Cidade do Vaticano, Santa Sé - O papa Francisco deu o tom nesta segunda-feira aos debates do Sínodo dos bispos sobre a família, pregando o rigor doutrinário, mas também abertura aos outros para não fazer da Igreja um "museu".
O Papa pediu aos "padres sinodais" a não considerar a assembleia como um "parlamento", onde os participantes se envolvem em "negociações e compromissos", mas como o lugar onde "a Igreja caminha junto".
Na sala do sínodo, membros da Cúria (governo da igreja), delegados enviados pelas conferências episcopais, aqueles nomeados pelo Papa, e ouvintes, incluindo - pela primeira vez - um casal italiano, Marco e Marialuca Matassonni, que veio com seu bebê de poucos meses.
No domingo, durante a missa de abertura do segundo Sínodo em dois anos sobre a família, Jorge Bergoglio já havia indicado como seriam os debates, que se prolongarão até 25 de outubro.
Tranquilizando os conservadores, reafirmou a doutrina católica, defendendo a indissolubilidade do casamento, condenando o divórcio e reiterando que a família é composta por um homem e uma mulher.
Mas também advertiu que a "Igreja deve buscar, acolher e acompanhar a todos, porque uma Igreja com as portas fechadas trai a si mesma e a sua missão, e, ao invés de ser ponte, se transforma em barreira".
E sem nomear as pessoas que vivem em situação "ilegal" do ponto de vista da Igreja Católica (divorciados que voltam s se casar, uniões livres, homossexuais...), o Papa lembrou que está fora de questão "apontar o dedo para julgar os outros" porque a Igreja tem "a obrigação de procurar e tratar os casais feridos".
Em sua introdução, o relator-geral do Sínodo, o arcebispo de Budapeste Peter Erdo, evocou a recepção dos casais em união livre que querem se preparar para o casamento, mas se mostrou inflexível sobre a doutrina, principalmente quanto aos homossexuais e os divorciados novamente casados.
"Entre o certo e o errado, o bem e o mal, não há gradualismo, embora algumas formas de coabitação cívica tenham aspectos positivos, o que não implica dizer que são boas", disse.
Como preparação para o Sínodo, uma série de questionários foram enviados a pedido do Papa às dioceses de todo o mundo, e colocaram em evidência a distância entre a doutrina severa da Igreja e a prática dos fiéis.
O primeiro sínodo ou assembleia de bispos sobre a família, celebrado há um ano, revelou as profundas tensões e divergências que reinam dentro da Igreja católica, apesar de compartilhar uma série de conceitos básicos.
Um dos principais conflitos que os bispos enfrentam gira em torno dos divorciados que voltam a se casar.
Para a Igreja o casamento é indissolúvel e não reconhece o divórcio civil, razão pela qual não permite que os católicos divorciados que voltam a se casar recebam a comunhão.
Mas, por enquanto, é sobretudo o local dos homossexuais na Igreja que se impõe.
No sábado, o padre Krysztof Olaf Charamsa, membro da Cúria, revelou sua homossexualidade e a intenção de viver abertamente o amor por seu companheiro Eduardo, acusando a Igreja de ter "institucionalizado a homofobia".
"O clero é em grande parte homossexual e também, infelizmente, homofóbico pela falta de aceitação de sua própria orientação sexual", disse ele.
Declarações perturbadoras
Estas declarações provocaram a ira do Vaticano que o expulsou da Congregação para a Doutrina da Fé, órgão do Vaticano especificamente responsável por garantir o dogma católico.
O cardeal Erdo, em seu relatório introdutório, sem se referir ao caso de Charamsa, considerou "inaceitável que os pastores da Igreja sofram pressão nesta matéria". Ele condenou "a analogia" entre as uniões homossexuais e o casamento homem/mulher, e criticou o "pacote de ajuda financeira" aos países pobres para "a introdução de leis sobre o casamento entre pessoas do mesmo sexo".
Por sua parte, o cardeal André Vingt-Trois, arcebispo de Paris, um dos quatro copresidentes da reunião, advertiu: "Apesar de nossas diferenças, este Sínodo não deve ser um confronto, cujos microfones e câmeras serão os árbitros".
Ele também afirmou que não espera "nenhuma mudança espetacular na doutrina", mas considerou que os bispos são chamados "a não fechar os olhos" sobre nenhuma realidade.