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ELN liberta soldado colombiano na véspera do início dos diálogos de paz

O chef negociador do governo, Juan Camilo Restrepo, que dias atrás havia considerado a captura de Moreno como um "gesto hostil" da guerrilha, comemorou a notícia

A última guerrilha ativa na Colômbia, o ELN, libertou nesta segunda-feira um soldado que era mantido como refém, na véspera do lançamento das negociações de paz com o governo para superar meio século de conflito, informou o Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV).

"O soldado Fredy Moreno Mahecha, integrante do Exército que estava em poder do Exército de Libertação Nacional (ELN), foi entregue hoje (segunda-feira) na zona rural do departamento [estado] de Arauca a uma equipe formada por delegados do CICV e membros da Defensoria do Povo e da Igreja católica", informou a organização em um comunicado.

O militar, de 39 anos, foi dado como desaparecido em 28 de janeiro pela força pública no conturbado Arauca, na fronteira com a Venezuela, e três dias depois da guerrilha guevarista reconheceu tê-lo capturado em 24 de janeiro "quando estava desenvolvendo trabalhos de espionagem".

"O ELN cumpriu seu compromisso. Foi libertado o soldado capturado em Arauca quando realizava atividades de inteligência", informou a guerrilha em uma mensagem no Twitter de sua rádio oficial, ELN Ranpal.

Christoph Harnisch, chefe da delegação do CICV na Colômbia, comemorou a notícia antes de o governo Santos e o ELN, que se insurgiu em 1964, iniciarem negociações formais de paz em Quito.

"Confiamos em que estes gestos reforcem a confiança entre o governo colombiano e o ELN diante do iminente início da fase pública de conversações em Quito. Acreditamos que os problemas humanitários vigentes devem ser protagonistas de suas discussões", destacou Harnisch, citado no texto.

O próprio soldado disse à imprensa ao ser libertado que, como membro da força pública, quer a paz e desejou que em breve "se dê a diferença de ideias ou lutas sociais (entre o governo e a guerrilha) mais pelo diálogo e não por meio das armas".

O governo Santos exigia a libertação de Moreno e considerava sua detenção pela guerrilha como um "gesto hostil".

O presidente colombiano, ganhador do prêmio Nobel da paz, assinou em novembro um acordo com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), principal e mais antigo grupo insurgente do país, em sua cruzada por acabar com uma guerra fratricida entre guerrilhas, paramilitares e agentes do Estado, que deixou mais de 260.000 mortos, 60.000 desaparecidos e 6,9 milhões de deslocados.

O Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) informou que Moreno, de 39 anos, foi entregue em uma zona rural do departamento de Arauca, na fronteira com a Venezuela, onde havia sido pego pelos rebeldes em 24 de janeiro.

O chefe negociador do governo, Juan Camilo Restrepo, que dias atrás havia considerado a captura de Moreno como um "gesto hostil" da guerrilha, comemorou a notícia.

"Boa notícia a libertação do soldado em Arauca. Cria confiança para o início da mesa amanhã (terça-feira) em Quito com o ELN", tuitou.

Discussões espinhosas

A mesa com o ELN devia ter sido iniciada em outubro, no Equador, em um processo que conta, além disso, com Brasil, Chile, Cuba, Noruega e Venezuela como avalistas.

Mas Santos exigiu antes a libertação de um ex-congressista, em poder dos rebeldes desde abril passado, e estes reclamaram em troca que dois de seus companheiros presos fossem indultados e outros dois nomeados negociadores da paz.

Com a entrega de Odín Sánchez, o indulto a Nixon Cobos e Leivis Valero, e a designação de Tulio Astudillo e Wigberto Chamorro, o caminho ficou livre para o diálogo, depois de três anos de aproximações secretas.

Mas as negociações, que serão realizadas em uma fazenda que é propriedade dos jesuítas, terão início marcadas por um dos temas mais espinhosos, o dos reféns do ELN.

"É muito importante que o ELN tenha libertado Moreno antes do início formal das negociações", opinou Kyle Johnson, do International Crisis Group. Sem isso, "a mesa teria começado com sérios questionamentos", acrescentou.

A captura do soldado poderia afetar a estabilidade dos diálogos, segundo Kyle Johnson, do International Crisis Group.

"Mostra ao governo e à sociedade que não se poderia confiar que o ELN realmente deixaria de sequestrar pessoas", disse à AFP.

O processo de paz com o ELN, guerrilha inspirada na Teologia da Libertação e na Revolução cubana e oficialmente com 1.500 combatentes, "se anuncia difícil", diferente do que aconteceu com as FARC, considera o cientista político Frédéric Massé.

"O ELN tem reivindicações um pouco mais fundamentadas do que as Farc (...), ele quer mudanças muito mais profundas", disse à AFP este professor da Universidade Externado de Bogotá.

"O governo não é apresentado como um representante do povo, mas como um mediador. Para o ELN, é a sociedade que deve negociar", acrescentou.

Conforme anunciado, o Equador vai acolher a primeira e última rodada nas negociações que podem não terminar antes do final do mandato de Santos, em 2018.