Htin Kyaw, amigo da vencedora do Nobel da Paz Aung San Suu Kyi, assumiu o cargo de presidente de Mianmar nesta quarta-feira, em um momento significativo na transição do país para uma democracia após mais de 50 anos de governo militar direto ou indireto. Em um dia repleto de cerimônia e simbolismo, o presidente, os dois vice-presidentes e 18 ministros foram empossados. Suu Kyi, que venceu o Prêmio Nobel por sua luta pela democracia no país, terá o papel proeminente de ministra de Relações Exteriores e chefiará outros três ministérios.
[SAIBAMAIS]"A União Parlamentar me elegeu como presidente, o que é um momento histórico para este país", declarou Htin Kyaw, de 70 anos, em um discurso depois de tomar posse. Ele prometeu trabalhar pela reconciliação nacional, lutar para alcançar a paz com rebeldes étnicos e melhorar a vida dos 54 milhões habitantes. No entanto, a democracia no empobrecido país do Sudeste Asiático ainda parece incompleta. Os militares mantêm poder considerável no governo e no Parlamento e o próprio presidente será na prática subordinado a Suu Kyi. Ela não pode se tornar presidente por causa de uma manipulação da constituição feita pelo exército e repetidamente afirmou que vai governar o país nos bastidores.
A posse de Htin Kyaw foi realizada em um hall austero do Parlamento, com os parlamentares vestidos com roupas tradicionais. Poucas horas depois, o agora ex-presidente Thein Sein apertou a mão de seu sucessor e entregou a ele uma carta e uma faixa dourada, oficialmente transferindo o poder. Foi Suu Kyi quem liderou o partido Liga Nacional pela Democracia a uma grande vitória nas eleições de novembro do ano passado, introduzindo o primeiro governo civil de Mianmar após 54 anos de governo militar. Suu Kyi viveu décadas em prisão domiciliar e sofreu assédio de autoridades militares sem nunca desistir de uma campanha pacífica para tirá-los do poder.
A cláusula constitucional que a proibiu de ser eleita presidente exclui qualquer pessoa que tenha cônjuge ou filhos estrangeiros. Os dois filhos de Suu Kyi são britânicos, assim como seu último marido. Acredita-se que a cláusula foi adicionada à constituição pelos militares tendo como alvo Suu Kyi.
A constituição, elaborada pela antiga junta militar, reserva 25% dos assentos no Parlamento a oficiais do exército, garantindo que nenhum governo possa emendar a carta magna sem aprovação deles. O exército também chefia o Ministério do Interior, o Ministério de Relações Fronteiriças e o Ministério da Defesa. Além disso, um dos dois vice-presidentes empossados hoje é o ex-general Myint Swe, aliado próximo do líder da antiga junta, Than Shwe. Suu Kyi ficou famosa em 1988, quando protestos populares cresceram no país. A junta militar reprimiu fortemente as manifestações, que acabaram se tornando violentas revoltas contra do governo, deixando milhares de mortos e levando Suu Kyi à prisão domiciliar em 1989. Ela recebeu o Prêmio Nobel no ano seguinte.