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Peruanos elegem representantes regionais atentos à corrupção

Assim como no Brasil, a população do Peru vai neste domingo (5/10) às urnas

Assim como no Brasil, a população do Peru vai neste domingo (5/10) às urnas para eleger representantes políticos. Mas diferentemente daqui, no país vizinho, a decisão será municipal e regional e deve preencher 12.692 cargos públicos. Logo no início da campanha, o passado dos 104 mil candidatos chamou a atenção de autoridades e expôs fragilidades na lei eleitoral. Isso porque, após uma iniciativa da associação civil Transparência, o Tribunal Nacional de Eleições (JNE, da sigla em espanhol) checou o histórico dos aspirantes a postos do Executivo regional e decidiu excluir 345 deles do processo eleitoral por serem alvo de condenações judiciais ainda vigentes. Os crimes cometidos pelos candidatos vão desde o não pagamento de pensão alimentícia aos filhos até tráfico de drogas, terrorismo, estupro e sequestro.

Outras centenas de políticos estão sendo investigados ou são suspeitos de terem cometido algum tipo de delito. Muitos dos que continuam no pleito já cumpriram penas e agora são considerados "reabilitados" pelos termos da Constituição peruana. "Se estão reabilitados, não há impedimento para que postulem (suas candidaturas)", reforçou Francisco Távara, presidente do JNE, citado pela imprensa local. Távara, que recomendou aos partidos que analisassem os casos desses candidatos para avaliar se deveriam ou não permanecer na disputa, defende diversas modificações na legislação eleitoral. Entre elas, a obrigatoriedade de informar à Justiça processos penais em curso ; o que atualmente é facultativo. Outra demanda é que a apresentação de declarações patrimoniais também se torne compulsória.

[SAIBAMAIS]Dados apresentados na última semana pelo JNE indicam que menos de 50% dos que concorrem a cargos nesta eleição declararam o patrimônio pessoal. "Devemos fazer um esforço para que haja uma sanção e isso está do lado do Congresso", pressionou o magistrado Walter Gutiérrez, representante do tribunal. Se aprovadas, as mudanças podem ajudar a identificar não apenas infratores comuns, mas, principalmente, aqueles que recebem financiamento e apoio de organizações criminosas.

Narcotráfico


O Peru é o maior produtor de folha de coca (matéria base para produção de cocaína) do mundo e tem um longo histórico de envolvimento de narcotraficantes na política. Há anos a sociedade civil cobra reformas eleitorais e, na última semana, algumas das recentes propostas de mudança começaram a ser oficialmente discutidas. A Comissão de Constituição do Congresso debateu quatro projetos que propõem, entre outros pontos, a suspensão dos partidos cujos filiados forem condenados e a declaração da "morte civil" desses políticos. A ideia é aumentar a transparência e criar uma lei semelhante à da Ficha Limpa, aplicada no Brasil desde 2012. O presidente da comissão, Cristóbal Llatas, informou que todas as propostas serão compiladas em um único projeto, que deve ser analisado e votado nas próximas reuniões.

Apesar da ausência de uma legislação específica, o país não está completamente desprotegido. Diversas organizações civis e estatais se dedicam à luta contra o ingresso de políticos "sujos" em cargos públicos. Enrique Amayo Zevallos, professor de relações internacionais da Universidade Estadual Paulista (Unesp), destaca que o afastamento dos 345 candidatos condenados é um exemplo da eficiência dessas organizações. "Se tivéssemos (de fato) Ficha Limpa, imagina quantos não teriam sido excluídos", observa Zevallos, que critica a incapacidade brasileira de aplicar a lei. "O Brasil tem uma legislação específica, mas as coisas funcionam mais no Peru", destaca. "Lá, a sociedade civil é participativa e teve vitórias, como a criação da Defensoria do Povo. Acho que os 12 anos de guerra deixaram consequências muito traumáticas, o povo aprendeu cobrar", analisa.