Buenos Aires, Argentina - A Argentina acordou nesta segunda-feira (19/1) comovida pela morte de Alberto Nisman, o promotor que acusou a presidente Cristina Kirchner de acobertar o Irã no caso do atentado de 1994 contra a Associação Mutual Israelita Argentina (AMIA) em Buenos Aires. A morte de Nisman, encontrado no domingo (18/1) junto a uma arma em seu apartamento, parece um suicídio, declarou o secretário de Segurança, Sergio Berni, pouco depois que a promotora que investiga o caso pediu prudência.
O falecimento foi anunciado no mesmo dia em que Nisman deveria comparecer perante o Congresso para explicar sua denúncia contra Kirchner e o chanceler Héctor Timerman. "A morte de Nisman não tem absolutamente nada de normal", declarou o secretário-geral da Presidência, Aníbal Fernández, ao se declarar chocado.
O corpo do promotor foi encontrado por sua mãe, que foi contactada pelos seguranças pessoais dele - 10 agentes da polícia, no total - que alertaram a família diante de sua falta de resposta a telefonemas no domingo. Nisman havia sido designado em 2004 por Néstor Kirchner como promotor especial para o caso AMIA, um ano após a anulação de um julgamento por irregularidades na investigação.
A denúncia
Nisman, divorciado de uma juíza e pai de duas filhas, interrompeu suas férias na Espanha e viajou à Argentina na semana passada para divulgar sua controversa denúncia. O promotor pedia que Kirchner fosse indagada por ter favorecido em 2013 a assinatura de um Memorando de Entendimento entre Argentina e Irã para poder interrogar os acusados em um terceiro país e avançar em um caso estancado há 20 anos.
A acusação de Nisman foi o último de uma série de confrontos entre funcionários de alto escalão e a justiça argentina sobre o esclarecimento deste atentado. Além da investigação, solicitou um embargo preventivo de bens no valor de 200 milhões de pesos (23 milhões de dólares) de Kirchner, de Timerman e de outros funcionários.
[SAIBAMAIS]Segundo o promotor, a posição do governo de Kirchner obedecia ao seu interesse pelo petróleo iraniano para restabelecer relações comerciais de Estado a Estado. O governo rejeitou a denúncia do promotor, chamando-o de mentiroso e atribuindo a atuação de Nisman a uma operação dos serviços de inteligência.
O presidente da Delegação de Associações Israelitas Argentinas (DAIA), ONG que conta com a adesão de 140 instituições judaicas do país, disse: "Voltou a explodir a bomba do caso AMIA", e considerou esta morte uma catástrofe. Já Israel expressou sua tristeza pela morte do promotor e pediu à Argentina que prossiga com a investigação do caso. "O Estado de Israel expressa sua profunda tristeza pela trágica morte do promotor especial que investigava o atentado contra a Associação Mutual Israelita Argentina (AMIA), Alberto Nisman", afirmou o porta-voz da chancelaria israelense, Emmanuel Nahshon, em um comunicado.
"Nisman, um corajoso jurista e combatente da justiça, trabalhou com grande determinação para identificar os executores e autores do ataque", acrescenta o texto.
Assassinato
A deputada opositora Patricia Bullrich afirmou que "um promotor morto antes de dar um relatório ao Congresso em um caso onde há terrorismo internacional me parece de uma enorme gravidade". A deputada disse ter falado no sábado com Nisman três vezes e ele mencionou que havia recebido várias ameaças. Elisa Carrió, líder da Coalizão Cívica, declarou que era um assassinato, que esta morte era previsível e não reconheceu a versão do suicídio.
Para sua audiência desta segunda-feira o promotor solicitava que seu comparecimento ocorresse em particular, mas parlamentares governistas exigiam que a audiência fosse pública e transmitida pela televisão. No Twitter várias hashtags com palavras-chave do ocorrido apareciam entre as mais populares nesta segunda-feira, enquanto #Nisman e #CFKAsesina - as iniciais do nome da Presidente - se impunham entre os seguidores desta rede social.
Acusação vil
O governo argentino rejeitou a denúncia "vil" do procurador. A assinatura de um memorando de entendimento com o Irã aumentou a tensão nas relações entre o governo de Kirchner e esta comunidade, integrada por 300 mil membros, a maior da América Latina.
O governo defendeu o acordo bilateral com o Irã para investigar os acusados de planejar o ataque. Cinco ex-funcionários iranianos, entre eles um ex-presidente, atuais ministros e líderes religiosos locais, têm uma ordem de captura internacional da Interpol a pedido da justiça argentina.