O presidente Donald Trump decidiu virar as costas para a luta contra as mudanças climáticas, mas isto não significa que estados e cidades americanas deixarão de trabalhar nesse sentido, preveem especialistas.
"Os que estão na vanguarda da transação energética nos Estados Unidos são os estados federados e as cidades", aponta Célia Gautier, da Climate Action Network, o que leva a pensar que "a ação a favor do clima continuará".
Mas tendo em conta que "haverá um retrocesso da ação federal para alcançar os objetivos estabelecidos por Obama (redução das emissões de gases de efeito estufa de 26% a 28% entre 2005 e 2025), será necessário tomar novas medidas em nível local", adverte.
Na quarta-feira, a Casa Branca indicou que ainda não tomou uma decisão sobre sua adesão ao Acordo de Paris. Na véspera, Trump assinou um decreto que põe fim ao plano de Obama para fechar as usinas térmicas mais poluentes.
"Cumpriremos nossos compromissos (...) a favor de uma economia baseada nas energias renováveis e que coloca o interesse da população acima dos grandes poluidores", reagiram na terça-feira em um comunicado representantes da Califórnia, Oregon e do estado de Washington, em nome de "50 milhões de pessoas".
Os prefeitos de Seattle, San Francisco, Los Angeles, Nova York, Austin, Chicago e Filadélfia também se manifestaram nesse sentido.
Alden Meyer, do ;think tank; Union of Concerned Scientists, quer acreditar que o país pode ir contracorrente da Casa Branca.
"A boa notícia é que os atores [fora do governo federal] consolidam seus esforços: governadores, prefeitos, setor privado, investidores", destaca.
E dá o exemplo do Google, que "tem como objetivo uma energia 100% sustentável para seus servidores a partir deste ano, antes do previsto".
Outra razão positiva é a nova situação econômica. As energias renováveis são cada vez mais competitivas, o progresso na eficácia energética avança e o carvão vai sendo substituído pelo gás.
"A menos que Trump injete bilhões de dólares em subvenções à indústria do carvão, ele não poderá evitar o declínio", ressalta Alden Meyer.
Liderança política?
Segundo David Levai, do Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Relações Internacionais de Paris, o Clean Power Plan (Plano de Energia Limpa) de Obama "supunha discutir estado por estado a política energética" e "este trabalho foi impulsado".
"É pouco provável que voltemos atrás", apesar de que "haverá menos pressão para passar do carvão às energias sustentáveis", aponta.
Inclusive nos feudos republicanos, as energias verdes se impõem, indica. O Texas, por exemplo, é o primeiro estado produtor de energia eólica.
Mas além da incerteza sobre os objetivos americanos, a dúvida no ar é se estas medidas de Trump podem fazer cambalear o Acordo de Paris.
Miguel Arias Cañete, o comissário europeu de Ação pelo Clima e Energia, reconheceu que agora a liderança da "UE, China e outras economias destacadas é mais importante do que nunca".
As autoridades chinesas, por sua vez, reafirmaram seu compromisso: "A China não mudará sua determinação, seus objetivos e políticas em termos de mudanças climáticas", declarou na quarta-feira o ministro do Exterior.
Os especialistas ressaltam que a ação climática na China e na Índia também está vinculada à luta contra a poluição do ar. No entanto, a questão sobre a liderança política se impõe.
"Não podemos nos limitar à dinâmica econômica, real mas não rápida o suficiente. Também se necessita de uma ação política", explica Célia Gautier. "É a Europa que tem que fazer isso, e é um papel cada vez mais assumido pelos países mais vulneráveis".