Ao menos cem pessoas morreram e centenas ficaram feridas neste sábado no Iêmen em bombardeios aéreos contra uma multidão que acompanhava um funeral na capital. Os ataques foram atribuídos pelos rebeldes huthis à coalizão árabe, que negou envolvimento.
Entre as pessoas reunidas no funeral estavam autoridades huthis, rebeldes que tomaram Sanaa há mais de dois anos, combatidos por uma coalizão árabe liderada pela Arábia Saudita, em apoio ao governo reconhecido pela comunidade internacional.
O balanço é de "mais de 520 feridos e mais de cem mártires", anunciou o porta-voz do ministério da Saúde, Tamim Al Shami, em declarações à rede de televisão dos rebeldes, Al Masirah.
Segundo ele, esta cifra poderia aumentar, uma vez que há "restos humanos carbonizados" e não identificados no local do ataque, assim como "vários desaparecidos".
Os rebeldes denominaram o ataque como um "massacre". Em um comunicado, a coalizão negou ter realizado operações militares contra o prédio bombardeado e que "outras causas" deviam ser consideradas.
Os bombardeios foram registrados no momento em que Arábia Saudita, que lidera uma coalizão contra os rebeldes xiitas huthis desde março de 2015, está sendo vigiada de perto por ter sido supostamente responsável pela morte de civis com seus bombardeios.
Pouco antes do ataque, um alto funcionário do Ministério da Saúde, controlado pelos rebeldes, Naser al Argaly, havia informado o balanço de 82 mortos e 534 feridos. Já um de seus colegas, Ghazi Ismail, tinha anunciado na página dos rebeldes na internet, a sabanews.net, que o ataque havia deixado 90 mortos e 566 feridos, "a maioria em estado grave".
Os bombardeios tiveram como alvo um prédio da capital, controlado pelos rebeldes, onde aparentemente um grupo de pessoas se reuniu no meio da tarde para apresentar seus pêsames pela morte do pai do ministro do Interior rebelde, Jalal Al Ruishen, acrescentou a sabanews.net.
Uma fonte de segurança, citada pela mesma página, revelou que um enorme incêndio teve início no prédio. Equipes de resgate retiravam corpos queimados e tentavam alcançar outros presos entre os escombros do local atingido, informou um fotógrafo da AFP no local.
Alguns feridos perderam as pernas e eram tratados ali mesmo por voluntários, acrescentou. As ambulâncias evacuavam as vítimas e os hospitais lançaram um apelo para que as pessoas doem sangue, segundo os moradores.
"Um avião lançou um míssil e minutos depois outro avião atacou" o edifício, disse uma testemunha à AFP. Outra testemunha, que pediu para ter sua identidade preservada, descreveu o ataque como um "crime de guerra".
"Era o funeral de um homem em Sanaa e agora se tornou o funeral de dezenas de iemenitas", afirmou. Segundo a emissora Al Masirah, o prefeito de Sanaa, Abdel Qader Hilal, está entre os mortos.
Os rebeldes não informaram se Ruishen ou outras autoridades, além de Hilal, estavam no prédio no momento do ataque.
Ameaça dos rebeldes
Os huthis se apoderaram de Sanaa há mais de dois anos e controlam também outras regiões do país. O governo iemenita, que precisou fugir do país, tenta recuperar o terreno perdido com o apoio da coalizão árabe liderada pela vizinha Arábia Saudita.
O ataque "não ficará impune", advertiu o Conselho Político Supremo, estabelecido recentemente pelos huthis e seus aliados, partidários do ex-presidente Ali Abdalá Saleh, e exortou seus simpatizantes a "usar todos os meios para responder a este crime".
Além disso, o Conselho pediu aos iemenitas que participem de uma manifestação no domingo pela manhã em frente ao escritório da ONU em Sanaa para protestar contra os "crimes de guerra" da coalizão.
Organizações de defesa dos direitos humanos acusam a coalizão, que intervém no Iêmen desde março de 2015, de cometer erros depois que setores civis foram atingidos por seus bombardeios.
No amanhecer deste sábado, quatro civis, membros de uma mesma família, foram mortos em um bombardeio aéreo da coalizão contra uma casa perto de Bajil, na província de Hodeida (oeste), informou à AFP uma autoridade da província.
Em 15 de março, bombardeios aéreos contra um mercado na província de Haja (noroeste de Sanaa) causaram pelo menos 119 mortos, segundo o Unicef. Um líder tribal ligado aos rebeldes acusou a coalizão pelo ataque.
Um relatório da ONU publicado em agosto apontou que bombardeios da coalizão árabe podem ter provocado cerca da metade das mortes de civis no Iêmen.
O documento pedia a criação de um organismo independente que investigue as violações cometidas supostamente pelos dois grupos, depois que 4.000 civis perderam a vida.
A coalizão informou à AFP que utiliza um laser muito preciso e armas guiadas por GPS e que comprova os alvos muitas vezes para evitar a morte de civis. Segundo as Nações Unidas, o conflito no Iêmen já causou mais de 6.700 mortos.