O exército ucraniano sofreu nesta quinta-feira um grande revés com a perda do aeroporto de Donetsk, no momento em que os combates com os rebeldes pró-russos ganham intensidade com ao menos 44 mortes em 24 horas.
Diante dos últimos acontecimentos, o presidente ucraniano, Petro Poroshenko, reuniu seu estado-maior para responder à agressão russa.
Desde o início do conflito, em abril, com a anexação da Crimeia por parte da Rússia e o despertar dos separatismos pró-russos no leste do país, mais de 5.000 pessoas morreram nos combates entre as tropas leais a Kiev e os insurgentes, segundo a OSCE.
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O apelo a um cessar-fogo, lançado quarta-feira à noite, em Berlim, pelos ministros das Relações Exteriores ucraniano, russo, francês e alemão não foi atendido e a Ucrânia entra em uma nova onda de violência.
Na frente militar, o conflito viveu um ponto de inflexão com o anúncio de retirada das tropas ucranianas do aeroporto de Donetsk, posição estratégica e simbólica apesar da infraestrutura em ruínas. Os grupos lutavam por seu controle desde maio.
Os rebeldes lançaram uma grande ofensiva no dia 15 de janeiro para tomar as posições defendidas pelos soldados ucranianos, chamados de "ciborgues" e elevados à categoria de heróis por Kiev.
No domingo, o exército declarou que havia repelido o ataque, mas por fim precisou abandonar sua posição no novo terminal do aeroporto.O fracasso é ainda maior, já que em agosto também precisaram se retirar do aeroporto de Lugansk, a outra região secessionista. O exército ainda não indicou se conduzirá uma contra-ofensiva para tentar recuperá-lo.
O comandante do batalhão Azov e deputado do partido Frente Popular, Andrei Boletski, não podia esconder sua amargura: "Negociar agora é estúpido, malvado e uma traição. Após uma derrota não se pode esperar um armistício em bons termos. Não há nada mais humilhante e idiota que esperar a compaixão do inimigo", escreveu em sua página do Facebook.
Prisioneiros exibidos para a multidão
O leste da Ucrânia viveu nesta quinta-feira um de seus dias mais sangrentos em nove meses de conflito e depois de um período de relativa calma em razão da assinatura em setembro de um cessar-fogo em Minsk.
Ao menos 44 pessoas, entre civis e militares, morreram em 24 horas nas regiões de Donetsk e Lugansk, segundo uma contagem da AFP estabelecida a partir de informações oficiais do exército ucraniano e das autoridades separatistas.
O ataque mais sangrento ocorreu em um bairro de Donetsk, onde ao menos 13 civis morreram em um ônibus elétrico bombardeado. Kiev e Moscou se acusaram mutuamente de terem cometido o ataque.
Os combates na Ucrânia "se intensificaram" e atingem o nível anterior ao cessar-fogo, concluído nos acordos de Minsk em setembro, declarou nesta quinta-feira o comandante supremo das forças da Otan na Europa, o general americano Philip Breedlove.
"A situação na linha de frente não é boa. Os combates se intensificaram ao nível de antes dos acordos (...) e em alguns casos, além", afirmou em Bruxelas.
Ele disse que a Otan detectou sinais da presença de "sistemas de defesa antiaérea" e de sistemas militares eletrônicos que acompanharam as tropas russas no passado.
"Os civis ucranianos sofrem com estes ataques terroristas. A Rússia deve deter os terroristas (como Kiev se refere aos rebeldes)", disse o ministro ucraniano de Relações Exteriores, Palvo Klikin, enquanto seu colega russo, Sergei Lavrov, acusou o governo ucraniano de estar por trás do ataque. "Trata-se de uma provocação grosseira para boicotar o processo de paz", disse Lavrov em um comunicado.
O ataque contra o ônibus elétrico ocorreu apenas 8 dias após a morte de outros 12 civis em um ônibus também bombardeado perto de Volnovakha, 35 km ao sul de Donetsk, ataque do qual Kiev e os rebeldes se acusam mutuamente.
"O local onde o veículo foi atingido está situado a 15 km da zona onde se encontram as forças antiterroristas (nome dado por Kiev às tropas que combatem os separatistas)", afirmou o ministério da Defesa em um comunicado.
Este ataque "é mais uma prova dos crimes bárbaros cometidos pelo governo de Kiev", declarou, por sua vez, o "ministério das Relações Exteriores" da autoproclamada República de Donetsk em um comunicado, em que exige uma investigação imediata da ONU e da OSCE.
Na disputa entre Kiev e Moscou, o primeiro-ministro ucraniano Arseniy Yatsenyuk também considerou que Moscou tem "responsabilidade" no drama. Não surpreendentemente, o chefe da diplomacia russa, Sergei Lavrov, questionou as "forças ucranianas" e uma "provocação grosseira de minar o processo de paz".
Poucas horas após a tragédia, cerca de vinte soldados ucranianos foram obrigados a desfilar entre o aeroporto de Donetsk e o local onde aconteceu o bombardeio do ônibus elétrico, para serem exibidos a uma multidão indignada.
Durante 10 minutos, os prisioneiros foram obrigados a permanecer de joelhos na rua, enquanto dezenas de habitantes os cercavam e lançavam vários objetos das janelas de suas residências, constatou um jornalista da AFP no local.