois que a procuradora-geral, Luisa Ortega, ligada ao chavismo, denunciou, ontem, que as sentenças do TSJ representavam uma ruptura da ordem constitucional.
O opositor Julio Borges, presidente da Assembleia, negou-se a comparecer, alegando que Maduro "é "responsável pela quebra da ordem constitucional" e "não pode pretender, agora, ser um mediador". "Chegamos a um acordo importante de solução desta controvérsia, que, com (...) a publicação dos esclarecimentos e correções respectivas das sentenças 155 e 156, fica superada", disse Maduro em rede de rádio e TV, antes de o vice-presidente, Tareck El Aissami, ler o documento.
[SAIBAMAIS]Participou da reunião o presidente do Supremo Tribunal, Maikel Moreno, mas não Luisa Ortega, com quem, segundo o governante, teria havido conversas durante a reunião do Conselho.
Rejeição ao acordo
O vice-presidente do Legislativo, Freddy Guevara, rejeitou o acordo, assinalando que "uma revisão da sentença que deixe tudo como estava não resolve um golpe de Estado". "A pressão nacional e internacional continuará até que se restitua a linha conconstitucional", advertiu Guevara no Twitter.
As sentenças do TSJ - acusado pela oposição de servir ao governo - geraram um forte rechaço internacional, principalmente a emitida na última quarta-feira, com a qual a corte assumiu as competências da câmara, que declarou em desacato há mais de um ano. A oposição acusa Maduro de ter dado um golpe de Estado, enquanto o secretário-geral da Organização de Estados Americanos (OEA), Luis Almagro, denunciou um "autogolpe".
O chefe de Estado respondeu ontem que, "na Venezuela, há plena vigência da Constituição, dos direitos civis e políticos, dos direitos humanos". Fortalecidos pela pressão internacional sobre o governo, os adversários de Maduro irão protestar neste sábado, sob as advertências do presidente de que enfrentará qualquer "aventura golpista".
Após um período de letargia, em que, segundo pesquisas, perdeu apoio de simpatizantes ao fracassar um diálogo com o governo, a oposição voltará às ruas para exigir respeito à Assembleia e eleições para superar a grave crise política e econômica. A partir de hoje, "iremos planejar ações de protesto, para criar um imenso movimento de pressão cidadã e resistência", disse o chefe do bloco parlamentar, Stalin González.
Os deputados irão realizar uma sessão numa praça pública de Caracas, para "ratificar que a Assembleia representa a vontade cidadã", assinalou.
Aventuras golpistas
As sentenças do TSJ se basearam no status de desacato em que a câmara foi declarada em janeiro de 2016 por não ter desvinculado três deputados opositores acusados de fraude eleitoral. Borges disse ontem que a voz crítica da procuradora mostra que o governo está dividido, e pediu às Forças Armadas e aos demais poderes que seguissem o seu exemplo.
Diante da onda de críticas, Maduro lançou ontem uma dura advertência à oposição: "Que ninguém aproveite estas circunstâncias para aventuras, porque a vontade de enfrentar aventuras golpistas é absoluta, e eu chamaria o povo às ruas", desafiou o presidente, rejeitado por sete em cada 10 venezuelanos, segundo pesquisas.
Maduro afirmou ser vítima de um "linchamento diplomático" e de um plano liderado por Estados e governos de direita, através da OEA, para derrubá-lo. Ainda assim, reiterou que está disposto a retomar o diálogo que a coalizão Mesa da Unidade Democrática (MUD) congelou em dezembro passado alegando que o governo não cumpriu acordos envolvendo o cronograma eleitoral e a libertação de opositores. "Estou pronto para retomar o diálogo com a participação do Papa (um dos facilitadores do processo)", assinalou.
Um grupo de 13 países apresentou um projeto de resolução para ser discutido na próxima segunda-feira em reunião de emergência do Conselho Permanente da OEA, a fim de declarar que as sentenças do TSJ constituem "uma violação da ordem constitucional".