Cidade do Vaticano, Santa Sé - O papa Francisco defende uma "revolução corajosa" para salvar o planeta, ameaçado pelo consumismo, em sua encíclica sobre o meio ambiente, na qual acusa o sistema econômico e financeiro de prejudicar os pobres. O documento de quase 200 páginas, com o título "Laudato si (Louvado seja) sobre o cuidado da casa comum", foi apresentado oficialmente nesta quinta-feira no Vaticano.
Francisco propõe sobretudo um novo modelo de desenvolvimento, baseado na sobriedade e solidariedade, e analisa ao longo de vários capítulos as razões da deterioração do planeta e de como as estruturas de poder provocaram o mesmo. "Chegou o momento de aceitar um certo decrescimento em algumas partes do mundo, aportando recursos para que seja possível crescer de maneira saudável em outras partes", escreve o pontífice. Ele exige "limites" porque é "insustentável o comportamento daqueles que consomem e destroem mais e mais, enquanto outros não podem viver de acordo com sua dignidade humana".
A dívida ecológica
O papa denuncia o atual sistema econômico mundial que usa a "dívida externa como instrumento de controle" e acusa os países ricos por não reconhecerem a "dívida ecológica" que têm com os países em desenvolvimento. "A dívida externa dos países pobres se transformou em um instrumento de controle, mas não acontece o mesmo com a dívida ecológica (...) com os povos em desenvolvimento, onde se encontram as mais importantes reservas da biosfera e que seguem alimentando o desenvolvimento dos países mais ricos ao custo de seu presente e de seu futuro", ressalta.
O pontífice latino-americano, que se inspirou em São Francisco de Assis, o santo defensor da natureza e dos pobres, teme uma guerra pela água, denuncia a perda da biodiversidade e a desigualdade entre regiões ricas e pobres. O documento está dirigido a todo o mundo, e não apenas aos católicos, com um pedido de "responsabilidade" ante a destruição do planeta.
Apresentado a apenas seis meses da reunião de cúpula da ONU sobre o aquecimento global, prevista para dezembro em Paris, o documento terá influência na comunidade internacional. "A submissão da política ante a tecnologia e as finanças se mostra no fracasso das reuniões mundiais", lamentou. "Esta encíclica terá um impacto muito forte, nenhum papa havia tomado partido assim. É o fruto de uma paixão imensa", comentou Christiana Figueres, presidente da Convenção da ONU sobre a Mudança Climática.
Mas a postura de Francisco também gera críticas e reações. Analistas não descartam a possibilidade de campanhas contra o texto, baseadas em estudos científicos e financiadas pelos setores petroleiro e industrial, que têm grandes interesses na questão.