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ONU ameaça Farc e governo de ir ao tribunal internacional

Kofi Annan disse que, caso negociações não cheguem a um acordo de paz, acionará Tribunal Internacional Penal

O ex-secretário-geral da ONU Kofi Annan declarou nesta sexta-feira (27/02) aos negociadores do governo colombiano e aos representantes das Farc que um acordo de paz deve contemplar a justiça pelos crimes cometidos no conflito armado, caso contrário, o Tribunal Penal Internacional poderá intervir.

"O Tribunal Penal Internacional (TPI) tem a norma de que, se o governo envolvido - neste caso o governo colombiano - não solucionar os assuntos de Justiça, não estabelecer um tribunal (...), o TPI intervém", explicou Annan, Prêmio Nobel da Paz 2001, em entrevista coletiva em Havana, junto com os negociadores do governo e das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc).

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"Isso é parte do Estatuto de Roma", firmado em 1998 e que criou esse tribunal internacional, destacou Annan, acrescentando que um eventual acordo de paz deve respeitar "padrões internacionais mínimos" de justiça.

O TPI foi criado para julgar acusados de cometer genocídio, crimes de guerra e crimes contra a humanidade.

O tema da justiça para os crimes cometidos durante o conflito de meio século causa profundas divisões na Colômbia e entre ambas as delegações de paz, que estão negociando desde novembro de 2012 em Havana.

Os rebeldes afirmam que o governo pretende prender os guerrilheiros depois do fim do conflito. Até hoje, os combates no país deixaram 220 mil mortos e mais de 5,5 milhões de deslocados.

Annan advertiu que os assuntos de justiça devem ser resolvidos pela própria Justiça, já que não são atribuição do presidente da Colômbia, nem dos dirigentes das Farc.

Kofi Annan se reuniu em separado e em conjunto na quinta e nesta sexta-feira com as delegações do governo de Juan Manuel Santos e das Farc. O ex-chefe da ONU elogiou os avanços obtidos pelos negociadores e pediu às partes que "mantenham o esforço para avançar para um acordo que traga a paz depois de 50 anos de guerra".

"Mas temos de ser realistas. Terminar um conflito não é fácil. As paixões e as tensões que levaram à guerra não vão desaparecer instantaneamente", acrescentou.

"A paz não é um assunto do governo apenas, é um problema de todos", lembrou.

"Sei que as Farc declararam um cessar-fogo unilateral, o que o governo considera um passo positivo, mas um cessar-fogo bilateral e mais amplo e extensivo ainda é parte das discussões", disse.

A entrevista coletiva de Annan aconteceu no emblemático Hotel Nacional de Havana, acompanhado dos chefes negociadores Humberto de la Calle (governo) e Iván Márquez (Farc). Também participaram os diplomatas dos dois países garantes do processo de paz para a Colômbia, Dag Nylander (Noruega) e Rodolfo Benítez (Cuba).

Pouco antes da entrevista, De la Calle comentou que "para mim, a mensagem central (de Annan) é que a paz é um projeto nacional de todos e para todos".

"No passado, convidei os partidos políticos para conversar. Tive um sucesso parcial, alguns se negaram", desabafou De la Calle, ressaltando as dificuldades para dialogar existentes na Colômbia.

"Acompanhamos com atenção o desenrolar da visita do senhor Kofi Annan ao nosso país, porque estimamos que sua ampla experiência na resolução de conflitos (...) pode oferecer importantes possibilidades para dar novos impulsos ao diálogo", declararam as Farc, em nota divulgada nesta sexta.