A primeira-ministra britânica, Theresa May, defendeu nesta terça-feira (17/1) uma ruptura "clara e nítida" com a União Europeia (UE), ao declarar que o Brexit também significa uma saída do mercado único europeu.
"O Reino Unido não pode continuar sendo parte do mercado único", ressaltou May, em um esperado discurso em Londres, no qual revelou suas prioridades para as negociações com a UE.
May, que prevê ativar o procedimento de divórcio do Reino Unido com a UE antes do final de março para dar início a dois anos de negociações, disse que submeterá o acordo final ao Parlamento britânico. O anúncio fez a libra esterlina subir.
Bruxelas não comentou oficialmente os planos da primeira-ministra britânica, mas o presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, classificou de "mais realista" o discurso da primeira-ministra sobre o Brexit.
"Preparados a partir do momento em que o Reino Unido estiver. Apenas a notificação [do artigo 50] pode lançar as negociações", reagiu o negociador da Comissão Europeia, Michel Barnier, em uma mídia social.
Para a primeira-ministra, manter o Reino Unido em um mercado único de 500 milhões de consumidores é incompatível com a prioridade número um de Londres: controlar a imigração europeia que passa pelo país por causa do princípio de livre-circulação de trabalhadores.
No referendo de 2016, 52% dos eleitores britânicos votaram pela saída da UE, e muitos citaram o controle da imigração como principal motivo.
"Finalmente, um pouco de clareza"
A vontade de sair do mercado único torna "ainda mais provável" o cenário de um novo referendo sobre a independência da Escócia, onde se votou majoritariamente pela permanência na UE, disse a primeira-ministra escocesa, Nicola Sturgeon, que considerou que essa decisão significá uma "catástrofe econômica".
Após meses de incertezas sobre suas intenções, Theresa May disse desejar "uma nova associação equitativa" com a UE, e "não um estatuto de membro parcial, ou associado da UE".
Além disso, defendeu um "novo acordo" sobre a união aduaneira.
O ministro alemão das Relações Exteriores, Frank-Walter Steinmeier, comemorou os anúncios de May: "Finalmente há um pouco de clareza".
"Pela primeira vez, o Reino Unido aceitou a inflexibilidade da UE sobre as quatro liberdades", declarou à AFP o diretor do laboratório de ideias Open Europe, Stephen Booth.
A UE informou a Londres que a liberdade de circulação de bens, de capitais e de serviços é indissociável da liberdade de circulação de pessoas.
Ainda assim, May assegurou que tentará "ter o maior acesso possível" ao mercado único, para onde se dirigiram 44% das exportações britânicas em 2015. Para evitar uma "mudança muito brusca", ela propôs uma implementação por "etapas" de um acordo com a UE ao fim das negociações.
A comunidade empresarial parabenizou os esclarecimentos de May, mas ressaltou que ainda falta fazer o mais difícil: garantir o melhor acesso possível ao mercado europeu.
"Nos negócios, o que conta de verdade é o que se obtém nas negociações, não o que se deseja", comentou o diretor-geral da Câmara de Comércio britânica, Adam Marshall.
"O melhor amigo"
"Ao Reino Unido interessa que a UE tenha sucesso", disse May, prometendo que a Grã-Bretanha continuará sendo "o melhor amigo e vizinho dos nossos sócios europeus".
O discurso de Theresa May nesta terça-feira marca uma verdadeira ruptura e lança seu país no caminho de um Brexit "rígido". Londres poderá ter de enfrentar a intransigência de outros líderes europeus, como a chanceler alemã, Angela Merkel, que rejeita a ideia de uma "Europa à la carte".
"Os britânicos puseram fim às especulações e trouxeram maior clareza. Isso é algo positivo para as futuras negociações", considerou o presidente do Centro de Política Europeia de Friburgo (Alemanha), Lüder Gerken.
"Os líderes europeus ficarão contentes de ter mais detalhes sobre as negociações futuras", disse o professor de Ciência Política Anand Menon, do King;s College de Londres.
"Mas ficarão menos contentes com as ameaças de May", acrescentou Menon, em referência ao discurso de May, que afirmou que o Reino Unido ficará livre para impor um sistema de taxação "competitivo" para atrair as empresas.