As usinas nucleares nos Estados Unidos correm um risco crescente de fechar as portas, diante da concorrência cada vez maior do gás natural, mais barato, o que, segundo especialistas, poderia afetar os esforços do presidente americano, Barack Obama, de combater as mudanças climáticas.
Na terça-feira, a Casa Branca pediu ações para combater os efeitos das emissões de gases de efeito estufa, alertando que o aquecimento global provocado pelo homem já tem sérios impactos no país.
Mas o aumento da exploração do gás de xisto, disponível em abundância, pode fazer com que as usinas nucleares - que não emitem gases estufa e geraram 19% da eletricidade produzida em 2013 - venham a sofrer cortes.
Além da concorrência do gás natural, cujos preços têm caído desde 2009, novas regulamentações adotadas após o acidente na usina nuclear de Fukushima, no Japão, em 2011, bem como benefícios tarifários para a produção de energia eólica também têm afetado a competitividade da energia atômica, segundo fontes do setor.
Estes fatores põem em dúvida a construção de novas usinas atômicas, enquanto a previsão é de que mais seis sejam construídas até 2020.
Quatro reatores nucleares foram desligados nos Estados Unidos entre 2010 e outros 10 provavelmente terão o mesmo destino nos próximos anos, declarou à AFP Doug Vine, membro sênior do conselho de energia do Centro para Soluções para Energia e Clima.
"Cada reator nuclear aposentado torna mais difícil para os Estados Unidos cumprirem sua promessa climática de reduzir as emissões em 17% com base nos níveis de 2005 até 2020", como anunciado por Obama em 2009, "e de alcançar uma redução ainda maior, necessária no longo prazo, para evitar os piores efeitos das mudanças climáticas", disse Vine, co-autor de um relatório sobre o tema, publicado recentemente.
EUA, os segundos maiores emissores de CO2
Os Estados Unidos são, depois da China, os segundos maiores emissores de dióxido de carbono (CO2), principal gás-estufa. E ainda que a queima de gás natural gere 50% menos gases estufa do que o carvão, ela ainda contribui para o aquecimento global.
Segundo o último relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), o mundo tem uma chance provável de alcançar o limite de aquecimento de 2;C, estabelecido pela ONU, se cortar as emissões anuais de gases estufa entre 40% e 70% até 2050, especialmente aquelas produzidas na geração de energia.
Seria necessário "triplicar até quase quadruplicar" a proporção da energia produzida de fontes renováveis e nucleares, bem como de fontes fósseis tradicionais ou de novos biocombustíveis com emissões capturadas, destacou.
Em fevereiro, o Instituto de Energia Nuclear, que representa o setor, informou que "na falta das necessárias mudanças em políticas e práticas, esta situação tem implicações para a confiabilidade, a estabilidade de longo prazo do preço da eletricidade e nossa habilidade para cumprir metas ambientais".
As fontes fósseis geram cerca de 66% de eletricidade nos Estados Unidos, enquanto 39% são produzidas em usinas a carvão e 27%, em usinas a gás.
O resto é, grosso modo, gerado energia nuclear (19%) e fontes renováveis, como a hidrelétrica (6,2%), eólica (4%), geotérmica (0,41%) e solar (0,02%).
"Precisamos continuar aumentando as renováveis, mas elas não podem atender nossa necessidade de energia confiável 7 dias por semana, 24 horas por dia", disse Eileen Claussen, presidente do Centro para Soluções de Energia e Clima.
Além disso, acrescentou, a energia nuclear é "livre de carbono".
Michael Jacobs, analista sênior de energia da União de Cientistas Preocupados, afirmou que "o setor das renováveis poderia compensar a perda de energia fornecida pelas usinas nucleares, (mas) apenas se elas conseguirem o apoio de crédito fiscal".
"Se as políticas forem incentivadoras, a energia renovável pode fornecer de 10% a 15% da eletricidade dos Estados Unidos", afirmou.
Jacobs acrescentou que, enquanto os créditos fiscais da energia renovável "vêm e vão a cada dois anos", o subsídio aos combustíveis fósseis são "inalterados e constantes".
Em alusão às usinas nucleares atuais, afirmou, "não acreditamos que elas mantenham as exigências de segurança", afirmou.
Ele admitiu existirem riscos associados à energia nuclear.
"Mas nós achamos que o risco das emissões não mitigadas de CO2 na atmosfera e o risco das mudanças climáticas são muito, muito maiores do que o risco associado à energia nuclear", afirmou.