Europeus e russos reafirmaram nesta sexta-feira (4/03) a sua vontade de consolidar a frágil trégua na Síria, para permitir a retomada das negociações de paz na próxima semana em Genebra, mas seguem divergindo sobre a forma de alcançar uma solução política para o conflito.
Reuniões e telefonemas se multiplicaram entre os países europeus que apoiam a oposição e a Rússia, um aliado do regime de Damasco.
O objetivo é reforçar o cessar-fogo, ainda precário, apesar dos "progressos visíveis" observados pela ONU, melhorar a assistência humanitária para convencer a oposição, que ainda mostra sinais de desconfiança, e retomar o mais rapidamente possível as discussões inter-sírias para uma solução política.
Com base nestes princípios, Rússia e França voltaram a expressar suas visões completamente opostas a respeito do processo de "transição política" para acabar com a guerra na Síria, que causou mais de 270.000 mortos em cinco anos.
O presidente francês, François Hollande, chamou de "provocativa" e "totalmente irrealista" a ideia do presidente sírio, Bashar al-Assad, de organizar eleições legislativas em abril. Enquanto isso, o presidente russo, Vladimir Putin, considerou que tal votação "não interfere" no processo de paz.
Os dois líderes fizeram essas declarações depois de manter uma conversa telefônica, que também contou com a chanceler alemã, Angela Merkel, o primeiro-ministro britânico, David Cameron, e o primeiro-ministro italiano, Matteo Renzi.
Respeitar o cessar-fogo
Putin "expressou a sua vontade de fazer respeitar o cessar-fogo" na Síria e "garantir que não haja qualquer bombardeio contra a população civil", declarou Hollande numa coletiva de imprensa ao lado de Merkel.
"O compromisso de respeitar o cessar-fogo é uma mensagem importante", disse Merkel, acrescentando que pediu à Rússia para usar sua "influência" para fazer o regime sírio respeitar a trégua.
O cessar-fogo não se aplica aos grupos jihadistas Estado Islâmico (EI) e Frente Al-Nusra, considerados "terroristas" pela ONU. Mas sua implementação é complicada pela aliança entre os vários grupos no terreno, e pelo fato de a Frente Al-Nusra lutar em alguns setores com os rebeldes sírios considerados "moderados" pelas potências ocidentais.
Nesta sexta-feira, os chanceleres francês, alemão, britânico e europeu se reuniram no ministério das Relações Exteriores francês com o coordenador da oposição síria, Riad Hijab.
"Há progressos reais" na Síria, considerou o francês Jean-Marc Ayrault, que insistiu na necessidade de retomar rapidamente as negociações em Genebra.
Mas para esse processo "duas condições se fazem necessárias: o acesso a todos os sírios à ajuda humanitária e o pleno respeito da trégua", disse ele.
Quase meio milhão de pessoas vivem em áreas sitiadas na Síria e a oposição considera insuficiente as melhorias no acesso à assistência humanitária. O Alto Comitê de Negociações da oposição condiciona sua participação nas negociações, a serem retomadas em 9 de março, a este acesso humanitário.
A questão do acesso à ajuda "está longe de ser satisfatória", estimou o ministro alemão Frank-Walter Steinmeier. No entanto, "nós incentivados Hijab a preparar-se para voltar à mesa de negociações em Genebra, independentemente das suas reservas", acrescentou o britânico Philip Hammond.
Enquanto isso, Hijab declarou pouco depois à imprensa que "as condições atuais não são propícias para a retomada das negociações", mas disse que a oposição ainda não tomou uma decisão sobre a sua participação nas mesmas.
Ele também afirmou que "não há lugar" para Assad em um processo de transição, uma questão que é um dos pontos de desacordo entre russos e ocidentais.
O enviado especial da ONU para a Síria, Staffan de Mistura, afirmou nesta sexta-feira que "corresponde aos sírios" decidir a esse respeito.
No terreno, a ONU se preparava para entregar ajuda humanitária em Kafar Batna, cidade a leste de Damasco controlada pelos rebeldes, a segunda operação do tipo desde a entrada em vigor da trégua, no último sábado.
A situação era calma no setor, mas nesta sexta-feira foram realizados dois bombardeios aéreos ao redor da cidade de Duma, de acordo com o Observatório Sírio dos Direitos Humanos(OSDH).