postado em 02/03/2016 15:26
Em época de preparativos para páscoa, quando os corredores dos supermercados ficam coloridos com embalagens de chocolate e o consumo do produto aumenta as vendas, usuários da internet comentam a polêmica sobre a utilização de mão de obra escrava infantil na produção de cacau em países da África Ocidental. Segundo o documentário O lado negro do chocolate, produzido pelo jornalista dinamarquês, Miki Mistrati, e divulgado em 2011 no YouTube, empresas como Nestlé, Hershey, Mars, ADM Cocoa, Godiva, Fowler;s Chocolate e Kraft utilizam matéria-prima vinda do trabalho sujo infantil para confecção de doces que rodam o mundo com rótulos que pregam o prazer.
"Vocês desfrutam de algo que foi feito com o meu sofrimento. Trabalhei duro para eles, sem nenhum benefício. Estão a comer a minha carne", relatos de jovens que conseguiram fugir das plantações de cacau impressionam os telespectadores do também documentário Slavery: A Global Investigation (Escravidão: Uma Investigação Global) e alertam para as condições de emprego desumanas na região. ;Sempre que te carregavam com sacos e caías enquanto os transportava, ninguém te ajudava. Em vez disso, batiam e batiam até que te levantasse de novo", destaca uma das fontes do longa, o jovem Aly Diabate.
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De acordo com O lado negro do chocolate, crianças entre 11 e 16 anos, às vezes até mais novas, são isoladas em plantações, nas quais trabalham de 80 a 100 horas por semana. Com uma câmera escondida, o diretor conversou com trabalhadores e traficantes da região de Zégoua Mali, que assumem os perigos que os pequenos sofrem ao percorrer estações de ônibus sozinhos, a procura de emprego para ajudar no sustento familiar, e mostram a banalização da violência e atrocidade pela população local. ;Se alguém na fronteira disser que não trafica crianças está mentindo; os donos das plantações nos pagam para levar crianças até a fronteira; eu já levei várias;, conta um traficante que não teve o nome identificado.
Na quarta parte do longa, tendo como cenário o local de colheita do cacau, o diretor perguntou quanto custa levar um jovem para o trabalho por meio do tráfico, e um dos responsáveis respondeu, ;O preço é a partir de 230 euros, uma criança de Bukina Faso pode ser comprada por 230 euros; e isso sem pechinchar, o preço inclui transporte e uso ilimitado da criança;.
Posicionamento
Em declaração ao Correio, a assessoria da Nestlé Brasil informou que não há lugar para trabalho infantil na cadeia de suprimento da empresa. ;Os Princípios Nestlé de Gestão Empresarial e o Código de Conduta de Fornecedores Nestlé abrangem o trabalho infantil e estamos tomando medidas para eliminá-lo progressivamente, avaliando os casos individualmente e abordando a raiz de suas causas. Esses esforços fazem parte do Nestlé Cocoa Plan, iniciativa que visa melhorar a vida nas comunidades produtoras de cacau e a qualidade do cacau comprado;, acrescenta a assessoria.
De acordo com a empresa, em 2014, foi criado o Sistema de Monitoramento e Remediação de Trabalho Infantil (CLMRS - Child Labour Monitoring and Remediation System) na Costa do Marfim. ;Este mecanismo abrangente permite que nós e nossos parceiros, incluindo a Associação do Trabalho Justo (FLA- Fair Labor Association), identifiquem, nestas comunidades, crianças em situação de risco, além de investigar as condições específicas que geram esse risco. Dessa forma, trabalhamos com indivíduos, famílias comunidades para conscientizar e evitar o problema;, a Nestlé é a primeira companhia entre os compradores dessa matéria prima a criar um sistema do tipo para combater o trabalho infantil.
Para a empresa, gerar oportunidades para que crianças de comunidades produtoras de cacau possam ir à escola é uma das práticas estabelecidas para ajudar a reduzir a incidência de trabalho infantil. ;Em 2014, 17 escolas foram reformadas ou construídas na Costa do Marfim e permitiram que 2.908 crianças frequentassem uma aula pela primeira vez. Com isso, atingimos, com um ano de antecedência, nosso objetivo de construir ou reformar 40 escolas em apenas quatro anos;, completa.
Já a assessoria da Hershey, diz que a empresa trabalha ativamente com parceiros públicos e privados em todo o mundo para garantir que o cacau utilizado em seus produtos seja de origem responsável. "A companhia está em processo de aceleração de suas metas para a certificação dessa matéria-prima. Até o fim do primeiro semestre de 2016, a empresa terá a garantia de que 50% do cacau que utiliza é certificado pelas organizações mais reconhecidas no setor - UTZ, Fair Trade USA e Rainforest Alliance", de acordo com a Hershey, o plano é ter 100% das fazendas produtoras de cacau certificadas até 2020.
"A empresa direciona seus maiores esforços para o oeste da África, com programas que capacitam os fazendeiros com relação a produção e rentabilidade, com o objetivo de melhorar a qualidade de vida das famílias", segundo a assessoria de imprensa, a empresa combina as práticas de origem responsável do cacau em um programa abrangente para expandir o fornecimento desse fruto de forma sustentável e seus investimentos em programas comunitários que aprimoram práticas trabalhistas, educação e o sustento de famílias que o cultivam ao redor do mundo.
Ação judicial
Em setembro de 2015, a Mars, a Nestlé e a Hershey receberam uma ação judicial alegando que estavam enganado os consumidores ao financiar indiretamente o negócio do trabalho escravo infantil do chocolate na África Ocidental. De acordo com sites de ONGs que trabalham para denunciar a escravidão infantil e acabar com esta, em 2001, a Food and Drug Administration, FDA, tentou aplicar a utilização do selo ;slave free; nos rótulos das embalagens de chocolate.
Porém, antes de ser votada, o selo foi vetado pelas empresas com a promessa de acabar a exploração até 2005. Em 2016, a meta de acabar com a exploração na produção de cacau continua, mas parte das fazendas produtoras ainda não são certifcadas.