A adoção pelos deputados ucranianos de um projeto de lei que concede maior autonomia às regiões separatistas do leste da Ucrânia provocou confrontos entre a polícia e manifestantes nacionalistas, fazendo um morto e uma centena de feridos em frente ao Parlamento.
Desde o levante pró-europeu de Maidan, violentamente reprimido pelo regime pró-russo do presidente Viktor Yanukovitch, derrubado no início de 2014, que a capital ucraniana é palco de tamanha violência.
Os confrontos provocaram preocupação na União Europeia, que apoia as autoridades pró-europeias no poder na Ucrânia desde a queda do antigo regime, e na Rússia, acusada pelo ocidente de apoiar os rebeldes separatistas do leste do país.
Pelo menos 90 membros das forças de segurança ficaram feridos nos confrontos com manifestantes nacionalistas, principalmente do partido de extrema-direita Svoboda, contrários à aprovação pelos deputados de um projeto de reforma constitucional que visa conceder mais autonomia às regiões do leste separatista pró-russo, de acordo com o ministro do Interior, Arsen Avakov.
Um membro da Guarda Nacional morreu depois de ser baleado no coração durante os confrontos, segundo a porta-voz oficial. O ministro do Interior, Arsen Avakov, escreveu no Facebook que a vítima era um recruta de 25 anos.
Além disso, quatro pessoas sofreram ferimentos graves "nos olhos, abdômen, pescoço e pernas", indicou Arsen Avakov, enquanto a polícia de Kiev evocou 100 feridos, incluindo vários graves. O ministro do Interior acusou membros do Svoboda de lançar vários explosivos contra as forças de ordem.
No início da noite, o presidente ucraniano Petro Poroshenko denunciou "um golpe pelas costas" e prometeu punir os responsáveis pela violência. "Foi uma ação anti-ucraniana", cujos organizadores "deverão ser punidos", declarou em uma clara referência ao Svoboda.
Repórteres da AFP viram manifestantes, incluindo militantes do Svoboda, lançar granadas de fumaça em policiais que defendiam o Parlamento. Um artefato explosivo foi lançado a partir da multidão de várias centenas de manifestantes.
O ministério do Interior afirmou se tratar de uma granada de combate e declarou que a pessoa que a atirou fazia parte de um grupo de trinta pessoas detidas após os confrontos.
Um jornalista da AFP viu pelo menos 20 feridos, incluindo 19 em uniformes da polícia da Guarda Nacional, muitos dos quais sangrando bastante. Vários feridos estavam inconscientes quando seus colegas começaram a carregá-los para as ambulâncias.
Por falta de espaço nas ambulâncias, vários feridos tiveram de ser colocados em carros da polícia, por vezes na mala, segundo um jornalista da AFP.
Antes da explosão, dezenas de manifestantes e policiais brigaram em frente ao Parlamento, com os manifestantes tentando romper o cordão de segurança em torno do prédio público.
Projeto de reforma polêmico
A violência eclodiu logo após a aprovação pelo Parlamento em primeira leitura de uma reforma concedendo mais autonomia ao leste separatista mergulhado na guerra.
Um total de 265 deputados, contra um mínimo exigido de 226, votaram a favor desta decisão numa sessão tempestuosa, durante a qual deputados opostos a este projeto que consideram "anti-ucraniano" e "pró-Putin" bloquearam o acesso à tribuna parlamentar e gritavam "Vergonha".
Os confrontos em Kiev foram qualificados como "muito preocupantes" pela chefe da diplomacia europeia, Federica Mogherni, que exigiu que o processo de reforma constitucional não seja interrompido pela violência.
Berlim condenou "com firmeza os incidentes sangrentos", enquanto a Rússia se disse "preocupada" com o que chamou de "violência inaceitável".
A adoção deste projeto de reforma foi exigida pelos aliados ocidentais da Ucrânia, que veem uma maneira de apaziguar o conflito armado que já custou mais de 6.800 mortos em dezesseis meses.
Muitos na Ucrânia, porém, criticam a reforma como uma tentativa de legalizar o controle de fato dos rebeldes de parte do leste industrial do país.
O projeto de reforma concede mais poderes ao conselho de representantes regionais e locais, incluindo aqueles localizados na área agora sob controle rebelde. O projeto de lei autoriza nomeadamente a organização de uma "Polícia do Povo".
Mas, contrariamente às expectativas dos separatistas, não confirma definitivamente o status de semi-autonomia dos territórios sob seu controle. De acordo com o texto, este status deve ser determinado por uma lei específica por uma duração limitada de três anos.